A 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) decidiu pela concessão do habeas corpus em favor de um impetrante, em causa própria, para trancar ação penal iniciada após denúncia do Ministério Público Federal (MPF) envolvendo apresentação de falsas cópias reprográficas de Carteiras de Trabalho e Previdência Social (CTPS).
O relator, desembargador federal Wilson Alves de Souza, em seu voto, destacou que o acusado recorreu ao TRF1 após o juízo em primeira instância ter recebido a denúncia formulada pelo MPF para julgar a possibilidade de incursão do réu nas penas dos arts. 304 c/c 299 do Código Penal (CP), uso de documento falso e falsidade ideológica. Isso porque o acusado teria apresentado falsas cópias de CTPS de trabalhadores de uma empresa de segurança e vigilância objetivando atender aos requisitos legais de “revisão de funcionamento” de outra empresa de segurança onde trabalhava.
Em análise do recurso, o magistrado destacou que a utilização do habeas corpus para sustar o andamento de ação penal é medida excepcional, que só cabe em algumas condições, quando como é demonstrada a atipicidade da conduta, a verificação das causas de extinção da punibilidade ou ainda a ausência de indícios mínimos da autoria ou da materialidade do fato.
No caso, o desembargador apontou que no que se referia à atipicidade da conduta, apesar de haver evidente reprovabilidade moral e administrativa na tentativa do acusado de ludibriar a administração com as cópias adulteradas de documentos verdadeiros, o comportamento não se submetia aos tipos descritos na denúncia, tampouco a outros voltados à proteção da fé pública. Para o relator, no teor dos arts. 299 e 304 do Código Penal (CP), bem como entendimento doutrinário do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a conduta específica praticada pelo acusado não foi prevista pelo legislador como penalmente relevante, embora seja reprovável. Além de entender que a ação não podia produzir efeitos na seara criminal, sob pena de violação ao princípio da legalidade, para o magistrado, a possibilidade de valoração de uma simples cópia inautêntica como documento equivaleria a uma analogia in malam partem, incompatível com o princípio da reserva legal descrito no art. 1º do CP.
Ponderou o magistrado que o cometimento da falsidade ideológica e do uso de documento falso pressupõem que o agente se utilize de um documento para essa finalidade, não se enquadrando nesse conceito as cópias reprográficas inautênticas obtidas a partir de um documento original. Para o desembargador, ainda que se admita a possibilidade de valoração de cópias inautênticas como instrumento dos crimes contra a fé pública previstos no Código Penal Brasileiro, é importante que se registre que mesmo aqueles que defendem essa possibilidade, tida como excepcional, a autorizam sob a condição inafastável da demonstração da potencialidade lesiva da cópia adulterada utilizada.
Na presente hipótese, a qualidade do material confeccionado era baixíssima. Concluiu o relator que: “Diante do exposto, seja porque não considero que a utilização de cópias inautênticas com conteúdo falso configure conduta penalmente punível, seja porque mesmo que se fosse possível considerar aplicável tal compreensão, a evidente inaptidão para o engodo das cópias, no caso concreto, apresentadas afasta a sua potencialidade danosa, a manutenção do processo deflagrado substancia indevido constrangimento ilegal em razão da atipicidade da conduta”.
A decisão foi unânime.
Processo: 1020173-91.2022.4.01.0000