por Claudio Julio Tognolli
O Brasil é o país onde houve maior aumento no consumo de maconha na América Latina. O aumento de cocaína também aumentou no país. Os dados foram divulgados nesta quinta-feira (26/6) o Relatório Mundial sobre Drogas 2008.
O documento, lançado no Instituto Internacional da Paz, em Nova York, sustenta que se avançou no combate às drogas, mas que esse avanço ainda não é estável. O relatório foi apresentado pelo Diretor-Executivo do Escritório das Nações Unidas contra Drogas e Crime (UNODC), Antonio Maria Costa.
“O aumento repentino de plantação de ópio no Afeganistão e de coca na Colômbia e o risco do elevado consumo de drogas em países em desenvolvimento são sérias ameaças aos avanços alcançados internacionalmente no controle de drogas”, descreve o documento.
Para o UNODC, é preciso agir em três frentes: tratar o problema de drogas como questão de saúde pública (prevenção, atenção e tratamento), prevenir o crime (romper elos entre crime organizado, corrupção e terrorismo) e respeitar os direitos humanos (particularmente em relação ao dependente químico e ao usuário de drogas).
Segundo o relatório, menos de uma em cada 20 pessoas (entre 15 e 64 anos) usou drogas nos últimos 12 meses. Os dependentes químicos são menos de um décimo desse total: 26 milhões de pessoas — 0,6% da população adulta do planeta.
“Nos últimos anos, temos acompanhado um progresso impressionante no controle internacional de drogas”, disse o Diretor-Executivo do UNODC. O tabaco mata 5 milhões de pessoas por ano; o álcool cerca de 2,5 milhões e as drogas ilícitas cerca de 200 mil pessoas por ano em todo o mundo.
“O controle de drogas vem mostrando resultados importantes. Embora o abuso de heroína, de cocaína e de drogas sintéticas seja devastador para os indivíduos, essas drogas não tiveram, comparativamente, um impacto tão grave sobre a saúde pública mundial como o álcool e o tabaco”, disse Antonio Maria Costa.
Ele advertiu, no entanto, que “no futuro, precisamos ser ainda mais proativos. Os recentes aumentos consideráveis da oferta da droga que vem do Afeganistão e da Colômbia podem aumentar a taxa de dependência química, diante dos preços mais baixos e da maior pureza nas doses”.
Drogas no Brasil
No Brasil, o relatório foi lançado à imprensa no escritório do UNODC em Brasília, pelo Representante Regional para o Brasil e Cone Sul, Giovanni Quaglia, com a presença do Secretário Nacional Antidrogas, General Paulo Roberto Yog de Miranda Uchôa, e do Delegado de Polícia Federal Paulo Tarso
de Oliveira Gomes.
O relatório revela que o uso de cocaína tem diminuído em boa parte do planeta; mas tem aumentado na América do Sul, América do Norte e alguns países da Europa. No Brasil, o segundo maior mercado de cocaína (cerca de 870 mil usuários) das Américas, a prevalência anual (uso pelo menos uma vez no último ano) passou de 0,4% da população entre 12 e 65 anos em 2001 para 0,7% em 2005, de acordo com pesquisas domiciliares feitas pelo governo.
O aumento mais importante no consumo de maconha na América Latina foi registrado no Brasil, o que reflete aumento na disponibilidade de derivados de cannabis (maconha e haxixe) do vizinho Paraguai. A prevalência anual do uso de maconha aumentou duas vezes e meia: de 1% da população entre 12 e 65 anos em 2001 para 2,6% dessa população em 2005.
Foi relatado aumento de atividades de grupos ligados ao tráfico de cocaína na região Sudeste, o que pode indicar que há mais cocaína disponível nessas áreas. O Sudeste e o Sul do país são as áreas mais afetadas pelo consumo de cocaína.
Dados do UNODC mostram que o contrabando de cocaína da região andina à Europa via África aumentou consideravelmente nos últimos três anos, com registros de 12% em 2006 e 5% em 2004. Grupos criminosos da África Ocidental continuam a dominar o tráfico no varejo em diversos países europeus. O país mencionado com mais freqüência como origem da cocaína
traficada para a África é a Colômbia, seguida do Peru. Em relação às apreensões de cocaína realizadas na África, o país de trânsito mais importante é o Brasil, seguido da Venezuela.
A América do Sul — incluindo o Caribe e América Central — foi responsável por 12% das apreensões globais de maconha. Na região, os maiores volumes de maconha apreendidos foram no Brasil (167 toneladas), Bolívia (125 t), Colômbia (110 t), Argentina (67 t), Paraguai (59 t) e Jamaica (37 t). A maioria dos países da América do Sul, especialmente Brasil, Argentina, Uruguai e Chile citam o Paraguai como principal fonte de haxixe de seus mercados.
Retrospectiva
O documento faz uma retrospectiva ao mostrar que o sistema internacional de controle de drogas foi desenvolvido ao longo de um século, a partir da comissão criada em 1909, em Xangai para controlar o comércio de ópio. Este ano, o relatório traz uma perspectiva dos últimos 100 anos de políticas internacionais sobre drogas. E mostra que, a produção mundial de ópio é cerca de 70% menor que há um século, apesar de a população mundial ter quadruplicado no mesmo período.
O relatório também analisa as tendências da droga desde a Sessão Especial da Assembléia Geral da ONU (UNGASS, na sigla em inglês) de 1998, que instou os países a se esforçarem mais para controlar a droga. “Estatísticas sobre drogas mostram que o problema foi drasticamente reduzido ao longo do último século, e tem se estabilizado nos últimos 10 anos”, disse Costa.
O Relatório Mundial sobre Drogas 2008 do UNODC também faz um alerta sobre o recente aumento da oferta de drogas. O Afeganistão teve uma colheita recorde de ópio em 2007. Em conseqüência, a produção mundial de ópio ilícito quase duplicou desde 2005. A maioria das plantações (80%) está localizada em cinco províncias do sul, onde insurgentes talibãs lucram com as drogas. No resto do país, o cultivo de ópio ou está chegando ao fim ou tem diminuído, chegando a níveis mínimos. “Mais estabilidade e mais apoio financeiro estão ajudando a livrar muitas províncias do Afeganistão do ópio. No sul, que é controlado pelos talibãs, é preciso combater conjuntamente a droga e a insurgência”, disse o diretor do UNODC.
O mesmo padrão se repete na Colômbia, onde o cultivo de coca aumentou em 27% em 2007, embora os níveis estejam 40% abaixo do recorde de produção atingido no ano 2000. O plantio da folha de coca e a produção de cocaína foram altamente concentrados em dez municípios (cerca de 5% do total de 195
municípios). Estes foram responsáveis por cerca de metade de toda a produção de cocaína (288 toneladas) e por um terço do cultivo (35 mil hectares). “Na Colômbia, assim como no Afeganistão, as regiões onde a maioria da coca cresce são controladas por insurgentes”, observou Costa.
Para os estudiosos que elaboraram o documento, o mercado mundial de cannabis (maconha e haxixe) está estável, e até ligeiramente em declínio. A produção de maconha (cannabis-erva) está cerca de 8% mais baixa que em 2004, e a produção de haxixe (cannabis-resina) diminuiu cerca de 20% entre 2004 e 2006. No entanto, há tendências preocupantes. O Afeganistão tornou-se um importante produtor de haxixe, provavelmente excedendo a produção do Marrocos. Nos países desenvolvidos, o cultivo em lugares fechados tem produzindo tipos mais potentes de maconha. O nível médio da substância psicoactiva (THC) da droga quase duplicou no mercado dos Estados Unidos entre 1999 e 2006, de 4,6% para 8,8%.
O uso de estimulantes do grupo anfetamínico (anfetaminas), como as metanfetaminas e o ecstasy, tem se mantido estável desde o ano 2000. No entanto, a produção e o consumo continuam sendo graves problemas no leste e sudeste da Ásia. Além disso, o mercado tem se desenvolvido mais no Oriente Médio.
O relatório confirma, também, que houve mudança no sistema das rotas das drogas, particularmente para a cocaína. Devido à constante procura de cocaína na Europa e melhores intervenções ao longo das rotas tradicionais, os traficantes agora focam na África Ocidental. Isso põe em risco a saúde e a segurança da região.
“Os países do Caribe, América Central e África Ocidental, bem como as regiões fronteiriças do México, estão no fogo cruzado entre o mundo dos maiores produtores da coca (países andinos) e o dos maiores consumidores (América do Norte e Europa)”, alertou Costa. “O dinheiro da droga corrompe governos, e até se transforma em financiamento do terrorismo. A promoção do Estado de Direito é a melhor forma de combater o tráfico de drogas.”
Revista Consultor Jurídico