Segundo o relator, ministro Gilmar Mendes, o assentamento de comunidade indígena agrícola, no caso, se deu por meio de desapropriação por interesse social devidamente amparada na legislação.
A União pode destinar áreas para posse e ocupação pelos índios, as quais não se confundem com áreas de posse imemorial das tribos indígenas. Com esse argumento, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), negou seguimento (julgou inviável) ao Mandado de Segurança (MS) 33069, impetrado na Corte por um grupo de agricultores para questionar decreto presidencial que desapropriou imóveis situados no Município de Rodelas (BA), para destiná-los ao usufruto da Comunidade Indígena Tuxá de Rodelas (BA).
No MS, os autores explicam que foram expropriados de suas terras originais ao final dos anos 80, quando da construção da Usina Hidrelétrica de Itaparica, e reassentados nas terras hoje ocupadas, nas quais desenvolvem atividades agrícolas e de agricultura de subsistência. Os agricultores afirmam que, pelo mesmo motivo, os índios daquela comunidade indígena também foram removidos de seu domínio original, mas não foram suficientemente assentados, motivo pelo qual o decreto impugnado declarou de interesse social, 26 anos depois, os imóveis em litígio, atualmente ocupados pelos impetrantes.
Já a União relatou, nos autos, o histórico do processo de desapropriação para assentamento da citada comunidade, que conta com 228 famílias, desde sua remoção da Ilha da Viúva no ano de 1987, para a construção da Usina de Itaparica, até a edição do decreto questionado.
Para os autores, o decreto expropriatório incorre em vício de finalidade, uma vez que se fundamentou no artigo 2º (caput e inciso III) da Lei 4.132/1962, que prevê a possibilidade de desapropriação por interesse social para “o estabelecimento e a manutenção de colônias ou cooperativas despovoamento e trabalho agrícola”. Segundo eles, a área declarada de interesse social está povoada e é plenamente produtiva, o que comprometeria a validade do ato presidencial.
O relator concedeu medida liminar em 2015 para suspender os efeitos do decreto até o julgamento final do MS. O ministro ainda tentou o caminho da conciliação, enviando os autos para a Câmara de Conciliação e Arbitragem da Administração Federal. Como os autores declararam não ter interesse em seguir buscando uma solução negociada, Mendes apreciou o caso.
Em sua decisão, Gilmar Mendes lembrou que o assentamento de comunidade indígena agrícola em terreno que não constitui terras tradicionalmente ocupadas pode ocorrer, sob o ângulo do artigo 26 do Estatuto Indígena, sob a forma de desapropriação por interesse social. Essa desapropriação não se confunde com o instituto jurídico para a reserva de área envolvendo posse imemorial das tribos indígenas. “A União poderá destinar áreas relativas à posse e ocupação pelos índios – onde possam obter meios de viver e de subsistência –, as quais não se confundem com áreas de posse imemorial das tribos indígenas, sob a modalidade de reserva indígena, parque indígena ou colônia agrícola indígena”, explicou o ministro, para quem a comunidade indígena em questão pode ser caracterizada como colônia agrícola indígena.
Por outro lado, o ministro salientou que o caso trata de desapropriação por interesse social, amparado na legislação, o que não pressupõe “a prática de qualquer ato ilícito pelo desapropriado, como descumprimento da função social, utilização como plantio de psicotrópicos, mas tão somente o interesse público voltado à consecução de finalidade social”. Ele lembrou ainda que a alegação de que as terras em questão são ocupadas pelos agricultores e plenamente produtivas, ou que não seriam destinadas à comunidade indígena agrícola, demandaria a produção de provas, providência que é incabível no âmbito do mandado de segurança.
Com a decisão do ministro, fica também cassada liminar anteriormente deferida.
Processo relacionado: MS 33069