No dia 30 de julho completou um ano a decisão que cassou o governador da Paraíba, Cássio Cunha Lima (PSDB), por crime eleitoral. Ele foi acusado de distribuir 30 mil cheques da Fundação de Ação Comunitária (FAC), na campanha eleitoral de 2006, quando concorria à reeleição, para fazer promoção pessoal. O governador continua no cargo por conta de uma liminar concedida pelo Tribunal Superior Eleitoral em 1º agosto de 2007. A cassação foi pedida pelo PCB.
O recurso contra o acórdão do Tribunal Regional Eleitoral paraibano que cassou o mandato do tucano e do vice-governador, José Lacerda Neto, será julgado no mérito. Não há data prevista para a sessão no Tribunal Superior Eleitoral. O que se sabe é que o argumento da defesa de Cunha Lima, encabeçada pelo advogado Luciano José Nóbrega Pires, é o de que houve tentativa de perseguição contra o governador.
A defesa de Cunha Lima afirma que a “perseguição” é liderada pelo empresário Roberto Cavalcanti, dono do Sistema Correio de Comunicação, filiada da Rede Record e um dos canais mais fortes de comunicação do estado da Paraíba. Cavalcanti é suplente do senador José Maranhão (PSDB), candidato ao governo da Paraíba em 2006. Para a defesa, Cavalcanti usou seu grupo de comunicação para “plantar mentiras” sobre o processo que resultou na cassação de Cunha Lima.
Para justificar as afirmações, a defesa de Cunha Lima levanta em seu recurso uma série de preliminares que pode anular todo o processo de cassação. Todas as preliminares já foram rejeitadas pela segunda instância e aguardam agora decisão do TSE. É justamente essa posição do TRE paraibano — de não considerar as nulidades — que a defesa questiona. Para Cunha Lima, a Justiça eleitoral da Paraíba foi convencida por Cavalcanti a votar contra as petições do governador para que José Maranhão e Cavalcanti cheguem ao poder.
A assessoria de Maranhão nega que haja qualquer perseguição. “Cunha Lima foi cassado por motivos técnicos e não por questões políticas. Tanto é assim que a decisão foi tomada por cinco votos a um. A ação que resultou na cassação não é movida nem pelo senador, nem pelo suplente. E sim pelo PCB. O Ministério Público acatou a Representação e pediu a cassação ao TRE. O processo foi parar nas mãos do corregedor, que também pediu a cassação. O caso chegou ao pleno do tribunal, que votou pela perda do mandato. Não vejo qualquer articulação do senador José Maranhão ou se deu suplente”, rebate Sérgio Botelho, assessor do José Maranhão.
Os argumentos
O advogado Luciano Pires reclama principalmente do cerceamento de defesa. Isso porque ele teve apenas 20 minutos para fazer a sustentação oral na sessão que resultou na cassação do mandato, enquanto o Ministério Público usou o tempo de 45 minutos. Tal fato colocou a defesa em situação desprivilegiada, sustenta.
Outra reclamação é a de que o procurador responsável pela acusação, José Guilherme Ferraz, não poderia constar do processo. Isso porque, além de ser o fiscal da lei na ação movida pelo PCB, ele também move uma ação de impugnação de mandato por compra de votos. Mais uma ação de suspeição é movida contra o juiz Nadir Leopoldo Valengo. Ele é relator em duas Ações de Impugnação de Mandato Eletivo apresentadas contra o governador no Tribunal Regional Eleitoral. O juiz teria interesse direto na causa, por ter sido advogado da família do senador José Targino Maranhão (PMDB), que é adversário político de Cunha Lima.
De acordo com os recursos, o governador só tomou conhecimento de tal fato no dia 2 de agosto de 2007, por meio de notícia veiculada no Jornal da Paraíba. Segundo a reportagem, a irmã e a sobrinha do senador, respectivamente Wilma Maranhão, e a deputada estadual Olenka (PMDB), já tiveram como advogado o juiz Nadir Valengo.
A defesa também afirma que o TRE da Paraíba não permitiu que fosse juntada aos autos a ata do Tribunal Contas da Paraíba, no qual ficou entendido que não havia irregularidade formal na prestação de contas do convênio entre o governo e a Fundação de Ação Comunitária (FAC). Um procedimento administrativo feito pelo Ministério Público Federal, que concluiu não ter havido promoção pessoal do então candidato, também não foi incluído no processo enquanto os autos estavam no Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba
O advogado de Cássio Cunha Lima reclama, ainda, que são nulos os atos processuais porque o vice-governador foi cassado sem ter feito parte do processo. Ou seja, ele não pode se defender. Para ilustrar a afirmação, ele cita o caso de o governador de Santa Catarina, Luiz Henrique (PMDB), que não teve o vice citado. O TSE acabou reformando a jurisprudência para dizer que para cassar mandato eletivo em cargos majoritários é preciso acionar também o vice da chapa — já que eles foram eleitos juntos.
Engenharia da contabilidade
A defesa de Cunha Lima dedica o maior número de páginas de seu recurso para contestar a prova pericial juntada para auditar contabilmente a parte orçamentária do programa social que resultou na cassação do governador. Segundo o advogado, a perita que fez o laudo contábil era engenheira civil. Para a defesa, não seria possível uma engenharia conhecer de contabilidade. Além disso, ela não respondeu todos os quesitos formulados.
Luciano Pires chegou a pedir a impugnação do parecer, solicitação indeferida pela segunda instância paraibana. Os juízes afirmaram que ela era bem capacitada para fazer laudos para o Tribunal de Contas da União.
De acordo com o advogado, “o fato de a perita ser analista do TCU não é suficiente para comprovar seu conhecimento técnico sobre o tipo de perícia solicitada (contábil), vez que há técnicos das mais diversas áreas no Tribunal de Contas (engenharia, contabilidade, direito, economia, administração pública)”.
“O mandato de um Governador de Estado não pode ficar à mercê de uma prova inválida, realizada por quem não poderia fazê-la, e cujas conclusões estão longe de corresponder às de uma perícia contábil”, observa o advogado no recurso. Além disso, segundo ele, essa foi uma auditoria preliminar, mais tarde desmentida no processo administrativo que tramitava no TCE — cujo laudo não foi anexado ao processo de cassação.
Reincidência
No mês de dezembro do ano passado, o Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba cassou Cunha Lima por abuso de poder político e econômico. Cunha Lima foi acusado de usar o jornal oficial A União em benefício próprio nas eleições de 2006.
O julgamento começou no dia 8 de novembro, quando o relator do processo votou pela cassação do governador e de seu vice, José Lacerda Neto, além da aplicação de multas para Cunha Lima e para o superintendente do jornal, Itamar Cândido (R$ 100 mil para cada). A defesa do governador já recorreu ao TSE.
RO 1.907
Revista Consultor Jurídico