Pagamento de precatórios – Lei mineira sobre precatórios tem inconstitucionalidades

por Bruno Mattos e Silva

O governador do estado de Minas Gerais promulgou a Lei 17.710, de 8 de agosto de 2008, que dispõe sobre as diretrizes para a elaboração da lei orçamentária para o exercício financeiro de 2009 (LDO). De acordo com o artigo 29 dessa lei, as dotações orçamentárias para pagamento dos precatórios não serão consignadas diretamente para o Poder Judiciário, mas sim para os órgãos devedores.

Portanto, há clara violação ao artigo 102, parágrafo 2º, da Constituição Federal, que assim dispõe: “Artigo 100. à exceção dos créditos de natureza alimentícia, os pagamentos devidos pela Fazenda Federal, Estadual ou Municipal, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim.

§ 2º As dotações orçamentárias e os créditos abertos serão consignados diretamente ao Poder Judiciário, cabendo ao Presidente do Tribunal que proferir a decisão exeqüenda determinar o pagamento segundo as possibilidades do depósito, e autorizar, a requerimento do credor, e exclusivamente para o caso de preterimento de seu direito de precedência, o seqüestro da quantia necessária à satisfação do débito.”

Dotação orçamentária se traduz em autorização para pagamento. Quem tem a dotação pode pagar. Isso não significa que o pagamento autorizado será feito, pois a autorização conferida na lei orçamentária não obriga o órgão ou entidade contemplado pela dotação. No caso do Judiciário, porém, o parágrafo 6º do artigo 100 da CF estabelece que é crime de responsabilidade deixar de efetuar o pagamento de precatórios. O parágrafo 2º do artigo 100 determina que a dotação seja para o Judiciário exatamente para subtrair do Executivo a possibilidade de deixar de pagar os precatórios.

Com efeito, o parecer aprovado na Assembléia Legislativa que aprovou o projeto expressamente rejeitou a Emenda 58, de autoria de uma Deputada de oposição. A Emenda 58, rejeitada, pretendia alterar o projeto de lei para que fosse cumprido o disposto no artigo 100, parágrafo 2º, da Constituição Federal. De acordo com a Emenda rejeitada, as dotações orçamentárias para pagamento de precatórios seriam consignadas para o Poder Judiciário (e não para os órgãos devedores).

Casos de inconstitucionalidade de leis municipais e estaduais são abundantes nas estatísticas do STF. No caso concreto, a questão ficou mais evidente, pois a inconstitucionalidade foi reconhecida pelo deputado relator do projeto que deu origem à Lei em análise. Vejamos o que consta do parecer aprovado, de lavra do relator do projeto que deu origem à Lei em análise, Deputado da base de apoio do Governador Aécio Neves:

“A Emenda 58 propõe que a despesa com precatórios judiciários e o cumprimento de sentenças judiciais seja programada, na Lei Orçamentária, em dotação específica consignada diretamente ao Poder Judiciário, que proferiu a decisão exeqüenda. Em que pese à legitimidade da proposta, tendo em vista o disposto no parágrafo 2º do artigo 100 da Constituição da República, rejeitamos a emenda, dada sua inexeqüibilidade, uma vez que o seu acatamento implicaria a mudança na sistemática atual de pagamento de precatórios, medida que requer planejamento e tempo para sua implementação.”

Como se vê, o parecer aprovado reconheceu que a Emenda 58 adequaria o projeto ao que dispõe a Constituição Federal. Mas não a acolheu, alegando que isso iria requerer “planejamento e tempo” para implementação.

Com a devida vênia, a LDO é exatamente para isto: estabelecer como o projeto de lei orçamentária será elaborado, para ser aprovado em um determinado ano e executado no ano seguinte. Se não fosse para as adequações necessárias, não seria necessária uma LDO anual: bastariam regras perenes.

Mas o pior é reconhecer que a Emenda iria corrigir um vício de inconstitucionalidade no Projeto e, em vez de acolhê-la, decidir por rejeitá-la, prejudicando os credores do Estado.

Conivente com isso, até porque a redação do dispositivo decorreu de projeto de sua iniciativa, o Governador do Estado de Minas Gerais não vetou o dispositivo inconstitucional.

Com isso, os credores do Estado de Minas Gerais são prejudicados, pois a dotação orçamentária será feita para os órgãos devedores e não para o Poder Judiciário. Com esse mecanismo, os credores não terão a garantia do recebimento dos seus créditos prevista nos parágrafos 2º e 6º do artigo 100 da Constituição Federal.

Revista Consultor Jurídico

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