A 4ª Câmara de Direito Público do TJ de Santa Catarina manteve decisão da comarca de Jaraguá do Sul, que havia condenado a VRG Linhas Aéreas ao pagamento de indenização por danos morais e materiais, no valor de R$ 9,6 mil, em favor de Graciano Eleno Heinemann.
O autor, pessoa já de idade, comprou passagem com destino a Santiago, no Chile, com embarque no dia 29 de junho de 2007, em Curitiba (PR). Porém, ao chegar ao aeroporto, soube que o voo havia sido cancelado e que fora remarcado para o dia 30. Enquanto estava na capital paranaense não recebeu qualquer auxílio para transporte ou acomodação em hotel.
No dia seguinte, Graciano voltou ao aeroporto, e soube que a escala do voo em Guarulhos (SP) havia sido alterada para o aeroporto de Viracopos (Campinas). Com isso, o consumidor teve de pegar um ônibus de Campinas a São Paulo. Ao chegar a Guarulhos, recebeu a notícia de que seu voo novamente havia sido cancelado.
Após diversos contratempos, o passageiro conseguiu embarcar no dia 1º de julho. Durante o percurso, porém, o comandante do voo informou que não poderiam chegar a Santiago e que pousariam em Buenos Aires.
Na capital argentina, os passageiros aguardaram uma hora no interior da aeronave e mais três horas no saguão do aeroporto, até receberem um comunicado oficial da empresa ré, o qual dizia que todos
deveriam esperar até as 17 horas do dia 2, quando então embarcariam de volta a São Paulo e somente às 21h25min poderiam ser “encaixados” em um voo para Santiago.
Diante de toda a situação, Graciano não teve outra solução senão comprar uma passagem da Aerolineas Argentinas. A Gol Transportes Aéreos S.A., responsável pela VRG Linhas Aéreas (antiga
Varig), contestou seu dever de indenizar, uma vez que não houve, segundo ela, falha na prestação do serviço.
Alegou que o sistema de tráfego aéreo brasileiro enfrentava a pior crise da sua existência, e que o cancelamento dos voos no trecho Curitiba-Guarulhos-Santiago ocorreu em virtude do mau tempo. Os argumentos não convenceram os julgadores.
“Não havendo motivos plausíveis que justificassem os constantes atrasos de voos numa mesma viagem, cancelamentos de itinerários e a falta de assistência da companhia demandada para com o autor, é indubitável a subsistência do dever da companhia aérea recorrente de indenizar aquele pelos danos materiais e morais que sofreu”, anotou o relator da matéria, desembargador Jaime Ramos.
Atuam em nome do autor os advogados Adalberto e Pierre Hackbarth. (Proc. nº 2009.054353-8 – com informações do TJ-SC).
ÍNTEGRA DO ACÓRDÃO Apelação Cível n. 2009.054353-8, de Jaraguá do Sul.
Relator: Des. Jaime Ramos
ADMINISTRATIVO – TRANSPORTE AÉREO – SERVIÇO PÚBLICO CONCEDIDO – MÁ PRESTAÇÃO DO SERVIÇO – RESPONSABILIDADE CIVIL – CANCELAMENTOS E ATRASOS DE VOOS EM UMA SÓ VIAGEM – ALEGAÇÃO DE “CRISE NO SISTEMA AÉREO BRASILEIRO” E MAU TEMPO – DEFICIÊNCIA DA PROVA – FORÇA MAIOR NÃO COMPROVADA – DANOS MORAIS E MATERIAIS – DEVER DE INDENIZAR.
“A demora injustificada no transporte de passageiros acarreta danos morais” (STJ, AgRg no REsp n. 218291, Rel. Min. Ari Pargendler, j. em 22.03.2007). Não comprovado pela companhia aérea que os incidentes ocorreram por motivo de força maior, o passageiro tem direito à reparação dos danos materiais e morais que sofreu em virtude dos cancelamentos e dos atrasos injustificados de voos, numa única viagem que deveria ser de Curitiba a Santiago, com conexão em Guarulhos, e só terminou três dias depois graças à aquisição de passagem e ao transporte de outra empresa.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2009.054353-8, da Comarca de Jaraguá do Sul, em que é apelante Vrg Linhas Aéreas S/A, e apelado Graciano Eleno Heinemann:
ACORDAM, em Quarta Câmara de Direito Público, por votação unânime, negar provimento ao recurso. Custas na forma da lei.
RELATÓRIO
Na Comarca de Jaraguá do Sul, Graciano Eleno Heinemann ajuizou “ação de indenização por danos morais” contra GOL Transportes Aéreos, alegando que no dia 19.01.2007 adquiriu uma passagem aérea saindo de Curitiba/PR, no dia 29.06.2007, com destino a Santiago, no Chile; que ao chegar no aeroporto na data e no horário previamente agendados, tomou ciência de que seu voo (7471) havia sido cancelado; que a companhia aérea contratada remarcou a viagem para o dia 30.06.2007, alegando que somente naquele dia haveria disponibilidade de voo para Santiago; que o autor não recebeu qualquer auxílio de transporte ou acomodação em Hotel na cidade; que novamente compareceu ao aeroporto na data e no local aprazado; que o seu voo faria escala em Guarulhos/SP, mas houve alteração para Campinas (aeroporto de Viracopos); que, portanto, deveria pegar um ônibus até Guarulhos a fim de embarcar no voo com destino a Santiago, no Chile; que ao chegar em Guarulhos e após despachar sua bagagem, recebeu a notícia de que seu voo novamente havia sido cancelado; que após diversos contratempos conseguiu partir para o Chile no dia 01.07.2007; que no meio do percurso, o Comandante do Voo 7480 informou que não poderiam chegar em Santiago e que deveriam pousar em Buenos Aires; que os passageiros aguardaram 1 hora no interior da aeronave e mais 3 horas no saguão do aeroporto internacional de Ezeiza até receberem o comunicado oficial da empresa ré: os passageiros do Voo 7480 deveriam aguardar até 17h do dia 02.07.2007, quando então seriam embarcados de volta a São Paulo e somente às 21h25min (horário de Brasília) poderiam ser “encaixados” em um voo para Santiago; que, por se tratar de uma viagem de negócios ao Chile, o autor tentou negociar com a ré uma passagem para Santiago por outra companhia aérea, mas não obteve sucesso; que diante de toda essa situação não teve outra solução senão comprar uma passagem para Santiago com a Aerolineas Argentinas; que a ré deve ser condenada ao pagamento de danos materiais antes as despesas feitas, no valor de R$ 389,91, devolução dos valores das passagens em razão dos atrasos e dos cancelamentos de voos, considerando que o autor não chegou ao seu destino (R$ 1.252,51); além da condenação ao pagamento de indenização por danos morais.
Citada, GOL Transportes Aéreos S.A. apresentou contestação aduzindo que não há o dever de indenizar, pois não houve falha na prestação do serviço, mas sim um caso de força maior; que o Sistema de Tráfego Aéreo Brasileiro enfrentava a maior crise desde a sua existência; que o cancelamento do voo no trecho Curitiba-Guarulhos se deu por conta do mau tempo; que o transporte de Campinas até Guarulhos foi realizado pela GOL, sem custos ao autor; que os voos para Santiago também foram cancelados em virtude do mau tempo; que não houve falha na prestação do serviço, tampouco ato ilícito; que não há prova do dano moral.
Impugnados os argumentos expendidos na contestação, o MM. Juiz julgou procedentes os pedidos formulados pelo autor e condenou a empresa ré ao pagamento de indenização no valor de R$ 389,91 pelos danos materiais; R$ 1.252,51, referente ao valor das passagens, acrescidos de juros de mora a partir da citação e correção monetária a partir do efetivo desembolso, além de R$ 8.000,00, a título de indenização por dano moral, acrescidos de juros de mora desde o evento danoso (Súmula 54 do STJ) e correção monetária a partir do arbitramento (Súmula 362 do STJ).
Condenou a ré, ainda, ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 20% sobre o valor da condenação. Inconformada, a ré apelou sustentando os argumentos defendidos na contestação, aos quais acrescentou que o valor arbitrado para a reparação de danos morais é excessivo e que os juros devem incidir a partir do arbitramento. Com as contrarrazões, os autos ascenderam a esta Superior Instância.
VOTO
Há que se negar provimento ao recurso.
1. Do ato ilícito e do dever de indenizar.
Demonstram os autos que no dia 18.01.2007 Graciano Eleno Heinemann adquiriu, na agência de turismo “Incomum – Joinville”, uma passagem aérea com destino a Santiago, no Chile, com escala em Guarulhos/SP, para o dia 29.06.2007, partindo do aeroporto de Curitiba/PR; e outra de retorno, para o mesmo trecho, no dia 09.07.2007.
No dia programado para a viagem, já no aeroporto Afonso Pena, em Curitiba/PR, o autor foi informado de que o seu voo havia sido cancelado por conta das péssimas condições climáticas, as quais, segundo a companhia aérea, agravaram a chamada “crise no sistema aéreo brasileiro”, provocada por questões políticas e administrativas envolvendo os aeroportos do país.
Daí por que a ré defende no sentido de que, havendo cancelamento por motivo de força maior, não se pode tachar como ilícito o procedimento adotado, como que nega a obrigação de indenizar o passageiro.
Sem razão a empresa apelante.
Impende esclarecer, por oportuno, que, de fato, em algumas regiões do país o adiamento de voos ou até mesmo o seu cancelamento pode ocorrer por conta das variações das condições climáticas.
Com base nisso, a companhia aérea apelante colacionou aos autos uma reportagem retirada da internet, publicada em 02.07.2007, e diversos ofícios expedidos pelo Departamento de Controle do Espaço Aéreo (DECEA), assinados pelo Major Carlos Roberto Henriques, dando conta das condições metereológicas na região do aeroporto Afonso Pena, em Curitiba/PR, registradas no dia 29.06.2007, entre as 20h e 21h.
Ora, as informações trazidas pela ré são meramente técnicas e não comprovam a sua versão. A reportagem retirada da Internet se refere às condições gerais dos aeroportos brasileiros e faz um balanço geral com o enfrentamento da questão na data da divulgação da matéria, ou seja, 02.07.2007. O cancelamento do voo ocorreu 3 (três) dias antes (em 29.06.2007). Além disso, os dados oficiais divulgados pelo responsável pelo DECEA apenas apontam a situação climática na região entre 20h e 21h, sem precisar as dificuldades de decolagem, tráfego aéreo e por quanto tempo perduraram.
Não bastasse isso, extrai-se do documento expedido pelo Departamento de Controle do Espaço Aéreo que às 20h a visibilidade era de 400 metros. Já às 20h40min passou para 1500 metros e assim se manteve até a última medição, às 21h.
Realmente havia neblina, mas a visibilidade era boa. Como é cediço, incumbia à ré comprovar que naquele dia as condições climáticas eram realmente desfavoráveis à decolagem do voo 7471, que sairia do Aeroporto Afonso Pena, em Curitiba, com destino ao Chile, com escala em Guarulhos/SP, porém, nada comprovou eis que sequer houve registro dessa informação pelo oficial do DECEA, mas tão somente dados meteorológicos.
Quanto ao ônus da prova, conforme o art. 333, inciso II, do Código de Processo Civil:
“Art. 333 – O ônus da prova incumbe:
“[…]
“II – ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.”
NELSON NERY JÚNIOR e ROSA MARIA DE ANDRADE NERY, acerca do ônus da prova, ensinam:
“A palavra vem do latim, onus, que significa carga, fardo, peso, gravame. Não existe obrigação que corresponda ao descumprimento do ônus. O não atendimento do ônus de provar coloca a parte em desvantajosa posição para a obtenção do ganho de causa. A produção probatória, no tempo e na forma prescrita em lei, é ônus da condição de parte” (Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante. 10. ed. rev., ampl. e atual. até 01.10.2007. – São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2007, p. 608).
MOACYR AMARAL SANTOS, sobre o assunto, afirma:
“Em suma, quem tem o ônus da ação tem o de afirmar e provar os fatos que servem de fundamento à relação jurídica litigiosa; quem tem o ônus da exceção tem o de afirmar e provar os fatos que servem de fundamento a ela. Assim, ao autor cumprirá sempre provar os fatos constitutivos, ao réu os impeditivos, extintivos ou modificativos” (Comentários ao Código de Processo Civil, Rio de Janeiro: Forense, 1976, v. 4, p. 33).
De igual modo, para OVÍDIO BAPTISTA DA SILVA “como todo direito se sustenta em fatos, aquele que alega possuir um direito deve, antes de mais nada, demonstrar a existência dos fatos em que tal direito se alicerça. Pode-se, portanto, estabelecer como regra geral dominante de nosso sistema probatório, o princípio segundo o qual à parte que alega a existência de determinado fato para dele derivar a existência de algum direito, incumbe o ônus de demonstrar sua existência. Em resumo, cabe-lhe o ônus de produzir a prova dos fatos por si mesmo alegados como existentes” (Curso de Processo Civil, Processo de Conhecimento, 5. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 344).
Aliás, além de a ré/apelante não ter comprovado a sua versão quanto ao motivo de força maior para o cancelamento do voo 7471 no dia 29.06.2007, ocorrido em Curitiba/PR, igualmente não se justificou por que o voo 7480 com destino ao Chile foi cancelado no dia 30.06.2007.
Como se não bastasse o atraso de um dia para aterrissar em São Paulo, a rota foi desviada para o Aeroporto Viracopos, de Campinas e o autor precisou ir de ônibus até o Aeroporto Internacional de Guarulhos, local de onde partiria seu voo (7480) com destino a Santiago, no Chile. No entanto, após ter despachado as suas bagagens, recebeu o comunicado de que o voo novamente havia sido cancelado. Após diversos contratempos e dois cancelamentos de voos, o autor partiu para o Chile no dia 01.07.2007, com dois dias de atraso.
Todavia, na metade do caminho, a tripulação comunicou aos passageiros que seria preciso fazer uma parada em Buenos Aires, na Argentina. Como resultado, o autor e os demais passageiros tiveram que permanecer no interior da aeronave por uma hora, quando, então, foram autorizados a esperar no saguão do aeroporto internacional de Ezeiza (Argentina) por mais três horas, até que, finalmente, receberam o comunicado de que seria impossível seguir adiante em direção a Santiago.
A opção apresentada pela empresa recorrente aos passageiros foi demasiadamente inconveniente, tendo em vista que, como propôs, deveriam retornar a São Paulo, no voo das 17h, do dia 01.07.2007 e, lá chegando, seriam realocados num voo com destino a Santiago, com saída prevista para às 21h25min do dia 01.07.2007.
Sem mais opções, o autor decidiu comprar uma passagem da empresa Aerolíneas Argentinas, em Buenos Aires, com destino a Santiago, por conta própria, já que estava três dias atrasado para o seu compromisso.
Nessa toada, não havendo motivos plausíveis que justificassem os constantes atrasos de voos numa mesma viagem, cancelamentos de itinerários e a falta de assistência da companhia demandada para com o autor, é indubitável a subsistência do dever da companhia aérea recorrente de indenizar aquele pelos danos materiais e morais que sofreu.
Sobre esse tema, o Superior Tribunal de Justiça orienta:
“TRANSPORTE AÉREO – ATRASO DE VÔO E EXTRAVIO DE BAGAGEM – DANO MORAL – CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E CONVENÇÃO DE VARSÓVIA – DANOS MATERIAL E MORAL FIXADOS EM PRIMEIRO GRAU – APELAÇÃO – REFORMA DA SENTENÇA – RECURSO ESPECIAL – PRETENDIDA REFORMA – SENTENÇA DE 1º GRAU RESTABELECIDA – RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO EM PARTE.
“I – Prevalece o entendimento na Seção de Direito Privado de que tratando-se de relação de consumo, em que as autoras figuram inquestionavelmente como destinatárias finais dos serviços de transporte, aplicável é à espécie o Código de Defesa do Consumidor (REsp 538.685, Min. Raphael de Barros Monteiro, DJ de 16/2/2004). II – De igual forma, subsiste orientação da E. Segunda Seção, na linha de que a ocorrência de problema técnico é fato previsível, não caracterizando hipótese de caso fortuito ou de força maior, de modo que cabe indenização a título de dano moral pelo atraso de vôo e extravio de bagagem. O dano decorre da demora, desconforto, aflição e dos transtornos suportados pelo passageiro, não se exigindo prova de tais fatores (Ag. Reg. No Agravo n. 442.487-RJ, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ de 09/10/2006). III – Recurso especial conhecido em parte e, nessa extensão, provido também em parte, para restabelecer-se a sentença de primeiro grau, fixada a indenização por dano material em R$194,90 e, por seu turno, a relativa ao dano moral na quantia de R$5.000,00, atualizáveis a contar da data da decisão do recurso especial.” (STJ, REsp n. 612817, Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, j. em 20.09.2007).
“RESPONSABILIDADE CIVIL. TRANSPORTE AÉREO. ATRASO DE VÔO. A demora injustificada no transporte de passageiros acarreta danos morais. Agravo regimental não provido.” (STJ, Agravo Regimental no Recurso Especial n. 218291, Rel. Min. Ari Pargendler, j. em 22.03.2007).
“AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DANO MORAL. PERDA DE CONEXÃO EM VÔO INTERNACIONAL. REDUÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO, FIXADO EM R$ 12.000,00 PARA R$ 3.000,00 A CADA UM DOS AUTORES. I – As circunstâncias da lide apresentam peculiaridades que justificam a redução do quantum indenizatório, em especial o suporte oferecido pela empresa Recorrente para minimizar os transtornos e constrangimentos sofridos pelos Autores. Agravo Regimental improvido.” (STJ, Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n. 1070474, Rel. Min. Sidnei Beneti, j. em 19.02.2009).
“CIVIL E PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO – CONTRATO DE TRANSPORTE AÉREO DE PASSAGEIROS – ATRASO – DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL – DANO MORAL – SÚMULA 7/STJ – APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR EM DETRIMENTO DA CONVENÇÃO DE VARSÓVIA – VALOR INDENIZATÓRIO – RAZOABILIDADE. I – Esta Superior Corte já pacificou o entendimento de que não se aplica, a casos em que há constrangimento provocado por erro de serviço, a Convenção de Varsóvia, e sim o Código de Defesa do Consumidor, que traz em seu bojo a orientação constitucional de que o dano moral é amplamente indenizável. II – A conclusão do Tribunal de origem, acerca do dano moral sofrido pelos Agravados, em razão do atraso do vôo em mais de onze horas, não pode ser afastada nesta instância, por depender do reexame do quadro fático-probatório (Súmula 7/STJ). III – Tendo em vista a jurisprudência desta Corte a respeito do tema e as circunstâncias da causa, deve ser mantido o quantum indenizatório, diante de sua razoabilidade, em R$ 3.000,00 (três mil reais). Agravo regimental improvido.” (STJ, Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n. 903969, Rel. Min. Sidnei Beneti, j. em 09.12.2008).
Este Tribunal não destoa:
“APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – TRANSPORTE AÉREO – CANCELAMENTO E ATRASO DE VÔO – DESCASO COM PESSOA IDOSA – DESAMPARO E CONSTRANGIMENTO CONFIGURADO – ABALO MORAL PRESUMIDO – DEVER DE INDENIZAR INARREDÁVEL – MONTANTE INDENIZATÓRIO APLICADO COM PARCIMÔNIA ÀS DIMENSÕES DO DANO SUPORTADO PELA VÍTIMA – MANUTENÇÃO DO VALOR DETERMINADO EM PRIMEIRO GRAU
“O arbitramento do valor da indenização incumbirá ao juiz, que o fixará observando as peculiaridades do caso concreto, bem como as condições financeiras do agente e a situação da vítima, de modo que não se torne fonte de enriquecimento, tampouco seja inexpressivo a ponto de não atender aos fins a que se propõe.” (TJSC, Apelação Cível n. 2009.006687-8, de Itajaí, Rel. Des. Mazoni Ferreira, j. em 29.06.2009).
“APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – VÔO INTERNACIONAL – ATRASO NO EMBARQUE – NOTÍCIA DE CANCELAMENTO DA VIAGEM OCORRIDA QUANDO EM ESCALA EM OUTRO ESTADO – RETORNO À CIDADE DE ORIGEM – PASSAGEIROS DE TERCEIRA
IDADE – CÓDIGO CONSUMERISTA REGENDO À RELAÇÃO – RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA COMPANHIA AÉREA – DANO MORAL PRESUMIDO – DEVER DE INDENIZAR – QUANTUM INDENIZATÓRIO – ORIENTAÇÃO PELOS CRITÉRIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE – JUROS DE MORA – TERMO DE INCIDÊNCIA – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO.
“É objetiva a responsabilidade civil da companhia aérea por eventuais defeitos na prestação de seus serviços, diante do disposto no art. 14 do Código de Defesa do Consumidor.
“Não há afastar o dever de indenizar pelo abalo moral gerado aos passageiros, a empresa de aviação que, sabedora do mau tempo e impossibilidade de aterrissagem no aeroporto do país destino, procede o embarque, após espera aproximada de 10 horas da prevista, e apenas noticia o cancelamento da viagem quando em escala em estado vizinho, depois de aproximadas 2 horas de confinamento dentro da aeronave, obrigando os passageiros a terem que proceder o retorno à cidade de origem.
“Apresenta-se como verdadeiro dilema imposto ao magistrado a fixação de um numerário suficiente para compensar o abalo moral, visto sua incomensurabilidade. Assim, deve ele orientar-se por parâmetros ligados a proporcionalidade e a razoabilidade, ou seja, deve analisar as condições financeiras das partes envolvidas, as circunstâncias que geraram o dano e o abalo experimentado, a fim de encontrar um valor que não gere enriquecimento exagerado nem provoque renitência delitiva.” (TJSC, Apelação Cível n. 2009.016643-9, da Capital/Estreito, Rel. Des. Fernando Carioni, j. em 15.05.2009).
No tocante à alegação de motivo de força maior em decorrência do mau tempo e da crise no sistema aéreo brasileiro, o Superior Tribunal de Justiça sedimentou:
“Recurso Especial. Ação indenizatória. Transporte Aéreo. Atraso em vôo c/c adiamento de viagem. Responsabilidade Civil. Hipóteses de exclusão. Caso Fortuito ou Força Maior. Pássaros. Sucção pela turbina de avião. – A responsabilização do transportador aéreo pelos danos causados a passageiros por atraso em vôo e adiamento da viagem programada, ainda que considerada objetiva, não é infensa às excludentes de responsabilidade civil. – As avarias provocadas em turbinas de aviões, pelo tragamento de urubus, constituem-se em fato corriqueiro no Brasil, ao qual não se pode atribuir a nota de imprevisibilidade marcante do caso fortuito. – É dever de toda companhia aérea não só transportar o passageiro como levá-lo incólume ao destino. Se a aeronave é avariada pela sucção de grandes pássaros, impõe a cautela seja o maquinário revisto e os passageiros remanejados para vôos alternos em outras companhias. O atraso por si só decorrente desta operação impõe a responsabilização da empresa aérea, nos termos da atividade de risco que oferece. (STJ, REsp. n. 401397, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. em 27.06.2002) (Sem grifo no original).
Portanto, é indubitável o dever de indenizar.
O MM. Juiz condenou a companhia aérea a pagar ao autor a indenização de danos materiais, consubstanciados nas despesas que o demandante teve que fazer com táxi, hotel, alimentação e passagem aérea adquirida da Aerolíneas Argentinas, no montante de R$ 389,91 (trezentos e oitenta e nove reais e noventa e um centavos); restituição do valor da passagem aérea que o autor pagou à ré, no valor de R$ 1.252,51 (um mil, duzentos e cinquenta e dois reais e cinquenta e um centavos); e danos morais arbitrados em R$ 8.000,00 (oito mil reais).
2. Do “quantum” indenizatório fixado.
Neste particular, a sentença atacada também não merece reparo.
De fato, o valor arbitrado a título de indenização por danos morais atende, com razoabilidade e proporcionalidade, os parâmetros fixados por esta Corte de Justiça.
Não há parâmetros legais para a fixação do valor da indenização dos danos morais, cabendo ao magistrado arbitrar o valor que entender justo, adequado, razoável e proporcional ao caso em concreto.
Acerca do valor da indenização, Carlos Alberto Bittar explica:
“[…] diante da esquematização atual da teoria em debate, são conferidos amplos poderes ao juiz para definição da forma e da extensão da reparação cabível, em consonância, aliás, com a própria natureza das funções que exerce no processo civil (CPC, arts. 125 e 126). Com efeito, como julgador e dirigente do processo, pode o magistrado ter conhecimento direto das parte, dos fatos e das respectivas circunstâncias, habilitando-as, assim, à luz do direito aplicável, a definir de modo mais adequado, a reparação devida no caso concreto” (“in” Reparação civil por danos morais. RT, 1993, p. 205-6).
Adiante destaca que:
“[…] a indenização por danos morais deve traduzir-se em montante que represente advertência ao lesante e à sociedade de que se não se aceita o comportamento assumido, ou o evento lesivo advindo. Consubstancia-se, portanto, em importância compatível com o vulto dos interesses em conflito, refletindo-se, de modo expresso, no patrimônio do lesante, a fim de que sinta, efetivamente, a resposta da ordem jurídica aos efeitos do resultado lesivo produzido. Deve, pois, ser quantia economicamente significativa, em razão das potencialidades do patrimônio do lesante” (Op. cit. p. 220).
Pertinentes também são as lições de HUMBERTO THEODORO JÚNIOR:
“O arbitramento da indenização do dano moral é ato exclusivo e indelegável do Juiz.
“Por se tratar de arbitramento fundado exclusivamente no bom senso e na eqüidade, ninguém além do próprio juiz está credenciado a realizar a operação do quantum com que se reparará a dor moral”. (“in” Dano Moral, 2. ed. São Paulo: Juarez de Oliveira, 1999, p. 41).
A jurisprudência deste Tribunal acompanha:
“INDENIZAÇÃO FIXAÇÃO DO QUANTUM. APRECIAÇÃO DAS CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO CONCRETO. ARBITRAMENTO EM VALOR QUE EXPRESSA A FINALIDADE A QUE SE DESTINA. DESPROVIMENTO DO RECURSO PRINCIPAL.
“Incumbe ao juiz o arbitramento do valor da indenização, observando as peculiaridades do caso concreto, bem como as condições financeiras do agente e a situação da vítima, de modo que não se torne fonte de enriquecimento, tampouco que seja inexpressivo ao ponto de não atender aos fins a que se propõe” (AC n. 00.013683-2, de Lages, Rel. Des. Sérgio Paladino, julgado em 05.12.2000).
Se por um lado não se deve fomentar a chamada “indústria do dano moral”, com indenizações altíssimas, por outro não se pode permitir que atos abusivos continuem sendo praticados contra os cidadãos.
Justamente por isso que é importante frisar:
“Ao analisar o pedido de indenização por danos morais, deve o julgador apreciar cuidadosamente o caso concreto, a fim de vedar o enriquecimento ilícito e o oportunismo com fatos que, embora comprovados, não são capazes de causar sofrimentos morais, de ordem física ou psicológica, aos cidadãos (STJ – AgRgAI n. 276.671/SP, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito).” (TJSC – AC n. 2007.031396-0, de Curitibanos. Rel. Des. Anselmo Cerello, j. em 30.01.2008).
Sopesando-se as particularidades que envolvem o caso em apreço, denota-se que o “quantum” fixado em primeiro grau corresponde ao que esta Câmara tem entendido como razoável e adequado, motivo pelo qual se mantém o valor da condenação da indenização por danos morais de R$ 8.000,00, corrigidos conforme o índice adotado pela tabela da Douta Corregedoria Geral de Justiça, a partir do arbitramento (Súmula 362 do STJ) e juros desde o evento danoso (29.06.2007 – primeiro cancelamento) (Súmula 54 do STJ).
Consoante a Súmula 54 do STJ: “Os juros moratorios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual.”
Mantém-se, destarte, a sentença apelada, que solucionou adequadamente o litígio.
Ante o exposto, nega-se provimento ao recurso.
DECISÃO
Nos termos do voto do Relator, por votação unânime, a Câmara negou provimento ao recurso.
Conforme disposto no Ato Regimental n. 80/2007-TJ, publicado no Diário de Justiça Eletrônico de 07.08.2007, registra-se que do julgamento realizado em 15.04.2010, participaram, com votos, além do Relator, os Exmos. Srs. Desembargadores Cláudio Barreto Dutra (Presidente) e Jânio de Souza Machado.
Florianópolis, 10 de maio de 2010.
Jaime Ramos
Relator