O Ministério Público Federal anunciou na noite desta sexta-feira (2/5) que o juiz substituto Márcio Ferro Catapani, da 2ª Vara Federal Criminal de São Paulo, especializada em crimes financeiros e lavagem de dinheiro, aceitou denúncia e abriu processo contra treze investigados na Operação Santa Tereza, da Polícia Federal, que investiga “prostituição, tráfico de pessoas, fraudes em financiamentos do BNDES e lavagem de dinheiro”.
O juiz acolheu parcialmente o pedido da procuradora da República Adriana Scordamaglia e decretou a prisão preventiva de três dos acusados, mas negou o pedido de prisão contra o advogado Ricardo Tosto, conselheiro do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, BNDES, que já se encontrava solto.
O MPF tentou convencer a Justiça Federal de que a prisão preventiva de Tosto e outros réus era necessária por entender que há reiteração criminosa, abalo à ordem econômica, necessidade de garantia da instrução do processo e o surgimento de indícios de destruição de provas e do uso de poder político para desqualificar a investigação. O juiz entendeu que o Ministério Público não demonstrou suas teses — construídas basicamente sobre diálogos telefônicos interceptados.
O Ministério Público reforçou o pedido de prisão preventiva invocando diligências que ainda precisariam ser realizadas. Em liberdade, argumentou-se, os acusados podem atrapalhá-las. “O poder econômico dos réus pode também ser utilizado para coagir testemunhas”, cogitou-se.
O juiz decretou a prisão preventiva de três dos seis réus que estavam presos temporariamente: José Carlos Guerreiro, Marcos Vieira Mantovani e João Pedro de Moura. O réu Manuel Fernandes Bastos Filho, apontado como dono da casa de prostituição WE e suposto articulador do esquema de mascaramento das fraudes nos financiamentos, já teve a prisão preventiva decretada pela Justiça Federal de ofício, em virtude de não ter sido encontrado. Ele está foragido.
O MPF requereu também a remessa da cópia integral dos autos ao Tribunal Regional Federal da 3ª Região e ao Supremo Tribunal Federal, “por haver, até o momento, apenas suspeitas do envolvimento do prefeito da Praia Grande Alberto Mourão e do deputado Federal Paulo Pereira da Silva, o Paulinho, nos crimes retratados na denúncia”. Mourão e Paulinho são autoridades que gozam de foro privilegiado, mas ambos são citados pelos réus em várias conversas interceptadas.
A Polícia Federal diz que a operação Santa Tereza começou com uma investigação, em 2007, sobre a casa de prostituição WE, no bairro da Bela Vista, em São Paulo, para apurar denúncias de que os responsáveis pelo estabelecimento, além de explorar a prostituição, estariam também envolvidos com o tráfico de pessoas.
No curso das interceptações autorizadas judicialmente teriam surgido entre os investigados que eram monitorados conversas sobre financiamentos públicos, reuniões com políticos e pagamentos de comissões. Com isso, a investigação passou a trabalhar com duas diferentes hipóteses de crime: o financeiro e o tráfico de mulheres.
O esquema envolvendo empréstimos envolveria nove réus: Bastos, Celso Murad, Mantovani, Tosto, Moura, Jamil Issa, Guerreiro, Boris Timoner e Wilson de Barros Consani Júnior. Segundo a denúncia, a operação consistiria no uso de contatos e influência junto ao banco. Os beneficiários dos financiamentos pagariam uma porcentagem sobre o valor liberado, entre 2 e 4% do valor total.
No caso da prefeitura de Praia Grande, o pagamento da comissão passaria pela conta da empreiteira Termaq, do réu José Carlos Guerreiro, que iria realizar as obras. Para justificar as retiradas no caixa da empresa seriam apresentadas notas para pagamento de uma suposta consultoria pela Progus, empresa do réu Marcos Vieira Mantovani.
Segundo os investigadores, de cada vinte milhões de reais liberados pelo BNDES em favor da prefeitura de Praia Grande, quatrocentos mil reais (2%) seriam desviados e divididos entre os membros da quadrilha. A intermediação entre a prefeitura e os demais réus seria feita pelo assessor da prefeitura Jamil Issa Filho.
No caso das Lojas Marisa, o dinheiro teria sido pago à Progus que também emitiu notas de prestação de consultoria e repassou os valores a Timoner. Consani, por sua vez, segundo a denúncia, prestava serviços à WE e recebia comissões por isso.
O MPF denunciou três integrantes desse grupo pelo crime de lavagem de dinheiro: Bastos Filho, que aplicaria o dinheiro das comissões na WE; Murad, que movimentaria o dinheiro nas contas da casa; e Moura.
No ramo do alegado tráfico de pessoas e prostituição atuariam todas as pessoas ligadas a WE: Bastos Filho, Murad, os irmãos Washington Domingos Napolitano e Edson Luis Napolitano, que gerenciavam as atividades da casa noturna e, inclusive, autorizavam a entrada e a saída de clientes da casa e recebiam os pagamentos dos programas das prostitutas.
Consani, coronel reformado da Polícia Militar paulista, utilizaria sua influência para manter a casa aberta e receberia por isso. Suspeita-se de que ele pagava propina para servidores públicos deixarem de cumprir atos fiscalizatórios num momento em que a prefeitura de São Paulo combatia o setor, fechando outras casas do gênero, como o Bahamas e o Café Photo. Consani, Murad e Bastos Filho seriam os únicos réus que aparecem nos dois “ramos” da quadrilha (crime financeiro e prostituição).
Para apurar indícios de corrupção ativa e passiva e o envolvimento dele com um fiscal municipal, o MPF pediu que cópias dos autos ou de partes do processo sejam remetidos à Justiça Estadual.
Na investigação teriam sido detectados contatos dos acusados com agenciadores de prostitutas em pelo menos quatro estados: Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Goiás. Um deles, Marcelo Rocha de Miranda, teria sido identificado e denunciado pelo MPF pelo crime de tráfico interno de pessoas.
Quanto ao tráfico internacional de mulheres, a investigação teria identificado a intermediação de Jack Rubinstein Leiderman para acertar com uma garota de programa que trabalhava na casa o envio de algumas prostitutas, da WE e de outros estabelecimentos para um prostíbulo recém aberto na cidade de Lugano, na Suíça. Leiderman foi denunciado pelo crime de tráfico internacional de pessoas.
Manuel Fernandes de Bastos Filho e Celso de Jesus Murad responderão por formação de quadrilha, favorecimento da prostituição, casa de prostituição, rufianismo (obter lucro com a prostituição alheia), tráfico interno de pessoas, desvio na aplicação de financiamento e lavagem de dinheiro;
Já Marcos Vieira Mantovani, Ricardo Tosto de Oliveira Carvalho, João Pedro de Moura, Jamil Issa Filho, José Carlos Guerreiro e Boris Bitelman Timoner responderão por formação de quadrilha e desvio na aplicação de financiamento (artigo 20 da lei 7.492/86);
Washington Domingos Napolitano e Edson Luis Napolitano, que gerenciavam a casa noturna WE, responderão em liberdade por formação de quadrilha, favorecimento e casa de prostituição, rufianismo e tráfico interno de pessoas;
O coronel reformado da Polícia Militar paulista, Wilson de Barros Consani Júnior, responderá pelos crimes de formação de quadrilha, favorecimento e casa de prostituição, rufianismo, tráfico interno de pessoas, tráfico de influência e desvio na aplicação de financiamento.
Jack Rubinstein Leiderman responderá por tráfico internacional de pessoas; e Marcelo Rocha de Miranda será processado por tráfico interno de pessoas.
Com informações da Assessoria de Comunicação da Procuradoria da República no Estado de S. Paulo
Revista Consultor Jurídico