por Anderson Passos
Unificar a numeração de processos, padronizar a nomenclatura de procedimentos e implantar em nível federal as boas soluções implementadas regionalmente podem ser bons primeiros passos para que a Justiça brasileira passe a julgar com mais celeridade e qualidade. A opinião é de juízes, advogados e membros do Ministério Público ouvidos pela revista Consultor Jurídico.
Nesta terça-feira (19/8), eles falaram sobre o projeto do Conselho Nacional de Justiça de discutir um conjunto de iniciativas com os presidentes dos 91 tribunais do país para desafogar o Judiciário. O encontro será na segunda-feira (25/8), em Brasília.
O presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Mozart Valadares, vê com otimismo a iniciativa por acreditar que a lentidão da Justiça é uma questão urgente a ser enfrentada. Segundo ele, há boas medidas já em andamento, como o programa Justiça Aberta, que permite medir a produtividade dos magistrados.
Mas Valadares afirma que há muito chão a ser percorrido: “Em 17 de junho, tomaram posse três ministros no Superior Tribunal de Justiça. Só o ministro Luis Felipe Salomão recebeu 13 mil ações para julgar. É humanamente impossível dar um retorno ágil a um número tão grande de processos”, disse.
Valadares pondera, no entanto, que o grande número de processos também é um sinal de que na base (primeira instância) está se trabalhando muito. E afirma que a adoção de medidas como a do julgamento em bloco de recursos repetitivos e da repercussão geral (adotadas pelo STJ e STF, respectivamente) serão importantes instrumentos para agilizar o Judiciário.
O presidente da AMB anunciou que a associação de juízes, em consonância com a iniciativa do CNJ, vai fazer do tema de seu próximo congresso nacional (entre 9 e 12 de outubro, em São Paulo) o planejamento, a gestão e o orçamento do Judiciário: “Queremos fazer uma profunda radiografia”.
A vice-presidente da Associação dos Juízes Federais na 4ª Região, Carla Justino Hendges, comentou que a iniciativa do CNJ integra um protocolo para agilizar o Judiciário assinado em 2006. Para ela, a unificação das nomenclaturas e numeração processuais e a identificação dos principais temas discutidos, como propõe o Conselho, serão importantes para diagnosticar com precisão os obstáculos.
“Com esses dados computados, será possível apurar onde estão os gargalos do Judiciário, o motivo da demora na tramitação dos processos e as carências da Justiça de um modo geral. O levantamento estatístico a partir desses dados será mais fiel”, acredita.
Já o presidente da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp), José Carlos Cosenzo, disse que as medidas inicialmente sugeridas pelo CNJ são paliativas. “A Constituição de 1988 já falava de um novo modelo de gestão do Judiciário, mas a magistratura e o Ministério Público atuam, em sua maioria, com o modelo anterior ao proposto pela Constituição”, disse Consenzo.
“Eu sou cético. Todas as reuniões feitas, todos os paliativos tentados não foram suficientes. Veja, os Juizados de Pequenas Causas, criados para tornar a Justiça mais ágil, já estão saturados de processos.” Para o presidente da Conamp, a solução da lata litigiosidade passa pela edição de uma Súmula Vinculante que acabe com o “recurso indefinido em ações onde o Estado é parte”.
Justiça digital
As padronizações serão fundamentais para interligar os sistemas de informática e garantir o processamento digital dos feitos. As petições e atos por via eletrônica serão certificados digitalmente.
O CNJ já concede aos advogados um certificado digital que permite peticionar eletronicamente no Projudi — o sistema de processo eletrônico implementado pelo Conselho. E os advogados, assim como qualquer pessoa física, podem adquirir o certificado digital de uma das autoridades certificadoras, como a Caixa Econômica Federal. A OAB também pretende emitir os certificados digitais.
Para o vice-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Vladimir Lourenço, a informatização dos processos no Judiciário é importante, mas ainda levará certo tempo para funcionar a todo vapor: “Sem dúvida, a uniformização de procedimentos e a conseqüente informatização do Judiciário, a médio prazo, serão um importante aliado para acelerar a Justiça brasileira porque vão auxiliar na eliminação de prazos. Mas este é um processo que vai tomar muito tempo de execução”.
Para Lourenço, de imediato, é preciso pensar no aumento do quadro de servidores e auxiliares da Justiça para combater a morosidade. Sobre a questão da informatização, o vice-presidente da Ordem destacou que atualmente há 615 mil advogados no país. “Em muitos casos, o acesso à informática é problemático por causa da falta de prática e da dificuldade de acesso a banda larga em alguns pontos do país.”
O vice da OAB já trabalha com a perspectiva de uma certificação digital, mas acredita que ainda não se pode trabalhar com a hipótese da total eliminação de documentos.
O promotor André Luis Melo, que atua em Uberlândia (MG), comemora o fato de a modernização proposta ter como ponto de partida “um grupo da administração legal, com uma visão de gestão, e não os bacharéis em Direito”.
André Luis Melo afirma que a tendência é pelo crescimento de meios extrajudiciais de acesso ao direito. “Sem dúvida esta reforma cultural será mais produtiva que a constitucional, mas isso somente está sendo possível em razão da criação do CNJ, o qual ainda tem muitos defeitos, mas tem virtudes.”
O advogado Telmo Schorr considera que “mudar ou reduzir os nomes dos processos ou colocá-los todos para dentro do computador é tarefa operacional relativamente fácil”. Para o operador do Direito, mais importante ponto que deve ser atacado é o fato de estados e municípios, que têm 62% dos processos que tramitam no Judiciário, não cumprirem as decisões referentes ao pagamento de precatórios.
Revista Consultor Jurídico