A maternidade também teria permitido que a filha recém-nascida da autora ficasse um longo período sem se alimentar, o que fez com que ela apresentasse um quadro de hipoglicemia e precisasse ser encaminhada à UTI.
Uma maternidade de Vitória foi condenada a pagar R$40 mil em indenizações a uma paciente que teve queimaduras na barriga em decorrência de um procedimento realizado na instituição hospitalar. Em sentença, o juiz entendeu que a situação era decorrente de negligência da maternidade. A decisão é da 5ª Vara Cível de Vitória.
De acordo com a autora, ela foi internada para nascimento da sua primeira filha na maternidade. O procedimento era de risco, uma vez que a autora apresentava quadro de pré-eclampsia, situação em que acontece disfunções nos órgãos e a possibilidade da ocorrência de convulsões. Ela narra que foi encaminhada ao quarto no dia posterior ao parto, data em que ela percebeu que não conseguia urinar. Como consequência, a enfermeira chefe solicitou a uma técnica que preparasse uma bolsa térmica com água morna e colocasse sob a requerente.
Mais tarde, a técnica de enfermagem trouxe a bolsa envolta em uma atadura e, segundo a autora, com forte odor de éter. Cerca de 15 minutos após a saída da funcionária, a requerente já conseguia urinar e, neste momento, ela percebeu que o local em que a bolsa havia sido apoiada estava com um edema (vermelhidão). Até então, ela não havia sentido dores devido ao efeito provocado pela anestesia da cirurgia.
Ao procurar a técnica de enfermagem, a paciente teve como resposta que a vermelhidão poderia ter sido provocada por uma possível alergia ao éter. Além disso, a requerente destaca que apesar de sua filha ter nascido com baixo peso, a mesma foi encaminhada ao quarto, onde também não foi alimentada. Após diversas tentativas de solicitar providências às enfermeiras e depois de esperar uma troca de plantão, uma enfermeira percebeu a gravidade da situação e levou a recém-nascida para a UTI, visto que ela já apresentava quadro de hipoglicemia.
Após o ocorrido, a autora relata ter sentido dores no abdômen, momento em que percebeu bolhas de queimadura na barriga. Ao informar seu obstetra sobre o acontecido, ela foi a encaminhada a um cirurgião, tendo aí começado o tratamento para a queimadura. A requerente ainda contou que o hospital sequer forneceu os medicamentos necessários e muito menos a pomada para realizar os curativos. Por fim, ela ressaltou que não pôde tomar sol por três anos e que teve sua autoestima prejudicada, uma vez que o acidente lhe deixou sequelas.
Em contestação, a maternidade defendeu que a queimadura foi provocada por culpa exclusiva da autora. Segundo a requerida, após ser acompanhada durante todo o tratamento, a paciente também não teria ficado com nenhuma sequela ou deformidade. “A autora foi avisada de que a bolsa não poderia ficar mais de 10 minutos em contato com o seu corpo, o que não foi por ela observada”, acrescentou.
Acerca da situação envolvendo a recém-nascida, a maternidade alegou que em nenhum momento a bebê teria sofrido risco de vida e que a instituição não cometeu nenhum erro médico. “Quanto a recém-nascida, esta foi acompanhada em tempo integral pelo corpo clínico […], sendo que identificada a hipoglicemia em terceira reavaliação, a mesma foi imediatamente revertida ainda no plantão noturno”, explicou a requerida.
Após análise do caso, o magistrado entendeu que a situação é motivadora de danos morais e estéticos. De acordo com o juiz, o depoimento das testemunhas dão conta de que a paciente não recebeu nenhuma orientação acerca da utilização da bolsa de água morna. “A enfermeira não passou explicações para a autora quando colocou o objeto amarelo na barriga, tendo a depoente deduzido que seria para a ajudar a urinar […] ficou na visita aproximadamente 40 minutos, […] no período em que permaneceu no local a enfermeira não retornou para verificar a bolsa”, afirmou uma das testemunhas da ação.
De acordo com o juiz, a alegação de que o acidente ocorreu por culpa da autora não merece prosperar. “A requerente estava em pós-cirúrgico sob os cuidados da requerida e foi submetida a compressa de água morna em região sensível – próximo ao local da cirurgia – sem o devido acompanhamento dos prepostos da requerida, de modo que a mesma deve ser responsabilizada em consonância com o art. 932, III, do Código Civil”, defendeu.
Acerca da situação envolvendo a negligência de alimentação da bebê, o juiz destacou o depoimento de uma informante, a qual confirmou a versão defendida pela autora. “Chegou a ligar para a enfermaria para perguntar se iria ser enviada a complementação para alimentar o bebê […] a mãe da autora percebia que a criança tremia um pouco, com espasmos, não sendo esta uma situação normal […] ligou para a enfermagem mais de uma vez pedindo alimentação, sem êxito”, contou a informante.
Em decisão, o juiz condenou a maternidade ao pagamento de R$30 mil em indenização por danos morais. “Considerando as particularidades do caso, sobretudo que as lesões sofridas ocorreram logo após o parto, momento em que a requerente estava mais sensível tanto fisicamente quanto emocionalmente, e ainda a negligência de alimentação de sua filha, sofridas no Hospital, onde espera receber os cuidados necessários para sua recuperação e ainda atento aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, entendo que a requente faz jus a indenização pelos danos morais”, justificou.
Em continuação, o magistrado condenou a requerida a pagar R$10 mil em reparação por danos estéticos. “Considerando que a realização de compressa resultou em lesões na autora do tipo queimadura e que mesmo após tratamento e o transcurso de extenso lapso temporal permanece visível cicatriz em área da barriga, o que como alegado, lhe inibe de exibir a área, tenho que a situação descrita nos autos é suficiente para gerar danos estéticos que devem ser compensáveis”, concluiu o juiz.