A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) negou na sessão de hoje (25) o pedido feito pela defesa do conselheiro do Tribunal de Contas do Amapá (TCE-AP) José Júlio Coelho no Habeas Corpus (HC 110697) para que fosse trancada a ação penal em trâmite no Superior Tribunal de Justiça (STJ), na qual ele está sendo processado por posse ilegal de arma de fogo de uso restrito das Forças Armadas (crime previsto no artigo 16 da Lei 10.826/2003 – Estatuto do Desarmamento).
O conselheiro, que é coronel da PM aposentado, é investigado nos autos de inquérito instaurado para apurar os crimes de formação de quadrilha, fraude a licitação, peculato e corrupção em diversos órgãos do Poder Público do Amapá. No curso desse inquérito, foram expedidos mandados de busca e apreensão em diversos endereços, entre eles, na casa do conselheiro.
Em diligência realizada no dia 10 de setembro de 2010, foram encontradas duas armas de fogo em sua residência sem o registro estabelecido no Estatuto do Desarmamento, sendo uma delas de uso restrito das Forças Armadas (uma pistola calibre 9 milímetros). José Júlio foi denunciando pelo Ministério Público Federal com base no artigo 16 do Estatuto do Desarmamento e a Corte Especial do STJ recebeu a denúncia, instaurando a ação penal.
No HC ao Supremo, a defesa do conselheiro pediu o trancamento da ação penal em curso no STJ por falta de justa causa. Alegou que, na condição de conselheiro do TCE-AP, bem como de coronel da reserva da PM, José Júlio teria autorização legal para a posse e guarda do armamento, seja pela equiparação dos membros dos Tribunais de Contas aos magistrados, seja pela equiparação das armas de calibre 9mm às de calibre 40, de aquisição autorizada aos oficiais de carreira das Forças Armadas pelo Decreto 3.665/2000, editado pelo Comando do Exército.
Mas, de acordo com o relator do HC, ministro Joaquim Barbosa, não há justa causa para o trancamento da ação penal. “Esta Corte tem decidido, reiteradamente, que o trancamento de ação penal por falta de justa causa ou por inépcia da denúncia, na via do habeas corpus, somente é viável desde que se comprove, de plano, a atipicidade da conduta, a incidência de causa de extinção da punibilidade ou ausência de indícios de autoria ou de prova sobre a materialidade do delito, o que não se verifica no caso”, afirmou.
O ministro Joaquim Barbosa esclareceu que a jurisprudência do STF acerca do prazo para a regularização de armas previsto na Lei 10.826/2003 é a de que, no período compreendido entre 23/12/2003 e 23/10/2005, o possuidor de arma de fogo poderia providenciar a regularização do registro ou a devolução da arma aos órgãos competentes, razão pela qual, neste espaço delimitado de tempo, a conduta de possuir arma de fogo de uso restrito era atípica (atipicidade temporária). Após o termo final do prazo, aquele flagrado na posse de arma de fogo de uso restrito sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar, comete, em tese, o crime tipificado no artigo 16 do Estatuto do Desarmamento.
Além disso, segundo o relator, é entendimento do STF que o tipo penal previsto no artigo 16 do Estatuto do Desarmamento, ao vincular a posse ou o porte de arma de fogo de uso restrito à autorização ou à conformidade com determinação legal ou regulamentar, “consubstanciou uma política criminal de valorização do poder-dever do Estado de controlar as armas de fogo”.
“Assim, é de se inferir que a posse legal de armas deve dar-se em conformidade com a legislação ou regulamento pertinente à espécie, o que pressupõe, por razões óbvias, a higidez cadastral da arma, de modo a permitir que o Poder Público detenha os meios necessários à fiscalização e ao controle, dentre outros aspectos, da origem, propriedade, localização, utilização e destinação das armas de fogo”, afirmou o relator.
O voto do relator foi seguido à unanimidade pelos demais ministros da Segunda Turma.