É livre a crítica e o direito de expressão, mas cada um deve arcar com a responsabilidade de seus atos porque a Constituição Federal também assegura o direito à honra, à intimidade e à privacidade. Com esse entendimento, o juiz Flávio Fenoglio Guimarães, de São Paulo, condenou dois réus por textos ofensivos publicados em sites. Eles estão obrigados a pagar indenização de R$ 50 mil por difamação.
O autor da ação alegou que se sentiu ofendido com os textos publicados nos sites Interjuris e Abusando, além de e-mails enviados pelos réus. Segundo ele, os réus o acusaram de ter “notório saber em encher o próprio bolso”. E mais. Disseram que ele “é o responsável pelo sumiço de milhões e o responsável por leilões fraudulentos de domínios na internet”.
O autor da ação pediu indenização, a publicação da sentença nos referidos sites e também a imediata retirada do conteúdo ofensivo do ar. Um dos réus alegou que os textos eram sobre o inconformismo pela postura do órgão em que autor trabalha e apenas pediam explicação lógica e plausível. O outro, no entanto, não contestou os argumentos.
“Evidentemente que o réu não se limitou a criticar ou expressar inconformismo. Os textos falam por si e mostram que o réu atacou a honra do autor, atribuindo a ele a prática de crimes, como fraudes e desvio de recursos”, disse o juiz. Segundo a ação, em alguns textos, os sites mencionavam o nome do autor, e, em outros, faziam “referências jocosas que permitiam claramente a sua identificação”.
O juiz afirmou: “Nem mesmo a imprensa tem liberdade absoluta para fazer acusações sem um mínimo de prova. O propósito dos réus, especialmente pela linguagem que utilizaram, não era de apenas criticar ou informar, mas de difamar, de ofender, de caluniar, o que é grave violação de direito”. Ele disse ainda: “O autor, nem é preciso provar, sofreu danos morais de grande monta, pois, se uma simples negativação indevida gera a presunção de sofrimento de danos morais indenizáveis, muito mais grave é alguém, com destaque no meio da internet, sofrer graves ataques à sua honra.”
Guimarães ressaltou que uma simples consulta com o nome do autor na internet levaria a visita dos dois sites. O juiz determinou que o conteúdo seja eliminado dos sites. Também fixou a indenização em R$50 mil.
Caso haja recusa dos réus em retirar o conteúdo, eles deverão arcar com multa diária no valor de R$ 1 mil até o limite máximo de R$ 100 mil. Além disso, a sentença deve ser publicada na íntegra em ambos os veículos com chamadas e links na página inicial. As custas do processo e os honorários do advogado da parte contrária também serão de responsabilidade dos réus, de acordo com o juiz.
Decisão:
Processo Nº 583.00.2007.148001-2
Processo 583.00.2007.148001-2. Autor: Demi Greschko. Réus: Ricardo Cardonetti e Jan Struiving. O autor propôs a presente ação contra os réus, alegando que estes lhe difamam através de e-mails e sites da internet, dizendo que ele tem notório saber em encher o próprio bolso, é o responsável pelo sumiço de milhões e o responsável por leilões fraudulentos de domínios na internet; que ser indenizado entre 100 e 200 salários mínimos e ter a sentença publicada nos sites interjuris e abusando; quer a imediata retirada do conteúdo ofensivo existente nos referidos sites. A antecipação da tutela foi indeferida a fls. 49. O réu Ronaldo contestou a fls. 143, alegando que o conteúdo dos textos é apenas de inconformismo pela postura do Órgão Gestor, que prejudicou certas pessoas, as quais pleiteiam uma explicação plausível e lógica; que não houve identificação do autor; que o pedido improcede. O réu Jan foi citado pessoalmente (fls. 140) e não contestou. A réplica está a fls. 148 e as partes foram intimadas a especificar provas, mas só o autor disse que tinha interesse em produzi-las. É o relatório. Decido. A defesa do réu baseia-se essencialmente na tese de que apenas manifestou seu inconformismo com as decisões do órgão em que autor trabalha. Porém, evidentemente, que o réu não se limitou a criticar ou expressar inconformismo. Os textos falam por si e mostram que o réu atacou a honra do autor, atribuindo a ele a prática de crimes, como fraudes e desvio de recursos. As alegações caluniosas não foram provadas, pois o réu nem sequer especificou provas, omissão esta que significa que concordou com o julgamento antecipado da lide. O site abusando/denúncias e o site interjuris, ora mencionando textualmente o nome do autor, ora fazendo referências jocosas que permitiam claramente a sua identificação, atribuíram ao autor a prática de gravíssimas irregularidades, que não foram nem ao menos por indícios comprovadas. É livre a crítica e o direito de expressão, mas cada um deve arcar com a responsabilidade de seus atos, pois a Constituição também assegura o direito à honra, à intimidade e à privacidade. Nem mesmo a imprensa tem liberdade absoluta para fazer acusações sem um mínimo de prova. O propósito dos réus, especialmente pela linguagem que utilizaram, não era de apenas criticar ou informar, mas de difamar, de ofender, de caluniar, o que é grave violação de direito.
Analogamente, uma pessoa pode não se conformar com uma decisão judicial e dela recorrer. Porém, no recurso, deve criticar o julgamento e não ofender o juiz. Se um julgador cometer qualquer irregularidade grave, não deve ele ser exposto num recurso, numa página da internet ou por e-mails enviados a inúmeras pessoas. Há um órgão no Tribunal de Justiça encarregado de investigar o desvio de conduta dos magistrados, que é a Corregedoria Geral de Justiça. As investigações que se transformam em processos são julgadas pelo órgão especial do Tribunal de Justiça. Os réus, se não estavam satisfeitos com a atuação do autor, deveriam ter feito denúncias com provas para a polícia, para o Ministério Público ou mesmo para órgãos da administração que sejam superiores ao autor, como por exemplo o Ministério ao qual a Fapesp está vinculada, ao comitê gestor e outros órgãos. As ofensas foram absolutamente intencionais, o que recomenda punição severa. O autor, nem é preciso provar, sofreu danos morais de grande monta, pois, se uma simples negativação indevida gera a presunção de sofrimento de danos morais indenizáveis, muito mais grave é alguém, com destaque no meio da internet, sofrer graves ataques à sua honra. Uma consulta ao nome do autor poderia levar o pesquisador à visita aos sites ofensivos aqui tratados. A indenização deve ser arbitrada em R$ 50.000,00, que a quantia minimamente necessária para que o autor seja consolado e reparado pelas ofensas sofridas. Esse valor deve fazer com que
os réus pensem antes de denegrir a honra de quem quer que seja através do poderoso veículo de comunicação e divulgação que é a internet. O conteúdo que foi copiado com a petição inicial deve ser eliminado da internet para que as ofensas não persistam, sob pena de multa diária, e também deve a presente sentença ser divulgada nos sites em questão, com chamada e link na página inicial, pelo prazo de um ano, como forma de dar publicidade à reprimenda que se faz a este tipo de conduta, como forma de desestimular a que outras pessoas cometam o mesmo ilícito. Ante o exposto, julgo procedentes os pedidos formulados pelo autor contra os réus, para condenar os réus, solidariamente, ao pagamento da quantia de R$ 50.000,00, corrigida pela tabela prática do TJSP, desde a propositura da ação, mais juros de 1% ao mês, estes contados da citação.
Condeno ainda os réus a que eliminem dos respectivos sites o conteúdo das páginas copiadas entre os documentos que acompanharam a petição inicial, no prazo de 15 dias, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00, até o limite máximo de R$ 100.000,00. Condeno ainda os réus a publicar nos sites, pelo prazo de um ano, com chamada e link na página inicial, o inteiro teor da presente sentença, a partir de seu trânsito em julgado. Além disso, os réus arcarão com as custas do processo em reembolso e os honorários do advogado da parte contrária, que arbitro em 10% sobre o valo atualizado da dívida no início da execução. P.R.I. São Paulo, 10 de dezembro de 2009. Flávio Fenoglio Guimarães Juiz de Direito