por Lilian Matsuura
O aumento do poder do Supremo Tribunal Federal com a criação de instrumentos como a Repercussão Geral, a Súmula Vinculante e a modulação de efeitos das decisões foi alvo de críticas por parte de Sepúlveda Pertence, ministro que deixou a Corte em agosto do ano passado e voltou para a advocacia. A possibilidade de decidir a data em que a decisão passa a fazer efeito foi a mais criticada. “É um poder imenso. Sem ponderação e equilíbrio tudo estará perdido.”
Pertence questiona o fato de a permissão para o Supremo modular os efeitos das decisões ter sido feita por meio de lei ordinária. Além do que, disse, esse instrumento pode retirar direitos e acabar com o modelo de controle difuso, que também é feito pelas instâncias inferiores.
“Até agora não se revelaram tensões entre o sistema de controle direto feito pelo Supremo e o controle difuso, mas inovações na estrutura das Ações Diretas de Inconstitucionalidade e Ações Declaratórias de Constitucionalidade trazem novos ares”, afirmou durante palestra no 1º Congresso Brasileiro das Carreiras Jurídicas de Estado, promovido pela Advocacia-Geral da União, em Brasília.
Na sessão de quinta-feira (12/6), o Plenário do Supremo Tribunal Federal aplicou a modulação de efeitos na ação em que declarou inconstitucional a exigência da Fazenda Pública de cobrar contribuições sociais com o aproveitamento dos prazos de prescrição de 10 anos. Os ministros concluíram que é inconstitucional o artigo 5º do Decreto-lei 1.569/77 e os artigos 45 e 46 da Lei 8.212/91. Para Pertence, esse tipo de decisão gera uma pressão psicológica nos governos, o que não é bom.
O presidente do Supremo e idealizador das inovações, ministro Gilmar Mendes, respondeu às críticas com um bom exemplo. Uma lei eleitoral que seja declarada inconstitucional depois de escolhido o Parlamento e o presidente da República. Segundo ele, não é possível tirar todo mundo dos cargos. “Como elaborar uma lei sem Parlamento?”, questiona. “A modulação dos efeitos da decisão é um instituto que veio para ficar.”
José Antonio Dias Toffoli, advogado-geral da União, é a favor do controle da data de validade das decisões em ADIs e ADCs. “É uma situação menos traumática do que fazer valer desde quando a lei entrou em vigor”, afirmou. Em relação ao argumento de Sepúlveda Pertence de que o instituto não poderia ter sido criado por lei ordinária, explicou que a Constituição Federal não especificou os efeitos da decisão. “É muito mais democrático que esse assunto seja tratado por legislação ordinária do que pelo Direito Constitucional”, disse.
Limites da decisão
“A Súmula Vinculante não pode valer para tudo”, afirmou Sepúlveda Pertence. Ele falava, principalmente, sobre as Súmulas 8 e 9, editadas na sessão plenária da última quinta-feira (12/6). A primeira proíbe a Fazenda de exigir contribuições sociais com o aproveitamento dos prazos de prescrição de 10 anos.
A de número 9 estabelece que o preso que comete falta grave perde os dias remidos. Para os ministros, a determinação do artigo 127 da Lei de Execuções Penais (Lei 7.210/84) é constitucional. “Não acho que a matéria penal vai se comportar nos limites da nova Súmula Vinculante”, disse Pertence.
Sepúlveda Pertence entende que a demanda na Justiça cresce na mesma medida em que aumenta o sentimento de cidadania na sociedade brasileira. Por essa perspectiva, é bom ver que o STF tem cerca de 120 mil processos anuais para analisar. O problema é que sua a estrutura não é própria para esta montanha de ações. Aí é que começa o drama de não se conseguir atender toda a procura em um prazo razoável e a necessidade desse tipo de filtro de recursos.
“Há uma multiplicação ao infinito de processos idênticos. É falso dizer que cada caso é um caso”, declarou. Quando atuava no Supremo, Pertence participou de um congresso internacional de cortes constitucionais. Depois de sua palestra, o presidente da Suprema Corte dos Estados Unidos recomendou a contratação de outra tradutora, já que aquela tinha cometido o erro de dizer que em seis meses a Corte brasileira tinha julgado 18 mil casos. “A tradutora é boa. O sistema é que não presta”, respondeu Pertence ao colega na ocasião.
E a situação atual só piorou. A Repercussão Geral, para Pertence, é um remédio contra matérias repetitivas, mas é perigoso que o afunilamento do acesso ao Supremo seja decidido por seus próprios membros. “É um instrumento que ressuscita a Argüição de Relevância que já existia”, provocou. Ao finalizar, disse que esses novos institutos são desafios que só a prudência e o bom senso político poderão torná-los eficazes.
Revista Consultor Jurídico