Risco financeiro – Trabalhador se arrisca ao investir FGTS

Por Camila Rigo

O Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) foi criado pela Lei 5.107/66, passando a vigorar em 1967, e hoje é regido pela Lei 8.036/90. Sua função é proteger o trabalhador demitido sem justa causa e garantir uma verba para emergências e ajuda de custo para assuntos importantes, como saúde e habitação.

Todos os empregadores são obrigados a depositar, em conta bancária vinculada, a importância correspondente a 8% da remuneração paga ou devida, no mês anterior, a cada trabalhador, incluindo na remuneração as parcelas de que tratam os artigos 457 e 458 da Consolidação das Leis Trabalhistas (comissões, gorjetas, gratificações etc) e a gratificação de Natal a que se refere a Lei 4.090/62, com as modificações da Lei 4.749/65. Assim, o FGTS é constituído pelo total desses depósitos mensais.

Os valores do FGTS pertencem exclusivamente aos empregados e, conforme o parágrafo 2º do artigo 2º da Lei 8.036/90, “As contas vinculadas em nome dos trabalhadores são absolutamente impenhoráveis”. Ainda assim, o empregado só pode dispor do valor total ou parcial depositado em seu nome nas situações determinadas no artigo 20 dessa lei.

Desde 1997, com a Lei 9.491, foi incluída no artigo 20 da Lei 8.036/90 a possibilidade de o trabalhador utilizar-se de 50% do saldo existente e disponível em sua conta vinculada do FGTS para a aplicação em cotas de Fundos Mútuos de Privatização. As aplicações realizadas em Fundos Mútuos de Privatização são nominativas, impenhoráveis e indisponíveis, salvo em hipóteses elencadas na lei. Essas aplicações poderão ser redirecionadas por seus titulares a outros fundos num interregno de seis meses. E, decorrido o prazo mínimo de doze meses, contados da efetiva transferência das cotas para os Fundos Mútuos de Privatização, os titulares poderão optar pelo retorno para sua conta vinculada do FGTS.

Com base nessa concessão da lei de 1997, o senador Sérgio Zambiasi (PTB-RS) redigiu o Projeto de Lei 273/03, que se encontra pronto para votação na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, cujo objetivo é ampliar o investimento do FGTS, no mesmo limite de investimentos para os Fundos Mútuos de Privatização (50%), para que o trabalhador possa aplicar em programa de participação no capital da empresa em que trabalha.

Para o senador Zambiasi, a realização desse projeto de lei é embasada numa maior rentabilidade ao empregado que investe em ações da empresa privada em que labora. Assim, além do salário percebido, ainda receberá dividendos sobre os investimentos realizados e ajudará a empresa a se capitalizar.

O projeto ainda tem um longo caminho a ser percorrido e certamente encontrará alguns obstáculos. Apesar de encontrar apoio na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), que tem sugerido a criação e aprovação de uma medida que permita ao trabalhador um maior investimento no mercado de ações, o Ministério do Trabalho é contrário ao Projeto de Lei 273/03 e emitiu um parecer aduzindo que o interesse que nele se busca é diverso da finalidade do FGTS, que é de acumular recursos para custear a habitação e saneamento e, também, que tal medida beneficiará poucos trabalhadores.

Isso porque ele não prevê qualquer garantia ao trabalhador que investir em ações de uma determinada empresa que eventualmente se desvalorizem. O risco que acometerá o trabalhador é o mesmo que acomete hoje os investidores da Bolsa de Valores. O trabalhador, nesse caso, está por sua conta, arriscando um valor que tem a função de ser sua garantia de verba. Qual trabalhador utilizará até metade de seus depósitos acumulados durante uma longa jornada de trabalho para realizar investimentos de certa forma incertos?

Afinal, o FGTS foi criado para que o trabalhador possa dispor do valor total do montante depositado na conta vinculada em caso de dispensa sem justa causa, em caso de extinção da empresa, em caso de aposentadoria concedida pelo INSS e em caso de falecimento do trabalhador, desde que seus herdeiros estejam habilitados perante a Previdência Social. Ou para custeio do tratamento quando o trabalhador ou qualquer de seus dependentes for acometido de neoplasia maligna, for portador do vírus HIV ou estiver em estágio terminal, em razão de doença grave.

E mais. O trabalhador que permanecer três anos ininterruptos fora do regime do FGTS poderá sacar o valor ali depositado a partir do mês de aniversário do titular da conta. Também dá ensejo ao saque do FGTS a suspensão total do trabalho avulso por período igual ou superior a 90 dias, desde que comprovada por declaração do sindicato representativo da categoria-profissional.

Uma das modalidades mais conhecidas da utilização do FGTS é para financiamento habitacional, ou amortização, de um único imóvel, sob alguns pré-requisitos, estipulados na lei. O governo, inclusive, pretende lançar um pacote para fomentar o mercado de habitação no país com foco na população de baixa renda, ainda em análise pelos Ministérios da Fazenda e das Cidades. Segundo a presidente da Caixa Econômica Federal, Maria Fernanda Ramos Coelho, entre os itens em avaliação está a elevação do teto que permite o uso do FGTS para financiamento de imóvel — o valor máximo, que é de R$ 350 mil, pode ser elevado a R$ 500 mil. Para o plano de habitação, também se estudam mecanismos de garantia, como, talvez, o uso de um seguro específico para cobrir essas despesas, a fim de que não perca o imóvel quem tiver dificuldade em quitar as prestações em caso, por exemplo, de perda de emprego.

Outra hipótese de saque do FGTS envolve os casos de calamidade pública, emergência ou necessidade pessoal ocasionada por desastre natural, desde que reconhecido pelo Poder Público que o trabalhador residia em áreas comprovadamente atingidas, como ocorrido em Santa Catarina face às chuvas que devastaram municípios inteiros.

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