Pesquisa que mata – Vinícius prova que embrião congelado há oito anos tem vida

por Claudio Fonteles

Artigo originalmente publicado no jornal Folha de S. Paulo na terça-feira (1/4)

A professora Lygia Pereira, em recente artigo, perguntando-se sobre o que considerou “uma nova polêmica surgiu no mundo todo: este embrião é uma vida ou não?”, foi rápida e enfática na resposta: “Ora é claro que ele é uma forma de vida humana, assim como um feto, um recém-nascido e um idoso também são”.

Pensei: bem a controvérsia está terminada, pelo menos entre nós dois, pois se o embrião, assim como o feto, o recém-nascido e o idoso, todos constituem-se forma de vida humana, vistos por certo nos estágios cronológicos de sua existência, o embrião é vida humana.

Mas eis que a professora Lygia prossegue e, após estabelecer que “a real questão é que formas de vida humana nós permitiremos perturbar?”, sustenta que “a vida mencionada na nossa Constituição já é legalmente violada em algumas situações” e elenca a morte cerebral e a permissão do aborto em caso de estupro ou de risco de vida para a gestante a perguntar, então: “E aquele embrião de cinco dias, produzido por fertilização in vitro e armazenado em um congelador, em que condições ele é uma forma de vida passível de se ser violada?”, para responder: “A Lei de Biossegurança, de 2005, permite o uso para pesquisa de embriões inviáveis — que não sejam capazes de se desenvolver em um recém-nascido, ou que estejam congelados há mais de três anos”.

Anotado o eufemismo “que formas de vida humana nós permitiremos perturbar” e poucos dias após o início do julgamento, eis que a imprensa escrita brasileira, em decisiva matéria sobre o assunto, documenta a existência do menino Vinicíus, de seis meses, embrião congelado por oito anos, destacada a frase de sua mãe, Maria Roseli, a dizer: “Imagine se eu tivesse doado o embrião para a pesquisa”.

É a comprovação clara do que a professora Alice Teixeira asseverou na audiência pública — no que não foi contestada até hoje — no sentido de que há no mundo, especificamente nos Estados Unidos, pessoas, embriões congelados por sete, nove e até 13 anos.

No Brasil, a professora Alice Teixeira apontou o caso de Alissa, embrião congelado por seis anos. Por certo, inúmeras são as pessoas, embriões congelados por vários anos.

Tais fatos, tão inequívocos, constatam que o prazo único de três anos, posto no artigo 5º da Lei de Biossegurança, após o que autorizada estava a pesquisa com embriões, é prazo aleatório, destituído de qualquer fundamento científico sério.

O princípio constitucional, que consagra como direito individual fundamental a inviolabilidade da vida humana, queda inexoravelmente comprometido a permitir-se permaneça a eliminação do embrião humano, para qualquer fim.

Inviolabilidade da vida humana significa destacar e colocar em patamar supremo a existência do ser humano. Como manter-se pesquisa cujo objeto é embriões humanos congelados se, quando descongelados e implantados no útero materno, vivem? Se há os que morrem, há os que vivem. Aí estão Alissa, Vinícius, e tantos mais.

O princípio da inviolabilidade da vida humana não se define por estatísticas. Demonstrado, e provado, como está, e por forma inequívoca, que o embrião congelado, por mais de três anos, vive, a norma jurídica, que autoriza sua eliminação para pesquisa, é flagrantemente inconstitucional.

Como, ainda, e diante de fatos tão claros e inequívocos, dizer-se que Alissa, Vinícius e tantos mais não são vidas humanas, não são brasileiros, porque foram embriões congelados e, segundo o pensamento do relator, ministro Carlos Britto, fecundados in vitro estariam condenados à solidão infinita, e vida neles não há?

Depois que propus a Ação Direta de Inconstitucionalidade, linhas várias de pesquisa abriram-se a indicar o valor do líquido amniótico, da placenta, do cordão umbilical, a presença das células-tronco adultas nas paredes de todos os vasos sanguíneos — aqui graças ao trabalho de equipe de pesquisadores da USP de Ribeirão Preto, segundo declaração à imprensa do professor Dimas Tadeu Covas — no tratamento das doenças degenerativas.

O professor Tompson, quem primeiro pesquisou com células tronco embrionárias, abandonou essa linha de pesquisa para concentrar-se, como o faz o professor Yamanaka e equipe, em outra vertente: a reprogramação genética das células adultas, conduzindo-as à pluripotência.

O leque de pesquisas está aberto. Por quê insistir naquela vertente, que já tem caminhada de dez anos, e cujo resultado é nenhum ou, a dizer com a realidade, cujo resultado é violar a vida humana?

Termino repetindo o alerta de Maria Roseli, mãe de Vinícius: “Imagine se eu tivesse doado o embrião para a pesquisa”.

Revista Consultor Jurídico

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