Em decisão unânime, a Segunda Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de Mato Grosso acolheu os argumentos contidos na Apelação Cível n. 1044746-97.2018.8.11.0041 e reformou sentença de Primeira Instância, julgando procedente uma ação de obrigação de fazer a fim de condenar um homem que vendeu um veículo a um idoso a quitar totalmente o financiamento do veículo, no prazo de 30 dias, sob pena de multa diária de R$ 500 (limitada a R$ 15 mil). O vendedor também foi condenado a pagar R$ 10 mil de indenização por danos morais.
Ao realizar o negócio e pagar pelo bem, o comprador acreditava estar adquirindo um veículo completamente livre de ônus, o que não era o caso em questão, pois, ao tentar proceder à transferência perante o órgão de trânsito estadual, foi surpreendido com a existência de restrição judicial.
Conforme a relatora do recurso, desembargadora Marilsen Andrade Addario, deve ser reformada a sentença que julgou improcedente a ação de obrigação de fazer se restou comprovada a aquisição do veículo pelo autor, a sua quitação e a ausência de prova de que tenha o vendedor (requerido) quitado o restante do contrato de financiamento do veículo.
Em Primeira Instância, a ação de obrigação de fazer cumulada com danos morais havia sido julgada improcedente e o idoso havia sido condenado como litigante de má-fé, devendo pagar ao vendedor multa de 2% sobre o valor corrigido da causa, assim como as despesas processuais e os honorários advocatícios, arbitrados em 10% sobre o valor atualizado da causa. Consta dos autos que a exigibilidade de tais verbas, todavia, restou suspensa, o que não se aplicou à multa processual imposta por litigância de má-fé.
No recurso, o comprador afirmou que adquiriu e pagou à vista uma caminhonete S10, ano 2005/2006, e que o bem foi adquirido em hasta pública. Disse que o vendedor jamais lhe informou ou entregou qualquer documento que pudesse dar ciência de que o veículo foi comprado de forma parcelada, em 50 meses. Alegou que em que pese constar na procuração pública que foi apresentado o auto de arrematação, este jamais chegou às mãos dele.
Afirmou ainda que não alterou a verdade dos fatos, nem ensejou lide temerária ou fraudou qualquer documento, exercendo somente o seu direito de cidadão. Asseverou que com idade acima de 68 anos e mal conseguindo assinar o próprio nome, acreditou ter adquirido um bem livre e desembaraçado de quaisquer ônus.
Já o vendedor (ora apelado), intimado para apresentação dos comprovantes de quitação atual das parcelas do contrato de financiamento do veículo, quedou-se inerte.
“Afigurando-se imprescindível a apresentação dos comprovantes de quitação atual do contrato de financiamento do veículo havido entre o requerido quando da aquisição em leilão, esta Relatora determinou no ID nº 108445492 a intimação do mesmo para trazer aos autos os citados documentos, quedando-se inerte o requerido, conforme comprova a certidão de ID nº 110240976, circunstância que por si só comprova as alegações do requerente”, afirmou a relatora.
Segundo a desembargadora, o não conhecimento da existência de restrições sobre o veículo consubstancia erro substancial quanto ao objeto, visto que o autor, quando da celebração da compra e venda, esperava, como lhe foi prometido, que poderia transferir imediatamente o veículo para o seu nome. “Conclui-se que o requerido, embora tenha alegado fato extintivo do direito do autor, qual seja, de que o autor sabia que o veículo sub judice foi adquirido pelo requerido em hasta pública, não se desincumbiu de provar que informou ao requerente que a compra havia sido realizada em 50 parcelas mensais, art. 373, II, CPC/15”, observou a magistrada.
Em relação ao pedido de indenização por danos morais, a desembargadora assinalou que o autor da ação tem direito de pleitear tal indenização, “uma vez que ausente o pagamento do restante das parcelas do veículo, este pode ser apreendido a qualquer momento pela financiadora, o que enseja o temor de perder o bem, causando-lhe aflições, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar.”
A câmara julgadora entendeu que R$ 10 mil é o suficiente a reparar, nos limites do razoável e proporcional, o prejuízo sofrido pelo ofendido.