Proteger crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade é missão que mobiliza o Poder Judiciário brasileiro. Cientes dessa responsabilidade, magistrados de vários estados desenvolvem ações para efetivar os direitos previstos pela Constituição Federal.
Em Rondônia, servidores do 2º Juizado da Infância e da Juventude de Porto Velho percorrem comunidades ribeirinhas do baixo Rio Madeira para combater abusos e exploração sexual de crianças e adolescentes.
Já no Paraná, o Programa Criança e Adolescentes Protegidos visa fortalecer a rede de segurança pública contra o desparecimento de meninos e meninas.
O projeto do tribunal de Justiça de Rondônia (TJRO) chama-se Miracema, nome de origem indígena que significa o nascer de uma criança. A preocupação com a exploração sexual das crianças foi o que motivou o projeto, de acordo com a juíza Euma Tourinho, titular do 2º Juizado da Infância e Juventude de Porto Velho.
A magistrada deparava-se com frequência com processos envolvendo homens que mantinham relações com meninas de cerca de dez anos, mas alegavam desconhecimento da lei e não tinham consciência de que esse ato é classificado como estupro de vulnerável. “É um problema cultural da nossa região, muitos homens acham que, se o pai da menor anuiu e ela consentiu, não haveria ilegalidade”, diz a juíza Euma.
O acesso às comunidades é por transporte fluvial e a localidade mais distante fica a 350 km da área urbana da capital. Muitas vezes o contato da Justiça com as pessoas é feito por meio de líderes religiosos ou comunitários, que se responsabilizam por reunir a comunidade. O projeto Miracema leva esclarecimentos e orientações sobre os tipos de violência previstas na lei e como a população pode se envolver para garantir, de fato, a proteção de crianças e adolescentes
A primeira comunidade percorrida pelos servidores foi no distrito de São Carlos, nos dias 12 e 13 de setembro. Uma das atividades da programação foi a roda de conversa com os pais e professores da escola local, oportunidade em que a comunidade pôde tirar dúvidas, apresentar as dificuldades e buscar juntos meios para auxiliar crianças e adolescentes em risco.
Segundo a equipe do juizado que realizou a visita, a população enfrenta inúmeros problemas estruturais como ausência de serviços essenciais que vão desde o atendimento médico até a segurança pública, além do crescimento do uso de drogas entre os jovens. Há, ainda, a dificuldade de alimentação em função da escassez de peixes no Rio Madeira, pois a população vive da pesca.
As próximas comunidades atendidas serão a de Nazaré e de Calama. Para a juíza Euma Tourinho, o objetivo é divulgar informações a respeito do sistema protetivo das crianças e adolescentes, para que os responsáveis entendam quais são os direitos das crianças. “Por vezes nos deparamos, por exemplo, com pais que não levam a criança à escola porque não têm como arcar com o transporte, e não sabem que isso é uma obrigação do Estado”, diz a juíza Euma.
Identificação biométrica
De autoria da desembargadora Lidia Maejima, 2ª vice-presidente do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR), o programa Criança e Adolescente Protegidos surgiu com um desdobramento do projeto Impressão Digital – Combate à Impunidade, idealizado em 1991. A iniciativa é para garantir o direito de identificação e o fortalecimento da rede de segurança contra desaparecimentos e sequestros de pessoas.
Segundo a magistrada, a emissão da carteira de identidade – com a coleta de impressões digitais, de forma biométrica, de todas as crianças e adolescentes matriculados na rede de ensino público estadual – auxilia ainda no combate à prostituição infantil e à evasão escolar. Com as informações biométricas disponíveis, a polícia tem mais elementos para auxiliar a localização de crianças e adolescentes desaparecidos ou em risco.
Lançada em 2014, como projeto-piloto nas cidades de Londrina, Maringá e Ibiporã, a ação resultou na emissão, em pouco mais de um ano, de 15 mil documentos de identidade. “O Poder Judiciário, atualmente, exerce uma importante missão na busca da garantia do exercício da plena cidadania pelas crianças e adolescentes, incutindo e reforçando a sensação de que, efetivamente, pertencem à sociedade em que estão inseridos, tornando mais concreto o princípio da proteção integral, estabelecido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)”, afirma a desembargadora.
A iniciativa foi reconhecida nacionalmente em 2015, quando o programa conquistou o primeiro lugar do XII Prêmio Innovare, na categoria Tribunal. Com apoio do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente, atualmente, o projeto recebe verbas do Fundo da Infância e da Adolescência.
Além da parceria com o governo do Paraná e do Ministério Público, quatro universidades estaduais que mantêm maternidades auxiliam na identificação biométrica de recém-nascidos.
Governos municipais, associações e sindicatos também ajudam na realização das ações. Este ano, o programa firmou convênio com a Associação Paranaense de Oftalmologia e o Conselho Brasileiro de Oftalmologia para oferecer atendimento gratuito aos alunos matriculados na rede pública.
Jovens promissores
Lidia Maejima destaca que o TJPR desenvolve outras ações na área da infância e juventude visando a concretização dos direitos fundamentais previstos na Constituição Federal em prol das crianças e adolescentes do estado. Entre elas, está o projeto Jovens Promissores destinado a adolescentes que se encontram afastados do convívio familiar, ou seja, em acolhimento institucional. “O projeto visa minimizar as dificuldades para que o jovem acolhido, ao atingir a maioridade, obtenha as ferramentas necessárias para assumir o protagonismo de sua vida, por meio da participação em cursos profissionalizantes de interesse de cada adolescente”, explica a desembargadora.
Fonte: www.cnj.jus.br