Sob a justificativa de acabar com indicações políticas para as vagas do quinto constitucional pela Ordem dos Advogados do Brasil e pelo Ministério Público, uma das câmaras do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro tomou uma medida radical. Desde o mês passado, os candidatos relacionados nas listas enviadas ao tribunal têm de passar por uma prova aplicada pelo colegiado. O Exame de Admissão ao Quinto Constitucional foi instituído no último dia 13 de janeiro por uma resolução, mas não da direção do tribunal, e sim da 10ª Câmara Cível.
Na prática, o que os desembargadores querem é acabar com a entrada de novos colegas sem concurso público. A medida revoltou a OAB fluminense. A entidade vai entrar nesta quarta-feira (3/2) com um pedido no Conselho Nacional de Justiça para que a norma seja derrubada por contrariar a Constituição Federal. A previsão constitucional é de que um quinto das vagas de todas as cortes do país sejam preenchidas por advogados e membros do MP, indicados pelas classes. O processo de escolha funciona assim: a OAB envia uma lista sêxtupla, o tribunal escolhe três indicados e, desses, o governador nomeia um.
O protesto da OAB-RJ ganhou o apoio do Conselho Federal da Ordem. O recém empossado presidente Ophir Cavalcante Júnior também assinará o Procedimento de Controle Administrativo a ser entregue ao CNJ. “A escolha dos candidatos pela OAB faz parte do processo democrático. Um concurso público também não garante que um magistrado esteja bem preparado para a função pelo resto de sua existência”, diz o presidente da OAB do Rio, Wadih Damous. “Também poderíamos propor uma Emenda Constitucional que instituísse provas de reciclagem a cada cinco anos aos desembargadores, despreparados em muitos casos”, dispara.
De acordo com o presidente do TJ-RJ, desembargador Luiz Zveiter, a norma foi apenas um acordo feito entre os desembargadores e não tem força normativa no tribunal. “Eles resolveram apenas não votar em quem não atendesse aos critérios”, diz, referindo-se à votação dos indicados feita pelo Pleno da corte. O autor da resolução, desembargador Celso Peres, não foi encontrado para comentar o caso. O presidente da câmara, desembargador Bernardo Garcez Neto, não quis dar declarações, segundo a assessoria de imprensa do tribunal.
Foi a explicação usada pelos desembargadores que indignou a OAB. Na relação dos motivos para a edição da norma, o colegiado afirma que o “notório saber jurídico”, um dos requisitos para a escolha dos candidatos ao quinto, “nem sempre tem sido adequadamente aferido”, e que as seleções adotam “critérios subjetivos”, como “laços de amizade, afeição ou até mesmo políticos”. O que os desembargadores querem é “prestigiar o aspecto intelectual e a adequada formação jurídica” que, no Judiciário, é diferente das “atividades exercitadas por advogados e membros do Ministério Público”, segundo o texto. Com o concurso, os escolhidos ficam livres de “constrangimentos, questionamentos e dúvidas” quanto a sua aptidão.
Segundo Damous, a atitude já causou mal estar dentro do próprio tribunal. “Diversos desembargadores nomeados para o quinto manifestaram constrangimento”, conta. Ele afirma que todos os candidatos às vagas do quinto passam pela avaliação de uma comissão na seccional, que inclui a análise de currículos e sabatinas. “Os próprios juízes e desembargadores procuram os conselheiros da Ordem para fazer indicações.”
Hoje, a OAB elabora duas listas para vagas do quinto no TJ-RJ. Nos dois casos, os membros da entidade já estão sendo convocados para a sessão pública de votação. Por isso, a OAB-RJ quer que o CNJ suspensa liminarmente a norma, antes do julgamento de mérito do caso.
Pela Resolução 1/2010, da 10ª Câmara, os seis candidatos indicados pela OAB e pelo MP seriam os habilitados a participar do exame, organizado pela própria câmara. Uma prova dissertativa com 20 questões avalia o conhecimento do aspirante nas áreas Civil, Processual, Empresarial, Penal, Administrativa, Tributária e Constitucional. A nota mínima aceitável é sete. Os três mais bem classificados formam a lista tríplice que vai para a escolha do governador. Assinam a resolução os desembargadores Bernardo Moreira Garcez Neto, presidente do colegiado, José Carlos Varanda dos Santos, Gilberto Dutra Moreira, Celso Luiz e Matos Peres e Pedro Saraiva de Andrade Lemos.
As falhas do texto apontadas pela OAB começam pela própria origem da regra. “Nenhuma câmara tem poder para baixar instruções, senão o Pleno ou o Órgão Especial do tribunal”, explica Damous. “As demais câmaras não têm de obedecer à 10ª.” Outro problema está na intenção. “Se o saber jurídico do candidato deve ser notório, evidentemente ele não precisa ser comprovado”, diz o presidente.