Um casal residente em Campo Grande garantiu que o SUS custeie tratamento de fertilização in vitro, com sêmen de doador, em uma clínica da cidade. A decisão judicial atende ação protocolada pela Defensoria Pública do estado, que alegou que a mulher não poderia ser prejudicada pelo fato do serviço, previsto no sistema de saúde público, não ser oferecido em Mato Grosso do Sul.
A decisão data de 22 de julho deste ano, concedida pelo juiz José Ale Ahmad Neto, da 6ª Vara de Fazenda Pública e de Registros Públicos de Campo Grande e divulgada na sexta-feira (9) pela Defensoria Pública. A decisão é inédita para requerentes amparados pela justiça gratuita em Mato Grosso do Sul, segundo a defensoria.
A ação de obrigação de fazer foi protocolada em fevereiro de 2009 pela técnica de enfermagem Ana Paula da Silva Sousa Parreira, 27 anos. O marido, o motorista Paulo Sérgio Parreira, 35 anos, descobriu que apresentava azoospermia, ausência de espermatozóides, decorrente de tratamento quimioterápico feito quando ele tinha 12 anos. “Só fui descobrir que isso aconteceu quando a gente resolveu ter filhos”, lembra Parreira.
Os dois se conheceram em março de 2004 e, sete meses depois, já estavam casados. Ana Paula disse que eles planejavam ter filhos depois de dois anos, mas a descoberta frustrou os planos. “Sabíamos que tinha tratamento de fertilização pelo SUS, mas não em Mato Grosso do Sul; tem até fila de espera de três anos em outro estado”, disse.
De acordo com o Ministério da Saúde, a reprodução assistida é oferecida pelo SUS, com implementação sob responsabilidade dos gestores locais. No Brasil, apenas cinco hospitais e centros estão credenciados, em São Paulo, Pernambuco e Brasília.
Ana Paula diz que o casal não teria condições de arcar com o procedimento em uma clínica particular, custo orçado em cerca de R$ 15 mil. Eles foram morar com a mãe da técnica de enfermagem e colocaram a venda o imóvel em que residiam, localizado no mesmo terreno para custear o tratamento.
O motorista conta que resolveu procurar a justiça depois de ver uma reportagem sobre um caso semelhante em Goiânia. “Se lá eles conseguiram lá, resolvemos tentar também”.
Ação
O defensor público Francisco Carlos Bariani alegou na ação que é dever do estado garantir acesso universal e igualitário à assistência médico hospitalar.
A Procuradoria-Geral do Estado (PGE) apresentou contestação, alegando que embora exista o plano de reprodução assistida pelo SUS, Mato Grosso do Sul não tem banco de sêmen. Em casos como o de Ana Paula, segundo a procuradoria, existe a possibilidade de tratamento fora do domicílio, e que os documentos dela foram encaminhados ao órgão responsável para que a fertilização pudesse ser feita em outro estado.
No despacho, o juiz José Ale Ahmad Neto acatou os argumentos da Defensoria Pública. “(…) verifico que a ação foi ajuizada em 11/02/2009 (…), já se passaram dois anos da cientificação do Estado sobre a necessidade da fertilização in vitro, sem que este tenha se manifestado sobre a resposta do pedido de fertilização em outro estado”. O magistrado alega que Ana Paula não pode “esperar indefinidamente” pela resposta sobre o tratamento.
A PGE informou ao G1 que já protocolou o recurso contestando a decisão, mas que, caso o Tribunal de Justiça mantenha a exigência do tratamento, o estado irá acatar.
Espera
Ana Paula diz que está muito feliz com o resultado e, mesmo sabendo que haverá contestação, tem boas expectativas. “É um grande sonho, toda a família está ansiosa pela chegada de uma criança”. Desde que começaram a planejar ter filhos, o casal escolheu o nome da menina. “Vai ser Maria Eduarda; o médico também falou que é comum ter gêmeos em fertilização, é uma possibilidade também, não é? Tomara”.