por Romeu Tuma Júnior
“O mundo que deixaremos aos nossos filhos depende dos filhos que deixaremos para o mundo”. Essa frase foi dita no 2º Fórum Internacional Criança e Consumo, realizado no fim de setembro, pelo Instituto Alana, e que teve como objetivo discutir os impactos da sociedade de consumo e das mídias de massa na formação de crianças e adolescentes, principalmente na relação com a publicidade.
A Secretaria Nacional de Justiça fez-se presente neste debate e acompanhou o que os especialistas dizem sobre as conseqüências das propagandas dirigidas ao público infanto-juvenil. Tão interessantes quanto chocantes foram as posições de estudiosos do Brasil e do exterior.
Pesquisas mostram que o bombardeio da publicidade às crianças é tão prejudicial que pode gerar problemas de alimentação, estresse da família, transtornos de comportamento, violência, delinqüência e erotização precoce. As propagandas seduzem e fazem-se tão presentes na vida do público infanto-juvenil, que crianças e adolescentes correm o risco de acreditar que o consumo é capaz de torná-las felizes e completas e não as pessoas, as brincadeiras, as experiências. O “ter” está definitivamente ganhando mais importância que o “ser”.
Segundo especialistas no assunto, a idéia de que o objeto traz felicidade limita até a oportunidade de aprendizado. Muitos dos objetos adquiridos ou programas assistidos não estimulam o raciocínio e o lúdico de seus receptores. A brincadeira criativa, cada vez menos praticada pelos pequenos, é fundamental para o desenvolvimento da criança, pois é assim que ela aprenderá a resolver seus problemas e interagir melhor com as pessoas e situações que surgirem.
Após conhecer essas informações, expostas pelos estudiosos, gostaria de voltar à frase que iniciou este artigo e propor algumas reflexões. Quais filhos estamos criando? Aqueles que têm os cinco últimos modernos aparelhos celular, mas não têm colegas para ligar? Crianças que preferem assistir a horas de TV a brincar com amigos? Crianças que trocam alimentos por brinquedos com seus companheiros de escolas? Crianças que reconhecem as mais diversas marcas de produtos, mas que não sabem os nomes das frutas, verduras e legumes? Outra pergunta importante é: como agem os adultos diante desta situação, ou seja, como os pais estão educando seus filhos? Acontece que a maioria das mães e dos pais passa o dia fora de casa e são raros os momentos compartilhados com seus filhos. Esta é a lei do mercado e para suprir esta ausência na vida das crianças e adolescentes, muitos adultos acreditam que dar a eles tudo o que pedem, a qualquer hora e a qualquer preço, é uma maneira de ocupar as lacunas deixadas por essa omissão. A presença está sendo substituída por presentes. E crianças e jovens não precisam apenas de sapatos, jogos e roupas, precisam de atenção, orientação, brincadeira, carinho e conversa.
Diante de tal cenário, cuidados e mudanças são necessários. Afinal, os programas de TV, a publicidade e as informações vindas da mídia falam o tempo todo com as crianças, enquanto seus pais, pouco conversam com seus filhos. Se a propaganda faz efeito ou se um programa de TV é capaz de influenciar o comportamento de alguém, é porque existe uma porta aberta para isso. Se não quisermos criar filhos consumistas e facilmente manipuláveis, precisamos desenvolver meios de protegê-los. Crianças e adolescentes são seres em formação e precisam das orientações e cuidados dos responsáveis.
Importante destacar que não é competência da Secretaria Nacional de Justiça a regulamentação de qualquer tipo de publicidade; porém, nos últimos meses, a sociedade incluiu a Secretaria, devido a seu trabalho de Classificação Indicativa em defesa de crianças e adolescentes, nesse debate: um Projeto de Lei da Comissão de Defesa do Consumidor inseriu o Ministério da Justiça, por meio da SNJ e da Secretaria de Direito Econômico, como ente fiscalizador da publicidade voltada ao público infanto-juvenil.
Frente a essa demanda, apresentada por cidadãos e por entidades de defesa da criança, e à possibilidade de aprovação do projeto de lei em questão, faz-se necessário participarmos de debates sobre o tema, trazendo à discussão a experiência da SNJ na informação sobre conteúdos midiáticos e de sua participação no Sistema Brasileiro de Garantias dos Direitos das Crianças e Adolescentes.
Já que é dever da família, da sociedade e do Estado proteger a criança e o adolescente contra qualquer forma de descuido, violência, exploração, discriminação, crueldade e opressão, é importante cada um fazer a sua parte. A sociedade e o Estado já estão se mobilizando; agora, é preciso, também, que os pais fiquem cada vez mais atentos àquilo que seus filhos assistem, esforcem-se para estar mais presentes em suas vidas e busquem o fortalecimento de valores humanísticos hoje tão menosprezados.
Revista Consultor Jurídico