A Turma Recursal Criminal do Estado do RS absolveu homem acusado de ato obsceno por nadar nu no Rio Pulador, na cidade de Ibirubá (RS). O colegiado formado por três juízas entendeu que “não houve infração penal, pois o réu não agiu deliberadamente com a intenção de ofender o pudor alheio”.
O Ministério Público ofereceu denúncia narrando que às 14h de 2 de dezembro de 2008, um quente dia de verão, uma testemunha – acompanhada do filho, da cunhada, de um amigo e duas crianças – dirigiu-se ao Rio Pulador para pescar. Chegando ao local, ela se deparou com o réu nu sentado sobre uma pedra molhando os cabelos. A autora, então, perguntou três vezes ao homem se ele iria vestir-se.
Não obtendo resposta, ela decidiu chamar a Brigada Militar, que quando chegou ao local encontrou o homem já vestindo-se. “Senti-me ofendida pelo fato de o acusado estar nu em lugar inapropriado, bem como por haver me ignorado – em lugar onde vão crianças – quando questionado se ele iria vestir-se” – disse em Juízo a mulher que chamou a Brigada Militar.
O réu admitiu que se banhava nu, pois “estava muito quente e não queria molhar suas roupas”.
Ponderou que ao perceber a aproximação das mulheres, vestiu-se imediatamente e contou também que
eventualmente ia ao local, pois, apesar de consistir em propriedade privada, era aberto ao público.
Em primeira instância, o homem foi condenado por ato obsceno (art. 233 do Código Penal). O juiz Ralph Moraes Langanke, da Vara Judicial, da comarca de Ibirubá (RS), substituiu a pena privativa de liberdade por seis meses de prestação de serviço à comunidade. Para o magistrado, “a consumação do crime ocorre com a prática efetiva do ato, independente de que alguém o tenha presenciado ou se sinta ofendido, visto que o objeto jurídico protegido pela norma penal incriminadora é o pudor público, sendo o sujeito passivo a coletividade”.
A defesa apelou pedindo a absolvição do réu.
Ao analisar os depoimentos, a relatora da Turma Recursal Criminal, juíza Laís Ethel Corrêa Pias, considerou não configurado o delito, pois o acusado não agiu com dolo. “Não entendo que o acusado tenha, com sua conduta, objetivado chocar e ferir o decoro das pessoas que presenciaram a cena. A meu ver, o réu banhava-se com o intuito de se refrescar, todavia o fez em lugar exposto ao público, uma vez que havia residências em torno do local e poderia ser ele acessado livremente por qualquer pessoa”.
O voto prossegue afirmando que “apesar de ter assumido o risco de ser presenciado nu, vejo como culposa a conduta, inexistindo para o delito punição a título de culpa, pois não praticou qualquer gesto ofensivo obsceno”.
As juízas Ângela Maria Silveira e Cristina Pereira Gonzales acompanham o voto da relatora, ponderando que “apesar do lugar inadequado, foi suficiente a advertência sofrida pela abordagem policial e o fato de ele estar respondendo ao processo”. (Proc. nº 71002582849).
Outros trechos do voto da relatora
“É sabido que, hoje em dia, houve significativas mudanças sociais no sentido de tolerar determinadas atitudes. A nudez perdeu seu caráter de tabu, ainda que devam ser respeitados certos limites.
Não havendo o réu praticado gesto ofensivo a fim de chocar as pessoas que o flagraram, entendo como suficiente a advertência sofrida, por parte dos policiais que o abordaram, bem como responder ao processo, já serve como uma espécie de punição, parecendo-me excessiva qualquer punição na esfera penal.
O Direito Penal deve estar em sintonia com princípios morais e éticos, absorvendo as freqüentes mudanças atinentes a comportamentos considerados aceitáveis ou não.
Mostrando os meios de comunicação condutas bem mais ousadas que a do réu, entendo como impossível puni-lo na esfera penal por tomar banho nu em lugar público, num dia de calor, com o objetivo de refrescar-se.
Ainda que não seja sua conduta apropriada – razão pela qual foi advertido pela vítima indireta e pelo policial que o abordou – estaria uma eventual condenação ofendendo o princípio da intervenção mínima do Direito Penal”.
Juíza Laís Ethel Corrêa Pias.