Ortotanásia é o termo utilizado pelos médicos para definir a morte natural, sem interferência da ciência, permitindo ao paciente morte digna, sem sofrimento, deixando a evolução e percurso da doença.
O sistema prega que se evitem métodos extraordinários – como medicamentos e aparelhos – em pacientes irrecuperáveis e que já foram submetidos a suporte avançado de vida.
A persistência terapêutica em paciente irrecuperável pode estar associada à distanásia, considerada por muitos médicos como morte com sofrimento.
Eutanásia é a prática pela qual – de maneira controlada e assistida por um especialista – se abrevia a vida de um enfermo incurável. Ela representa uma complicada questão de bioética e biodireito, pois enquanto o Estado tem como princípio a proteção da vida dos seus cidadãos, existem aqueles que, devido ao seu estado precário de saúde, desejam dar um fim ao seu sofrimento, antecipando a morte. No Brasil esta prática é considerada ilegal.
Decisão unânime da 21ª Câmara Cível do TJRS confirmou sentença de primeiro grau que indeferiu a petição inicial de uma rara ação movida pela Associação dos Funcionários Públicos do RS – AFPERGS, mantenedora do Hospital Ernesto Dornelles, de Porto Alegre. Possivelmente o caso seja sem precedentes no Brasil e seguramente em Porto Alegre.
Trata-se de uma ação cautelar que relata a situação de uma paciente, internada desde 5 de dezembro de 2010, por “quadro de descompensação secundária a insuficiência renal, pré-edema agudo de pulmão”. Por ela apresentou-se, inicialmente, como seu responsável um neto, que se opõe à indicação expressa dos médicos quanto à necessidade de realização de hemodiálise.
Também um filho da paciente – já então invocando ser dele a condição de responsável pela mãe – não autoriza o tratamento – argumentando “estar cumprindo desejo materno”.
Por isso, descrevendo o quadro de uremia que assola a enferma, a mantenedora do hospital pretendeu fosse suprida a vontade de quem for o responsável pela idosa, buscando autorização para que “os médicos procedam o tratamento indispensável”.
O processo tramita sem segredo de justiça. A juiza Laura de Borba Maciel Fleck, da 16ª Vara Cível de Porto Alegre, indeferiu a petição inicial, rebatendo o parecer do Ministério Público que era favorável à concessão da liminar.
Houve apelação. No segundo grau, o MP-RS opinou pela confirmação da sentença. Esta foi confirmada pela 21ª Câmara Cível, a partir de longo arrazoado desenvolvido pelo desembargador Armínio José Abreu Lima da Rosa, presidente do colegiado e relator do caso.
No julgado, ele discorre que “há de se dar valor ao enunciado constitucional da dignidade humana, que sobrepõe-se, até, aos textos normativos, seja qual for sua hierarquia”. O voto respeita “o desejo de ter a morte no seu tempo certo, evitados sofrimentos inúteis”.
O desembargador Lima da Rosa diz que “no caso dos autos, a vontade da paciente em não se submeter à hemodiálise, de resultados altamente duvidosos – afora o sofrimento que impõe, traduzida na declaração do filho – há de ser respeitada, notadamente quando a ela se contrapõe a preocupação patrimonial da entidade hospitalar que, assim se colocando, não dispõe nem de legitimação, muito menos de interesse de agir”.
O acórdão lembra o célebre caso da americana Terri Schiavo, falecida em 31 de março de 2005, após ter sido mantida em vida vegetativa por mais de 15 anos, quando a Justiça norte-americana terminou por fazer prevalecer a vontade externada pelo marido, contraposta à dos pais.
No âmbito da atuação dos médicos, o tratamento decorrente dos termos do art. 57, Código de Ética Médica, que veda ao médico “deixar de utilizar todos os meios disponíveis de diagnóstico e tratamento a seu alcance em favor do paciente”, veio a receber considerável giro em seu alcance, quando o Conselho Federal de Medicina baixou a Resolução CFM n° 1.805/2006, que liberou os médicos a praticarem a ortotanásia.
Os desembargadores Francisco José Moesch e Marco Aurélio Heinz acompanharam a decisão.
Precedente em Brasília
Decisão recente do juiz federal da 14ª Vara do Distrito Federal Roberto Luis Luchi Demo, reconheceu a legitimidade da Resolução n° 1.805/2006 do Conselho Federal de Medicina, que liberou os médicos para a realização de ortotanásia, nos seguintes termos:
“Na fase terminal de enfermidades graves e incuráveis é permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente, garantindo-lhe os cuidados necessários para aliviar os sintomas que levam ao sofrimento, na perspectiva de uma assistência integral, respeitada a vontade do paciente ou de seu representante legal”. (Proc. nº 2007.34.00.014809-3).