A Constituição brasileira de 1988, promulgada há apenas um ano de a República completar um século, procurou dar especial atenção ao problema da omissão do legislador. O texto constitucional previu a criação de instrumentos de controle de constitucionalidade tanto na forma difusa, com o Mandado de Injunção (MI), quanto na forma concentrada, com a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) por omissão. Assim, segundo muitos juristas, a Carta permitiu a declaração de inconstitucionalidade sem a pronúncia da nulidade de uma determinada norma.
O mandado de injunção é um instrumento jurídico que pode ser utilizado por qualquer cidadão que venha a se sentir prejudicado por eventuais omissões na legislação. Está no inciso LXXI do artigo 5º da Constituição Federal que deverá ser concedido o mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania.
Segundo o ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, o mandado de injunção permite que o Judiciário, de forma geral, e o STF, em particular, “supra, preencha as omissões atribuíveis aos outros poderes da República, omissões inconstitucionais”. Para o ministro, há formas diferentes de se afrontar o texto constitucional, seja por ação ou por omissão. “Viola-se de maneira positiva a Constituição mediante ação, fazendo-se aquilo que a Constituição proíbe, mas viola-se negativamente a Constituição, portanto por inércia, por omissão, deixando-se de fazer aquilo que a Constituição determina e impõe”, explica Celso de Mello.
Greve no serviço público
Um caso clássico analisado pelo STF relativo à falta de norma regulamentadora foi o julgamento dos Mandados de Injunção (MI) 670, 708 e 712. Os processos se referem ao direito de greve dos servidores públicos, previsto no artigo 37, inciso VII da Constituição, mas que ainda não foi regulamentado por lei específica.
Os mandados foram impetrados respectivamente pelo Sindicato dos Servidores Policiais Civis do Espírito Santo (Sindpol), pelo Sindicato dos Trabalhadores em Educação de João Pessoa (Sintem) e pelo Sindicato dos Trabalhadores do Poder Judiciário do Pará (Sinjep).
Diante da falta de lei para regular a greve no serviço público, o Supremo Tribunal Federal decidiu que, enquanto não for elaborada tal regulamentação, valem as regras previstas para o setor privado (Lei nº 7.783/89).
O julgamento foi realizado no dia 25 de outubro de 2007, no Plenário do STF. Naquela ocasião, o ministro Celso de Mello, ao proferir seu voto, afirmou que não era aceitável e razoável a falta de regulamentação do direito de greve no serviço público por parte do Congresso Nacional. Avaliou o ministro que é dever do STF dar efetividade às cláusulas constitucionais e que, no caso, “a inércia arrasta consigo a descrença na Constituição Federal”.
Naquele julgamento, o ministro Gilmar Mendes afirmou que essa omissão criou “um quadro de selvageria, com sérias consequências para o Estado de Direto”. Assim, a maioria dos ministros decidiu pela aplicação da Lei de Greve do setor privado ao funcionalismo público.
A divergência naquele caso foi aberta parcialmente pelo ministro Ricardo Lewandowski, acompanhado pelos ministros Joaquim Barbosa e Marco Aurélio, que estabeleciam condições para a utilização da lei de greve, considerando a especificidade do setor público.
ADO e direito de resposta
Além do mandado de injunção, há ainda um outro instrumento jurídico capaz de promover o controle de constitucionalidade da omissão do legislador. Trata-se da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO). Esse tipo de ação visa tornar efetiva norma constitucional, devendo ser dada ciência ao Poder competente para adoção das providências necessárias. A criação da norma que disciplina a tramitação da ADO é fruto do II Pacto Republicano e insere dispositivos na Lei 9.868/99 (Lei das ADIs).
No dia 22 de outubro deste ano, a ministra Ellen Gracie negou seguimento à ADO 9 ajuizada pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e pela Federação Interestadual dos Trabalhadores em Empresas de Radiodifusão e Televisão (Fitert). As entidades questionaram a omissão do Congresso Nacional no dever de regulamentação legal do exercício do direito de resposta. Na ação, argumentaram que com a decisão do STF de que a Lei de Imprensa não foi recepcionada pela Constituição de 1988, restou uma lacuna quanto à regulamentação do direito de resposta.
Mas a ministra considerou ques as duas federações não têm legitimidade para propor esse tipo de ação. “A ação direta de inconstitucionalidade por omissão poderá ser ajuizada pelos mesmos legitimados à propositura da ação direta de inconstitucionalidade e da ação declaratória de constitucionalidade”, explicou a ministra em sua decisão.
Para a ministra Ellen, “no âmbito das associações sindicais, apenas estão aptas a deflagrar o controle concentrado de constitucionalidade as entidades de terceiro grau, ou seja, as confederações sindicais, excluindo-se, portanto, os sindicatos e as federações, ainda que possuam abrangência nacional.”
No STF foram ajuizadas, até o momento, nove ações diretas de inconstitucionalidade por omissão. Duas delas tiveram seguimento negado, uma foi julgada improcedente e outras seis aguardam julgamento.