por Adriana Pallis e Paula Seabra Carvalho
O fortalecimento do mercado de valores mobiliários brasileiro propiciou às empresas brasileiras a capacidade de obtenção de grandes volumes de recursos no mercado, notadamente por meio da abertura de capital e listagem na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), os “IPOs”. Levando em consideração, então, essa atual fase do mercado brasileiro, com a abundância e liquidez dos recursos disponíveis, as empresas, que vão a mercado e captam recursos, os têm empregado no seu próprio crescimento.
Além da utilização desses recursos para crescimento de forma orgânica, há cada vez mais uma forte tendência da utilização de tais fundos para o crescimento por meio de fusões e aquisições de outros players, criando-se assim a consolidação empresarial em diversos setores.
Considerando que as fusões e aquisições são mecanismos de crescimento das empresas e que, nestes tipos de operações, as companhias compradoras assumem obrigações e ativos da sociedade adquirida, é imperiosa a realização, precedente às fusões e aquisições, de uma auditoria legal, contábil, financeira e operacional apurada, visando a obter um “retrato” que seja o mais próximo possível da realidade da sociedade a ser adquirida, comumente denominada Target ou algum código escolhido para manter a confidencialidade da operação durante o processo de auditoria.
O processo de auditoria inicia-se com a disponibilização pela empresa objeto de alienação de documentos em data room fisicamente na sede da empresa ou em data room eletrônico (sites criados para este propósito especifico ou distribuição de CDs contendo os documentos em formato eletrônico) e são analisados pelo comprador e sua área operacional, bem como pelos assessores legais e financeiros dos possíveis compradores.
Na prática, o que se observa é que o escopo da auditoria em cada transação é distinto, sendo esta distinção decorrente dos aspectos de compliance das empresas compradoras, das características do negócio objeto de aquisição e, ainda, das eventuais sinergias que poderão ser criadas entre a compradora e a empresa objeto após a aquisição.
É por meio do processo de auditoria que os passivos da sociedade alvo são conhecidos e quantificados, adequando-se a partir daí o preço a ser ofertado e fixando-se e delimitando-se as responsabilidades dos vendedores e da compradora e eventuais indenizações cabíveis.
Além do resultado da auditoria ter impacto direto no preço a ser avençado pelas partes na aquisição, a empresa compradora passa a conhecer os riscos e benefícios adicionais de sua aquisição. Ademais, o resultado da auditoria contribui de forma positiva e imprescindível para a discussão do contrato, que deverá refletir as condições da negociação de forma clara e precisa. Assim, caso sejam encontrados problemas, passivos e contingências na auditoria, existem mecanismos contratuais, por meio de inclusão de cláusulas, que poderão ser utilizados nos contratos de compra e venda para mitigar os riscos dos compradores.
Em muitos contratos de compra e venda de sociedade, senão em todos, inserem-se cláusulas de indenização das sociedades para que os passivos ocultos, bem como quaisquer passivos que não foram detectados pela auditoria realizada sejam de responsabilidade dos vendedores. Nesse modelo de cláusula, os vendedores se obrigam a indenizar os compradores sobre atos ou fatos que tenham ocorrido antes da execução dos contratos de compra e venda, assumindo assim todos os passivos decorrentes de tais atos.
Em alguns casos, tendo em vista a maior possibilidade de materialização das contingências logo no período posterior ao negócio, a cláusula de indenização do contrato de compra e venda prevê ainda que o vendedor deverá outorgar certas garantias em favor do comprador durante um determinado período de tempo. Entre essas garantias, podemos destacar como uma das mais usuais a conta escrow, que consiste em uma conta bancária vinculada onde parte do preço é depositada durante o período acordado entre as partes.
Caso, durante tal período, alguma indenização venha a ser devida pelos vendedores aos compradores, o montante correspondente será sacado da conta e transferido para a titularidade dos compradores. Ao fim do período, o saldo restante é então transferido aos vendedores como uma parcela final do preço. Outras garantias, como fiança bancária e penhor de participações societárias ou bens também são utilizadas em negócios dessa natureza.
Há também, eventualmente, situações diametralmente opostas à descrita acima, quando, em razão da característica do negócio e da situação da empresa, o comprador aceita assumir todos os passivos e contingências da sociedade adquirida. Ocorrendo essa hipótese, há logicamente um impacto na definição do preço devido à possibilidade de desembolsos pelo comprador decorrentes de contingências e passivos assumidos na sucessão.
Os contratos de compra e venda usualmente prevêem também mecanismos que permitem ao vendedor participar da defesa de processos judiciais ou procedimentos administrativos instaurados por terceiros em face à sociedade adquirida, após o fechamento da operação, mas referentes a atos ou fatos anteriores à aquisição.
Os resultados da due diligence também podem ser utilizados no estabelecimento de condições suspensivas para a realização do negócio. Além disso, permite às partes ter informações suficientes e necessárias ao estabelecimento de obrigações pré e pós-fechamento.
Resta claro, portanto, que uma auditoria realizada de forma precisa e completa além de imprescindível para realização da operação, torna a integração entre os negócios e a transição da administração mais fáceis, na medida em que possibilita a confecção de um contrato de aquisição mais adequado para a transação e que confere maior segurança jurídica ao negócio.
Revista Consultor Jurídico