O Superior Tribunal de Justiça vai decidir se nos pedidos de indenização de fumantes o prazo de prescrição da ação é de cinco anos, como prevê o Código de Defesa do Consumidor, ou de 20 anos, conforme dispõe o Código Civil. A questão, colocada em pauta em processo movido por um fumante contra a indústria de cigarros, está empatada na 3ª Turma. O voto de desempate será do ministro Luis Felipe Salomão.
O autor da ação pede indenização por danos morais e materiais pelos males decorrentes do tabagismo. Alega que as propagandas veiculadas pela Souza Cruz e pela Philip Morris Brasil Indústria e Comércio o levaram ao uso do cigarro e posterior vício em substâncias agregadas ao produto.
Em primeira instância, o processo foi extinto. O juiz aplicou o prazo de prescrição previsto no CDC. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul reverteu a decisão, considerando que o CDC prevê a possibilidade de o hipossuficiente optar pelo sistema que melhor lhe atenda. Por isso, poderia incidir o prazo de prescrição de 20 anos estabelecido no CC. Em seus recursos, as empresas sustentam que a incidência do CDC sobre as relações de consumo é obrigatória, por ser norma de ordem pública.
Lei mais benéfica
O primeiro voto no STJ foi da ministra Nancy Andrighi (relatora). Para ela, a determinação de proteção ao consumidor é de ordem constitucional e deve ser cumprida por todo o sistema jurídico em diálogo de fontes, e não somente por uma ou outra norma. O próprio CDC traria, em seu artigo 7º, a previsão de abertura para interação com outras regras do ordenamento jurídico que possam beneficiar o consumidor. Por isso, a prescrição ocorreria em 20 anos.
“Nesse contexto, não é o CDC que limita o Código Civil, é o Código Civil que dá base e complementa o CDC, de modo que, se aquele for mais favorável ao consumidor do que este, não será a lei especial que limitará a aplicação da lei geral; estas dialogarão à procura da realização do mandamento constitucional de fazer prevalecer a proteção da parte hipossuficiente da relação de consumo”, explicou a relatora.
O voto-vista do desembargador convocado Paulo Furtado foi no mesmo sentido. Para o desembargador, a intenção do legislador de ampliar a proteção ao consumidor é bastante clara no sentido de permitir a aplicação de outras normas que não as do próprio CDC na busca da isonomia material entre as partes da relação de consumo.
“Afastar, portanto, o princípio da especialidade da norma em favor da aplicação da lei mais benéfica, parece-me, de fato, numa interpretação sistemática, o que melhor se harmoniza com a intenção do legislador, evidenciada sobremaneira nas diretrizes da Política Nacional das Relações de Consumo estabelecidas no artigo 4º do CDC”, afirmou.
Para ele, não seria razoável a aplicação de regra menos benéfica em desfavor daquele que é presumidamente vulnerável na relação de consumo. “Ou seja: é, no mínimo, justa a incidência, na relação de consumo, na qual se presume a presença de partes desiguais em seus pólos, da norma mais benéfica, aquela que seria aplicável a uma lide estabelecida entre iguais”, completou o desembargador.
Divergência
Os ministros Massami Uyeda e Sidnei Beneti divergiram da relatora. Para eles, o prazo de prescrição do CDC é expresso e a combinação excessiva de sistemas poderia levar à opacidade na interpretação das leis. Uyeda registrou que o entendimento não visa beneficiar a indústria tabagista, mas garantir uniformidade de julgamento e segurança jurídica a toda a comunidade — inclusive aos consumidores.
O presidente da Turma, ministro Beneti, acrescentou que, atualmente, o legislador tem optado pelo encurtamento dos prazos, inclusive os prescricionais. Mesmo em situações angustiosas, como em casos de doença, as pessoas devem se definir com celeridade, avaliou.
Os dois ministros também entendem que não é possível conciliar o prazo de prescrição ampliado do CC com a inversão de ônus da prova do CDC. Portanto, o prazo de prescrição seria de cinco anos, conforme especificado pelo artigo 27 do CDC. Com informações do Superior Tribunal de Justiça.
Resp 1.009.591