A 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça, por unanimidade de votos, negou recurso e manteve sentença proferida pela 15ª Vara Cível de Natal que julgou improcedente a pretensão de uma cidadã que queria que a Justiça responsabilizasse civilmente um motorista pelos danos decorrentes de um acidente automobilístico, provocado por ele durante alegada crise de epilepsia, que resultou no atropelamento do pai dela e, consequentemente, o óbito da vítima.
A sentença também condenou autora ao pagamento de custas e honorários sucumbenciais, fixados R$ 500.
O caso
Na ação de primeira instância, a autora narrou que, em 20 de janeiro de 2007, aproximadamente às 8h, na Avenida Bernardo Vieira, em Natal, o acusado estava conduzindo um automóvel GM Celta, de propriedade de uma locadora de veículos, quando perdeu o controle do veículo e atropelou o pai dela, que, posteriormente, veio a óbito.
Relatou que o fato descrito pode ser comprovado através do inquérito policial anexado aos autos, o qual tramitou perante a Delegacia Especializada em Acidentes de Veículos (DEAV) de Natal. Ela mencionou que, após a colisão, a vítima do atropelamento caiu desacordada no asfalto, mas o condutor do veículo não prestou socorro, e se evadiu do local do acidente.
A autora argumentou que, diante das circunstâncias, como o horário e as condições climáticas, ficou evidente que houve desatenção e imprudência por parte do motorista, tendo em vista que, se estivesse conduzindo o veículo com a cautela necessária, poderia ter evitado o acidente. Contou que o motorista alegou, com o intuito de elidir a sua responsabilidade, que, no momento do acidente, sofreu um ataque epiléptico, por isso, perdeu o controle do veículo.
Defendeu ainda, que a tese do motorista é falaciosa, pois ele realizou um exame denominado eletroencefalograma, antes do acidente, o qual não demonstrou qualquer indício de que o paciente poderia sofrer de epilepsia. Afirmou que os danos causados à autora alcançaram a esfera material e extrapatrimonial, uma vez que a vítima do atropelamento era seu genitor, que destinava suporte econômico à família, bem como estava presente no convívio familiar.
O motorista requereu a suspensão do processo até o julgamento de ação penal e incidente de insanidade mental, que tramitam perante a 10ª Vara Criminal de Natal. Além disso, defendeu que a autora não tem legitimidade para propor a ação porque ela não comprovou que era dependente econômica da vítima, uma vez que, no caso de morte, a indenização acarreta a prestação de alimentos àquele que se encontrava em situação de dependência econômica da pessoa falecida.
Sentença
Na sentença de 1ª instância, com base em exame clínico, a Justiça entendeu que não ficou comprovado que o motorista estava ciente de diagnóstico prévio de doença que lhe causasse crises convulsivas. O eletroencefalograma, realizado em 4 de outubro de 2006, não aponta o autor como propenso a ataques epilépticos.
Sendo assim, entendeu que se o motorista sofreu crise convulsiva enquanto conduzia veículo automotor, foi fato inesperado, sendo impossível a sua previsão, o que implica afirmar que o réu não poderá ser responsabilizado pela ocorrência de fato imprevisível.
Apelação
No recurso, a autora insistiu em apontar a culpa do condutor do veículo atropelador, diante da inexistência de documentos médicos que atestem a perda de consciência do motorista na ocasião.
Defendeu o dever de indenizar, invocando a teoria do risco objetivo, pela qual não se exige demonstração de culpa, bastando para sua caracterização a prova do fato e do dano decorrente, bem como da relação de causalidade entre ambos, e, afastando-se a alegação de caso fortuito em razão de supostos problemas de saúde do motorista.
Voto
Em seu voto, o relator do recurso, desembargador Vivaldo Pinheiro, fez referência ao depoimento do policial militar que guiava a viatura, alvo final da colisão pelo veículo do acusado. Segundo relator, o Boletim de Ocorrência é importante e se revela bastante elucidativo, eis que o PM presenciou parte do sinistro e pôde visualizar as condições em que se encontrava o condutor. O policial relatou que, ao sair da viatura e ir em direção ao veículo, o condutor estava tendo uma convulsão e que, com a ajuda de populares, ele retirou o motorista do veículo e acionou a SAMU.
Da mesma forma, em depoimento, o motorista afirmou que não se recorda do acidente, mas, apenas, de estar transitando pela avenida e depois já estar sendo atendido pela SAMU, como se tivesse sofrido um apagão nesse intervalo de tempo.
“Portanto, todo o panorama processual amolda-se perfeitamente à hipótese de caso fortuito defendida pelo apelado, pois, não apenas atropelou uma pessoa, como continuou acelerando o veículo, de forma desordenada, colidindo com uma caçamba de entulho e, após, com uma viatura policial, que forçou sua frenagem e consequente parada”, comentou o desembargador Vivaldo Pinheiro, negando o recurso.
Apelação Cível n° 2016.020148-1