O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) acolheu parcialmente, por maioria de votos, a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 238) na qual o governo do Rio de Janeiro contesta dispositivos da Constituição Estadual (artigos 42 e 218) que obrigam o Estado a assegurar a participação de empregados, na proporção de 1/3, nos conselhos de administração e fiscal das empresas públicas e sociedades de economia mista, e também na direção executiva de empresas públicas, sociedades de economia mista e fundações instituídas pelo Poder Público, na mesma proporção.
O governo do Rio de Janeiro argumenta, em síntese, que a matéria relativa à composição e forma das empresas públicas e das sociedades de economia mista se insere no campo do Direito Comercial, portanto estaria reservada à competência da União. Além disso, os dispositivos violam, na ótica do governo estadual, o artigo 61, parágrafo 1º, inciso II, alíneas “a” e “c” da Constituição Federal, na medida em que compete ao chefe do Executivo estabelecer normas relativas à disciplina jurídica das empresas estaduais que integram a administração indireta.
Relator da ADI, o ministro Joaquim Barbosa afirmou que os dispositivos invadem a reserva de lei federal para dispor sobre a matéria. Barbosa salientou que, nos termos do artigo 173, parágrafo 1º, inciso IV, da Constituição, compete à lei estabelecer o estatuto jurídico da empresa, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, compreendida a forma de constituição e o funcionamento dos conselhos de administração e fiscal, com a participação de acionistas minoritários.
Além disso, segundo Barbosa, há um “parcial conflito” entre os dispositivos questionados e a norma federal de Direito Comercial destinada a estabelecer a estrutura das sociedades por ações: a Lei nº 6.404/76, mais conhecida como Lei das S/A ou LSA (sociedades anônimas). Isso porque as entidades empresariais públicas também se sujeitam ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quantos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributárias.
A Lei das S/A permite a participação de empregados no conselho de administração se houver previsão em estatuto. A eleição deve ser direta e organizada pela empresa e pelos sindicatos. Quanto ao conselho fiscal, a lei prevê que seus membros serão eleitos pelos acionistas. A norma legal estabelece ainda uma série de requisitos necessários ao exercício do cargo de conselheiro fiscal, como a exigência de exercício prévio de três anos no cargo de administrador de empresa ou de conselheiro fiscal. Quanto à diretoria, seus membros são escolhidos pelo conselho de administração ou, em sua ausência, pela assembléia geral.
“Inicialmente observo que, ao passo em que a Lei das S/A permite a participação dos empregados na administração da empresa, os artigos 42 e 218 da Constituição do Rio de Janeiro obrigam as empresas públicas e as sociedades de economia mista a observância da reserva de 1/3 das vagas dos conselhos de administração e fiscal e da diretoria para a mesma finalidade. Em segundo lugar, anoto que o artigo 218 outorga aos servidores ou empregados públicos o direito de eleger diretamente os diretores que ocuparão o terço destinado à representação dos empregados, ao passo em que a Lei das S/A estabelece a competência do conselho de administração ou da assembléia geral para a mesma finalidade”, afirmou Barbosa.
O ministro Joaquim Barbosa esclareceu, entretanto, que não há impedimento para que os estatutos das sociedades de economia mista ou empresas públicas por ações prevejam a participação dos empregados na diretoria e nos conselhos de administração e fiscal. “O que não parece coerente é afirmar que todas as empresas públicas e sociedades de economia mista do Rio de Janeiro sejam obrigadas aprioristicamente à reserva de 1/3 das vagas disponíveis nos conselhos administrativo e fiscal e na diretoria, além de eleição direta para esta última, dado que a União, ao exercer a sua competência, facultou a participação dos empregados na administração de empresas nos termos dos respectivos estatutos”, afirmou.
Acompanharam o relator os ministros José Antonio Dias Toffoli, Cármen Lúcia Antunes Rocha, Ricardo Lewandowski, Eros Grau, Cezar Peluso e Gilmar Mendes. Os ministros Carlos Ayres Britto e Marco Aurélio divergiram. O ministro relator ajustou seu voto às observações feitas pela ministra Cármen Lúcia quanto ao alcance da inconstitucionalidade do segundo dispositivo questionado (artigo 218). Isso porque o artigo refere-se às “fundações instituídas pelo Poder Público”, que não se regem pelo Direito Comercial, mas sim pelas normas típicas de Direito Administrativo. Por este motivo, a inconstitucionalidade declarada não alcançou essas fundações.
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