Por Lilian Matsuura
A novas ferramentas para desafogar tanto o STJ como o STF também estão mudando a rotina dos advogados. A análise da repercussão geral para que um recurso seja decidido pelo Supremo Tribunal Federal reforça o trabalho em equipe de escritórios de advocacia. No Superior Tribunal de Justiça, a Lei de Recursos Repetitivos força os advogados a desenvolverem novas teses, se quiserem que o seu caso não esteja entre os processos de massa. Quando não há inovações, a solução é buscar o escritório responsável pelo precedente, muni-lo de informações e ajudá-lo a se preparar para que a tese seja aceita pelos ministros.
Antes da introdução desses instrumentos no dia-a-dia das cortes, a ajuda entre os escritórios já existia. No entanto, com a aprovação da Repercussão Geral e da Lei de Recursos Repetitivos, a colaboração se tornou crucial. Se o STF não reconhecer a Repercussão Geral naquele recurso, nenhum dos demais será aceito, até que haja uma mudança na jurisprudência da corte. No STJ, a situação é parecida. Rejeitada a tese apresentada no leading case, nenhum outro que tenha os mesmos argumentos será analisado.
No caso da incidência de ICMS sobre a demanda contratada de energia elétrica, o advogado Igor Mauler, do Sacha Calmon Misabel Derzi Consultores e Advogados, conta que recebeu mais de 20 ligações de escritórios, departamentos jurídicos e consultores de todo o país. Era ele quem patrocinava o precedente no STJ e, por isso, recebeu memoriais, pareceres e participou de diversos debates, de onde tirou argumentos para defender que não incide ICMS sobre a demanda contratada.
Ao julgar o recurso dele, no dia 11 de março, a 1ª Seção do STJ não aceitou o argumento de que não incide ICMs sobre a demanda total contratada, que inclui também a parte destinada à infra-estrutura necessária para o serviço. Para o tribunal, a parte dessa demanda que foi consumida e a infra-estrutura necessária para o serviço têm de ser tributas. O recurso (Resp 960.476) foi julgado sob o rito da Lei de Recursos Repetitivos. Após a publicação do acórdão, todos os Tribunais de Justiça do país receberam ofício da corte informando a decisão. O advogado apresentou Embargos de Declaração, por entender que há pontos obscuros no acórdão.
Uma manobra possível será apresentar argumentos de afronta à Constituição, nos casos que ainda estão nas instâncias inferiores, para a matéria chegue diretamente ao Supremo (que ainda não analisou a questão) sem passar pelo STJ.
Colaboração institucional
O advogado Gustavo Viseu, do Viseu, Cunha e Oricchio Advogados, afirma que além da colaboração por parte dos escritórios, a polêmica questão do pagamento de precatórios conta com a participação institucional da OAB-SP na briga judicial. Há no STJ um recurso em que se discute a necessidade de o Estado conceder permissão para que o credor venda o precatório. A OAB pede para participar do processo, que tramita sob a Lei de Recursos Repetitivos, como amicus curiae.
Viseu é integrante da Comissão de Precatórios da entidade e diz que, por meio dela, concentra muitas sugestões, teses e pareceres que podem ser levados à corte para defender que o Estado não precisa conceder permissão prévia para que o precatório seja vendido. O advogado observa, entretanto, que muitos pedidos de amicus curiae podem atrapalhar o andamento do processo.
Em outro caso de precatórios, agora sob o rito da Repercussão Geral no STF, o advogado conta que escritórios da região sul do país têm enviado reforços. O ministro Eros Grau concedeu liminar para permitir a compensação de precatórios alimentares com dívidas da ICMS. Esta tese, por enquanto, está vencida.
Necessidade do cliente
O advogado Pierre Moreau, do Moreau Advogados, conta que, quando uma nova lei entra em vigor, é comum escritórios proporem ações para contestá-la ainda sem um entendimento firmado, apenas para atender as necessidades do cliente. Quando a matéria chega aos tribunais superiores, “os escritórios correm como loucos atrás do primeiro que levou o caso para ajudá-lo a emplacar uma tese que beneficie a todos”.
Segundo ele, em processos previdenciários, isso é muito comum. Há, inclusive, um grupo de estudos previdenciários que se reúne com frequência para discutir teses jurídicas que podem afetar a seguridade social. O grupo é formado por mais de 80 advogados especializados em Previdência, coordenados pelo especialista Wagner Balera.
Moreua fala da importância da criação de teses jurídicas e novas interpretações para ajudar juízes a decidirem questões novas, da publicação de livros e artigos e de fazê-los chegar ao conhecimento de ministros e assessores. É dessa forma, segundo ele, que a jurisprudência vai sendo criada e transformada ao longo dos anos. “Criar conhecimento e divulgá-lo é poder. Mas para emplacar uma nova tese é preciso muito estudo e dedicação”, declarou, ao observar que a tendência natural é a repetição das teses e decisões anteriores.