Segunda Leitura – Assembléia do Rio errou; lavagem é inafiançável

por Vladimir Passos de Freitas

A imprensa nacional noticiou que, no dia 29 de maio, no Rio de Janeiro, foram presos em flagrante o deputado estadual Álvaro Lins, ex-chefe da Polícia Civil, e outras seis pessoas. As acusações, que registram os crimes de formação de quadrilha, lavagem de dinheiro, facilitação de contrabando, corrupção ativa e passiva, incluem o ex-governador Anthony Garotinho, na casa de quem foi feita busca e apreensão. Segundo notícias, teria se instalado na Secretaria de Segurança Pública do estado um esquema que dava proteção a empresários sonegadores de impostos, donos de caça-níqueis e jogos de azar. Ao ex-governador Garotinho não se atribuiu corrupção, mas participação por dar respaldo político ao grupo.

No dia seguinte, sexta-feira, a Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro reuniu-se e, por 40 votos a 15, aprovou um decreto legislativo revogando a prisão do deputado Álvaro Lins. Segundo notícia da imprensa, um parecer do procurador da casa concluiu que a prisão foi ilegal porque a Constituição Federal não prevê entre os crimes inafiançáveis a lavagem de dinheiro (O Globo, 31/5/2008, p. 14).

Sem querer avançar no mérito da questão, que caberá ao TRF-2 decidir no momento próprio, o caso, pelo ineditismo, merece alguns comentários. Primeiro porque a ação policial foi precedida de decisão do Tribunal Federal, ao que consta sinalizando pela possibilidade da prisão em flagrante (Folha de S. Paulo, 30/5/08, A4). A PF agiu sob permissão judicial, necessária inclusive para interceptações telefônicas e a busca e apreensão domiciliar. Segundo porque a discussão se centra na possibilidade ou não de prender-se em flagrante. Aí a resposta é mais fácil. Lavagem de dinheiro, na manutenção de investimentos feitos com produto de ação delituosa, é crime permanente. Prolonga-se no tempo. A qualquer momento pode ser objeto de prisão.

Prosseguindo, cumpre analisar a ordem de liberdade decretada pela Alerj. É certo que a prisão de um deputado deve ser comunicada ao Poder Legislativo e que este poderá ordenar a soltura do autuado (Constituição Federal, art.. 53, § 2º, repetido nas Constituições Estaduais). Vejamos por dois prismas. O primeiro é se a Alerj detém esta competência, mesmo em se tratando de um crime da competência federal. O deputado estadual, nos crimes federais, é julgado pelo TRF da região e não pelo TJ. Exclui-se, consequentemente, da esfera estadual qualquer decisão a respeito da prisão. Mas, se esta é uma conclusão polêmica, o mesmo não se dá com relação ao outro argumento.

Afirmou-se que a prisão era indevida porque o crime de lavagem de dinheiro é afiançável. Não haveria proibição de fiança na Constituição. Há notório engano, pois o crime de lavagem de dinheiro é, sim, inafiançável. E isto não precisa e nem deve estar escrito na Constituição. É a Lei 9.613/98, no artigo 3º, que expressamente diz que não cabe fiança. E mesmo que não o dissesse, o velho Código de Processo Penal contém a mesma vedação no artigo 323, I.

De resto, cumpre registrar que impressiona a notícia ao relatar a evolução do patrimônio de pessoas relacionadas com o parlamentar envolvido. Teriam sido investidos, em cinco anos, nada menos que R$ 1,5 milhão em apartamentos. Idem a que informa que com o ex-chefe da Polícia Civil Ricardo Hallak foram encontrados mais de R$ 1 milhão em aplicações (O Globo, 31/5/08, p. 16). Ainda: para ter bons postos, as chefias de delegacias mais importantes eram cobradas por Lins e Halaak em valores que podiam chegar a R$ 25 mil mensais. Entre estas delegacias estavam as que apuravam crimes ambientais e de empresas ligadas ao ramo de combustível e construção civil (Estado de S. Paulo, 31/5/08, A4). Acusados abonados podiam possibilitar bons rendimentos.

Bem, aí estão os fatos. O tempo dirá sobre a veracidade e o alcance do que foi exposto na mídia nacional. Na população, as reações são diferentes. Há quem se recuse a ver TV ou ler jornal. Há os que direcionam seu interesse, com exclusividade, a um dos múltiplos campeonatos de futebol. E há os que ainda se indignam, estes, por cansaço e desilusão, em número cada vez menor.

Revista Consultor Jurídico

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