por Zélio Furtado da Silva
É preciso repensar o discurso segundo o qual a morosidade da Justiça tem como motivo o excessivo número de recursos, meio através do qual autor ou réu pedem ao tribunal a reforma de uma decisão proferida pelo juiz da causa. Para que tal afirmação fosse verdadeira ter-se-ia que admitir que os processos que não se interpõem recursos são rapidamente julgados e suas decisões do mesmo modo executadas, tal não ocorre. Os processos nunca terminam nos prazos fixados por lei, mesmo não se interpondo recurso contra as decisões proferidas.
Também se engana quem maldosamente confere aos advogados das partes a culpa pela morosidade da Justiça, atribuindo-se a esses profissionais adjetivos depreciativos, muitas vezes taxando-os como “mafiosos” vilões dessa prestação jurisdicional agonizante e frustrante. As partes e seus advogados são as verdadeiras vítimas de uma prestação jurisdicional morosa e tardia. Sujeitas ao formalismo do processo, aos prazos rígidos e fixados na lei, e sob permanente vigilância do juiz, são as partes e seus advogados quem menos contribuem para a demora na prestação jurisdicional.
O verdadeiro problema da morosidade da Justiça é o descumprimento dos prazos pelo juiz. E, secundariamente, a estrutura deficiente do Poder Judiciário. Vencidos esses dois entraves a prestação jurisdicional ocorreria de forma célere e eficiente. Nunca me convenceu a idéia de que somente as partes são punidas quando não atendem aos prazos processuais enquanto os juízes nada respondem pelo retardamento na prolação dos despachos e decisões. A lei não empresta tratamento diferenciado, todavia não fixa sanção correspondente em caso do juiz não cumprir os prazos que lhe assiste no processo. Causa frustração e revolta às partes e seus advogados esperar dias por um mero despacho quando está o juiz obrigado a proferi-lo no prazo de quarenta e oito horas. Por vezes, espera-se anos a fio por uma sentença, quando por lei está o juiz obrigado a proferi-la no prazo de dez dias (art. 189, incisos I e II do Código de Processo Civil vigente), podendo exceder, por igual tempo, em casos de motivo justificado (art. 188 do mesmo CPC).
Na relação processual todos estão obrigados a cumprir prazos, ao que não cumpre cabe atribuir a responsabilidade pelo atraso. Via de regra, acontece do juiz não proferir o despacho ou decisão no prazo estabelecido. Portanto, é hipocrisia se dizer que o problema da morosidade da Justiça está no Código de Processo Civil e no número de recursos, quando não se cuida de estabelecer de forma objetiva uma sanção pecuniária para cada dia que o juiz retarde a prestação jurisdicional. A alegada falta de estrutura para trabalhar, insuficiência de pessoal para auxiliá-lo, instalações inadequadas, espaço físico, número de processos etc., não deixa de ser verdade, contudo tal carência não é culpa das partes nem dos seus representantes não devendo desse modo ser prejudicados por conta do desleixo público.
O Estado-juiz quando chamou para si o monopólio da jurisdição obrigou-se perante a sociedade em provê-la suficientemente de condições de resolver suas contendas, seus conflitos através unicamente do Poder Judiciário. Se tal Poder não oferece condições sequer de seus agentes cumprirem à Lei e realizar os atos processuais nos prazos do lapso de tempo previsto, é necessário então se repensar urgentemente sobre esse monopólio de jurisdição estatal, antes que outras instâncias informais brotem dessa sociedade tão carente de soluções rápidas, justas e eficientes de seus conflitos.
Revista Consultor Jurídico