No dia 26 de setembro de 2010, a sociedade brasileira começou a comemorar os 15 anos do advento da Lei nº 9.099/1995, que criou os juizados especiais (JEs) cíveis e criminais – antes conhecidos como juizados de pequenas causas – no âmbito da Justiça Estadual. Peças fundamentais na missão de desafogar o Judiciário brasileiro, esses órgãos têm registrado índices altíssimos de produtividade. Exemplo disso é que chegam ao Supremo Tribunal Federal, quase diariamente, processos oriundos de juizados especiais de todo o país: de janeiro a setembro de 2010, a Corte recebeu 5.585 recursos extraordinários e agravos de instrumentos provenientes das turmas e dos colégios recursais dos JEs.
Pautados nos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia e celeridade, buscando, sempre que possível, a conciliação, os juizados especiais são hoje motivo de orgulho para os operadores do Direito, na medida em que tornam a Justiça mais ágil, mais barata e, segundo alguns juristas, até mesmo mais justa, ao ampliar o acesso da população carente aos serviços jurisdicionais.
Contando com o trabalho de magistrados de carreira, conciliadores e juízes leigos, os juizados especiais estaduais têm como atribuição a análise e o julgamento das causas cíveis de menor complexidade, não superiores a 40 vezes o valor do salário mínimo. Também são responsáveis por julgar as infrações penais de menor potencial ofensivo, ou seja, contravenções penais e crimes para os quais é estabelecida pena máxima de 2 anos, cumulada ou não com multa.
Além da celeridade e desburocratização, por não ser necessária a judicialização do conflito, os juizados permitem, nas causas de valor até 20 salários mínimos, que as partes envolvidas compareçam pessoalmente, podendo ou não ser assistidas por um advogado. Somente nas causas de valor superior a assistência de profissional da advocacia torna-se obrigatória.
Benefícios
Na opinião do presidente do Fórum Nacional de Juizados Especiais (Fonaje), Marco Aurélio Gastaldi Buzzi, “são imensos os benefícios que os juizados têm trazido à sociedade”. Ele explica que, por serem baseados no Direito Anglo-Saxônico e Germânico, os juizados especiais permitem mais agilidade à resolução dos conflitos, em contraposição ao Direito Romano – no qual é inspirado o Direito brasileiro –, que apesar de primar pela segurança e a ampla defesa, é menos célere.
“Os juizados possibilitam à parte, sem custo e sem advogado, ter acesso à Justiça. Por meio deles, os juízes podem decidir com base na equidade, não apenas baseados no direito posto. Além disso, permitem que aqueles juízes comprometidos com seu trabalho de pacificadores sociais tenham amplas condições de resolver o caso em si e também o conflito sociológico”, destaca Buzzi.
Ele lembra que os conciliadores decidem nos casos específicos, sem ter de ser instaurado um processo judicial, e ainda apresentam opções para melhorar a convivência entre as partes, por exemplo. “Temos de comemorar uma nova mentalidade que vem crescendo no país. A Lei 9.099 abriu as portas para essa maneira simplificada de resolver os conflitos, criando novos mecanismos que tornam a Justiça mais ágil, mais barata e mais justa”, completa o magistrado.
O ministro Marco Aurélio Mello, do STF, compartilha da opinião do presidente do Fonaje. Para ele, os juizados especiais trouxeram, “sem dúvida”, muitos benefícios aos cidadãos brasileiros. “Em primeiro lugar, os juizados desburocratizaram o processo: a tramitação do processo agora é muito mais célere, e vinga a oralidade. Em segundo lugar, foi afastada a terceira instância, porque a ação proposta no juizado segue em recurso para uma turma recursal, e não há o acesso ao Superior Tribunal de Justiça”, explica o ministro.
Por outro lado, Marco Aurélio Mello alerta para a avalanche de processos que esses novos órgãos de Justiça têm recebido e julgado. “Nós não podemos sobrecarregar – e já estão sobrecarregados – os juizados especiais. Temos de aproveitar essa boa experiência para enxugar o processo normal, de rito ordinário, e termos também a conciliação entre celeridade e conteúdo. A criação dos juizados especiais foi um grande avanço, mas que esse avanço implique em proveito permanente para os jurisdicionados”, ressalta.
Números
De acordo com o mais recente relatório Justiça em Números, divulgado pelo Conselho Nacional de Justiça no mês de setembro, em 2009 havia 2.758 magistrados atuando nos juizados especiais cíveis e criminais. No período, foram registrados 3.454.942 casos novos e 3.911.684 casos pendentes, na fase de conhecimento, tendo sido julgados 3.479.265. Na fase de execução, foram computados 529.213 casos novos e 404.331 pendentes, sendo que um total de 644.632 recebeu sentença.
Um balanço divulgado pelo Supremo Tribunal Federal mostra que, de 2005 a 8 de outubro de 2010, foram protocolados na Corte 74.948 processos (recursos extraordinários e agravos de instrumento) oriundos das turmas e colégios recursais dos JEs. Nesse período, o recorde se deu no ano de 2006, que registrou 27.849 processos provenientes dos JEs que chegaram ao STF.
Competência dos juizados especiais cíveis
Conforme o artigo 3º da Lei 9.099, competem aos juizados especiais cíveis a conciliação, o processo e o julgamento das causas cíveis de menor complexidade, que não excedam a 40 vezes o salário mínimo, entre elas: as de arrendamento rural e de parceria agrícola; as de cobrança ao condômino; as de ressarcimento por danos em prédio urbano ou rústico; as de ressarcimento por danos causados em acidente de veículo de via terrestre; as de cobrança de seguro, relativamente aos danos causados em acidente de veículo; as de cobrança de honorários dos profissionais liberais; as de despejo para uso próprio; e as ações possessórias sobre bens imóveis.
Por outro lado, ficam excluídas da competência dos juizados especiais cíveis as causas de natureza alimentar, falimentar, fiscal e de interesse da Fazenda Pública, relativas a acidentes de trabalho, a resíduos e ao estado e capacidade das pessoas.
A Lei 9.099 também estabelece as partes que podem propor ação perante os juizados cíveis. São elas: as pessoas físicas capazes, excluídos os cessionários de direito de pessoas jurídicas; as microempresas; as pessoas jurídicas qualificadas como Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip); e as sociedades de crédito ao microempreendedor.
Competência dos juizados especiais criminais
Competem aos juizados especiais criminais, provido por juízes togados ou togados e leigos, conforme o artigo 60 da Lei 9.099, a conciliação, o julgamento e a execução das infrações penais de menor potencial ofensivo, desde que sejam respeitadas as regras de conexão e continência. Isto é, cabe aos juizados criminais lidar com as contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a 2 anos, cumulada ou não com multa.
Em seu artigo 62, a Lei estabelece que os juizados especiais devem se orientar pelos critérios da oralidade, informalidade, economia processual e celeridade. No caso dos juizados criminais, os magistrados e juízes leigos devem, sempre que possível, buscar a reparação dos danos sofridos pela vítima e a aplicação de pena não privativa de liberdade (restritiva de direitos).
Taxas
Comemorada pela maioria dos operadores do Direito, a Lei 9.099/1995 está sendo contestada no STF por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4440, proposta pela Federação das Entidades Representativas dos Oficiais de Justiça Estaduais do Brasil (Fojebra). A entidade questiona a garantia de acesso aos juizados especiais, independentemente de pagamento de custas, taxas ou despesas, e pede à Corte a concessão de liminar para suspender essa isenção, prevista no artigo 54 da norma.
Segundo a Federação, ao elaborar o dispositivo questionado, a União criou uma isenção de tributos de competência dos estados e do Distrito Federal em “flagrante inconstitucionalidade”. Para a entidade, somente por lei de iniciativa dos estados é que poderia haver a isenção das custas, taxas ou despesas relativas ao juizado.