por Melissa Guimarães Castello
Analisando a proposta de Reforma tributária sob uma ótica ambientalista, o que se vê é um retrocesso. Dentre os tributos extintos pela reforma está a Cide (Contribuição sobre Intervenção no Domínio Econômico), que, por suas características de estímulo à proteção do meio ambiente, é considerada um tributo ambiental. A Cide tem parte de suas receitas destinadas ao financiamento de projetos ambientais relacionados com a indústria do petróleo e do gás, e também é cobrada de forma seletiva, onerando mais os combustíveis mais nocivos ao meio ambiente.
Para simplificar a estrutura tributária, o projeto substitui quatro contribuições, dentre as quais a Cide, pelo imposto sobre o valor adicionado (IVA). Conceitualmente, impostos são diferentes de contribuições porque aqueles financiam o caixa geral do governo, enquanto estas financiam um setor específico. A Cide é usada para desenvolver projetos ambientais. O IVA, por outro lado, deveria financiar o caixa geral, já que é um imposto.
Contudo, para assegurar o equilíbrio na distribuição de receitas, o projeto de reforma prevê que as receitas do IVA e de outros impostos serão vinculadas às atividades financiadas pelas contribuições extintas. Assim, parte do IVA será destinada aos projetos ambientais. Essa destinação seria extremamente positiva, não fosse o fato de que cabe à lei complementar definir o percentual destinado. Para assegurar a proteção ambiental, o projeto deveria prever o percentual na Constituição.
O maior retrocesso, contudo, está na eliminação da seletividade. Tributos seletivos são aqueles cobrados de determinada atividade, para desestimulá-la. A Cide é cobrada sobre combustíveis, e é seletiva porque sua alíquota é graduada de acordo com, entre outros fatores, o potencial poluidor de cada combustível. Assim, a Cide é mais elevada sobre a gasolina do que sobre o álcool, contribuindo para tornar o álcool um combustível mais interessante para os consumidores. Para manter o mesmo nível de proteção ambiental, a reforma deveria criar um IVA seletivo, graduado de acordo com o impacto ambiental.
O afastamento da seletividade anda na contramão da experiência européia. Na Europa, a seletividade é utilizada para estimular consumidores a usar produtos menos nocivos ao meio ambiente. A seletividade norteia as reformas tributárias, conhecidas como “reformas tributárias verdes”, que substituem tributos sobre a folha de salários pelos que auxiliam na proteção ambiental.
A Inglaterra, por exemplo, reduziu a alíquota da contribuição previdenciária paga pelas empresas, substituindo-a por um “tributo da mudança climática”, incidente sobre o consumo de energia pelas indústrias. Uma reforma semelhante poderia ser feita no Brasil, utilizando-se o IVA não só para simplificar a estrutura tributária, mas também para proteger o meio ambiente.
Revista Consultor Jurídico