O Projeto de Lei Orgânica da Polícia Federal enviado ao Congresso Nacional pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, há quase 15 dias, começou, lentamente, a dividir a corporação. Ele tem apoio incondicional dos delegados, mas já provoca descontentamento dos agentes federais. Tanto que, a partir de quarta-feira (9/12) e por três dias, em Brasília, representantes de quase 20 mil policiais federais, que encabeçam as entidades de classe agregadas a Fenapef, sentam-se para discutir o tema. Não descartam a promessa de uma greve: dizem-se enganados.
É prometida à categoria uma Lei Orgânica da Polícia Federal desde o final da década de 60. A corporação veio sendo tocada na base de decretos, alguns instituídos pelos governos militares, como o de número 4.878, de 1965, e que ainda vige. “Tem muito agente federal que dá risadas ao ler isso porque esse decreto sustenta que se algum policial torturar alguém, esse crime prescreverá em 30 dias, mas se falar mal do diretor-geral da PF pode ser demitido”, diz Francisco Carlos Garisto, ex-presidente e fundador da Federação Nacional dos Policiais Federais. “A categoria foi enganada, o governo está desunindo a PF. Haviam nos prometido algo moderno, avançado”, avalia.
O artigo 5º do Projeto de Lei 6.493/2009 sustenta que a direção da PF é exercida por diretor-geral nomeado pelo presidente da República entre os ocupantes do cargo de delegado da Polícia Federal na última categoria de promoção funcional. O projeto prevê, ainda, que o ingresso no cargo de delegado requer diploma de bacharel em Direito e, no mínimo, dois anos de atividade jurídica ou de polícia judiciária.
Aos olhos dos delegados, tudo isso é muito bom. Mas os agentes discordam: chamam isso de “bacharelismo”. Eles avaliam que quem investiga crimes não pode estar preocupado, num primeiro momento, tão-somente com o artigo em que o suspeito vai ser enquadrado.
O deputado federal Laerte Bessa (PSC-DF), um ex-delegado de Polícia Civil, foi designado relator do Projeto de Lei 6.493/2009 (Lei Orgânica da Polícia Federal e Polícia Civil do Distrito Federal), em 2 de dezembro passado, durante a reunião ordinária da Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado (CSPCCO), no plenário seis da Câmara dos Deputados. Aos olhos dos agentes, um relator delegado manteria na Lei Orgânica apenas interesses de sua categoria.
Os agentes, que se reúnem por três dias, também protestam que o Projeto de Lei 6.493/2009 traz apenas um artigo a tratar das funções do agente. “E se um delegado for do PT? Um artigo apenas, tratando das atribuições do agente, vai manter o esquema de operações selecionadas, aquelas feitas para saírem no Jornal Nacional e depois não darem em nada”, avalia um agente federal lotado em Brasília.
O governo discorda. Segundo o ministro da Justiça, Tarso Genro, e o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo Silva, que assinam a proposta, a autonomia “implica a um só tempo maior isenção na condução das investigações e maior rapidez na condução dos inquéritos, sem qualquer prejuízo ao Estado Democrático de Direito, à proteção aos direitos do cidadão e à dignidade da pessoa humana”. Na exposição de motivos, Tarso Genro e Paulo Bernardo destacam ainda a presença do Conselho Superior de Polícia, do Conselho de Ética e Disciplina e do Conselho Consultivo — que terá em sua composição, além de integrantes da carreira da PF, “cidadãos brasileiros de reputação ilibada e idoneidade moral inatacável”.