Metas na Amazônia devem aumentar cobrança sobre o Brasil

por Fabrícia Peixoto

O Brasil pode chegar a 2020 como um dos líderes em iniciativas de combate ao aquecimento global, por ter a maior floresta tropical do planeta e a uma matriz energética limpa. Mas antes terá de enfrentar o ceticismo da comunidade internacional em relação à forma como lida com seu principal ativo nessa área: a Amazônia.

Um importante passo para a conquista dessa credibilidade foi a adoção, em dezembro do ano passado, de metas específicas contra o desmatamento na região. O plano prevê uma redução de 70% nas derrubadas até 2017 e o fim do desmatamento até 2040.

Mas especialistas afirmam que, apesar de voluntárias, as metas despertarão ainda mais a vigilância internacional em relação ao que acontece na Amazônia, o que pode colocar o Brasil em posição de destaque entre países emergentes que não assumiram compromissos.

“As metas são fundamentais, pois facilitam a cobrança. É possível saber se o governo está ou não sendo coerente”, diz Adalberto Veríssimo, pesquisador da instituição sem fins lucrativos Imazon.

Para Eduardo Viola, professor de Relações Internacionais da Universidade de Brasília e especialista em mudanças climáticas, a questão da Amazônia pode colocar o Brasil numa posição complicada no debate internacional sobre a preservação do meio ambiente.

“A Amazônia tem sido nossa maior vulnerabilidade na área ambiental, o que vinha colocando o Brasil em uma situação defensiva no debate”, diz ele.

Viola afirma, entretanto, que apesar de o ceticismo internacional em relação à Amazônia ter sido a tônica dos últimos dos anos, existe uma mudança em curso.

“O desmatamento vem caindo e agora temos as metas. Tudo indica que o país está em um caminho de mudança de comportamento”, diz Viola.

Os especialistas dizem ainda que a confiança internacional é fundamental para o sucesso dos planos ambientais do país. Um deles, o Fundo Amazônia, pretende recolher doações de países ricos interessados em colaborar com a recuperação da floresta.

Para Veríssimo, o nível de cobrança sobre o governo brasileiro depende também de um outro fator, que nada tem a ver com a Amazônia: o novo governo americano.

“Se o governo Obama for realmente mais proativo do que seu antecessor, os outros países tenderão a acompanhar. Nesse caso, os Estados Unidos deixarão de ser os vilões da mudança climática”. O resultado, de acordo com o pesquisador do Imazon, será uma mudança de foco para outros países, sobretudo os emergentes.

Uma possível mudança de rumo ficará mais clara na Conferência do Clima, que acontece no final do ano, em Copenhague. Há uma forte expectativa em torno da reunião, com ambientalistas aguardando um compromisso maior dos Estados Unidos.

Custo baixo

Estimativas apontam o Brasil como responsável por 4% das emissões mundiais de gases do efeito estufa, uma posição favorável frente à posição de outros emergentes, como China (22%), Índia (8%) e Rússia (6%), que formam com o Brasil o bloco dos BRIC.

Além disso, o Brasil tem outra grande vantagem: o país é o que menos tem a perder com a redução das emissões. Um estudo da consultoria McKinsey mostra que, no Brasil, essa redução tem um custo inferior à média internacional.

Segundo o levantamento, que considera projeções para 2030, a maior parte das ações no Brasil teria um custo inferior a 10 euros por tonelada de dióxido de carbono, enquanto a média mundial será de 18 euros.

Essa vantagem financeira vem justamente da Amazônia. Isso porque, no Brasil, o grande vilão das emissões é o desmatamento, que representa mais da metade dos gases emitidos pelo país – ao contrário da maioria dos países, onde fatores urbanos, como transporte e energia, são os maiores emissores.

“Basicamente, é mais barato deixar de desmatar do que desligar uma usina termelétrica”, diz Osvaldo Stella, pesquisador do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam).

Dificuldades

Mesmo com o baixo custo, os especialistas afirmam que ainda assim não é fácil acabar com o desmatamento na Amazônia.

“Prova disso é que o governo ainda aceitará o desmatamento até 2017, o que pode comprometer até 100 mil quilômetros quadrados da floresta”, diz Adalberto Veríssimo, do Imazon. A área equivale ao Estado de Pernambuco.

Apesar de o Brasil ter uma legislação rigorosa para fins ambientais, o país ainda encontra problemas para fazer valer a lei em uma região de difícil acesso.

“Qualquer alternativa para a Amazônia será destruída se a ilegalidade dominar o modo de utilização da terra”, diz o pesquisador Carlos Nobre, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).

“Se o Brasil conseguisse cumprir a lei, nem precisava assinar qualquer tratado internacional. Bastava cumprir a nossa própria legislação para diminuir a emissão de gases”, diz Viola.
Além disso, é cada vez maior o número de pequenos e médios produtores envolvidos com o desmatamento ilegal, o que vai exigir, segundo especialistas, uma solução socioeconômica para a região.

“Não é apenas uma questão de bandidagem, mas também de sustento econômico para milhares de famílias. Não há saída para a Amazônia que não passe por uma alternativa para essas pessoas”, diz Veríssimo.

O estudo da McKinsey aponta que os programas para erradicação do desmatamento na Amazônia exigiriam 5,7 bilhões de euros, por ano, até 2030 – o equivalente a R$ 17,1 bilhões anuais.

Na avaliação de Viola, a tarefa não é impossível. Segundo ele, a sociedade brasileira já entendeu a relação entre desmatamento e mudança climática. “Esse fato não pode ser minimizado, pois é a partir dele que vêm as pressões políticas por mudança”, diz.

O Brasil ainda não conseguiu colocar o desmatamento dentro de um processo de redução contínua. O desmate vinha caindo desde 2004, mas entre 2007 e 2008 voltou a subir, com uma perda de 11,9 mil quilômetros quadrados em 12 meses.

Além disso, o próprio governo tem sido apontado como um dos maiores culpados pelas derrubadas: assentamentos promovidos pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) estão no topo do ranking dos maiores desmatadores.

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