por Anderson Passos
Autoridades do alto escalão, como o presidente da República, que não estiverem cumprindo mandato, poderão responder pela prática de crime comum sem direito ao foro privilegiado. A proposta integra o substitutivo, aprovado na quarta-feira (11/6), pela comissão especial da Câmara dos Deputados, que analisa a Proposta de Emenda à Constituição sobre o tema.
O texto, de autoria do deputado Regis de Oliveira (PSC-SP), prevê ainda que parlamentares e autoridades denunciados em pleno cumprimento de mandato, deverão responder ao tribunal competente. Essas ações incluem o próprio recebimento da denúncia, os decretos de prisão, a quebra de sigilo telefônico, bancário ou fiscal e a impugnação de bens. O juiz de primeiro grau poderá decidir sobre as ações mediante controle prévio do tribunal competente.
“Se um juiz de primeira instância for condenar um governador de estado, por exemplo, antes de proferir a sentença, ele vai dirigir um ofício ao STF com sua argumentação”, explicou o autor do texto ao site Consultor Jurídico.
O substitutivo também acaba com a competência do Superior Tribunal de Justiça para julgamento das autoridades estaduais. Elas deverão ser processadas no âmbito estadual. Os governadores, os desembargadores e os deputados estaduais serão processados na capital do estado de seu domicílio.
Perguntado sobre a possível parcialidade dos julgamentos nos estados, Regis de Oliveira, que é juiz federal aposentado, defendeu que é preciso “partir do pressuposto da independência do magistrado”.
Depois da aprovação em comissão especial, a PEC será votada no plenário da Câmara, e, mais tarde, no Senado Federal.
Ecos da proposta
Para a deputada federal Iriny Lopes (PT-ES), o substitutivo ignorou a influência do poder político das autoridades na esfera local.
“É preciso não esquecer que composição dos tribunais locais sofre ingerência política. Portanto, não pode se restringir aos limites do estado o julgamento das autoridades locais”, criticou a deputada, que votou a favor do restante do texto.
O próprio autor da PEC, deputado Marcelo Itagiba (PMDB-RJ), destacou que, embora o texto não contemple esses casos, há a necessidade de se garantir que as partes poderão recorrer a outras instâncias.
“A proposta é um avanço. É uma forma efetiva de se fazer justiça e de acabarmos com determinados privilégios em pessoas eram julgadas de forma diferente das demais do país”, disse o deputado.
Polêmica antiga
A questão em torno da manutenção do foro privilegiado eclodiu no governo Fernando Henrique Cardoso, em 2001. Na época, Ronaldo Sardenberg, ministro da Ciência e Tecnologia, foi acusado de ter utilizado aeronaves da FAB para transporte próprio e de seus familiares. Em primeira instância, o ministro foi condenado pela Justiça Federal.
No entanto, o Supremo, em decisão liminar do ministro Nelson Jobim, suspendeu a eficácia da sentença de improbidade administrativa, argumentando haver diferenças entre os regimes de responsabilidade político-administrativa previstos na Constituição Federal: o previsto no art. 37, § 4º, e regulado pela Lei 8.429/1992; e o regime do crime de responsabilidade.
Em junho de 2007, o Supremo decidiu que a Lei de Improbidade Administrativa não pode ser aplicada contra ministros de Estado porque eles têm foro privilegiado. A discussão no plenário do STF foi acirrada. Por seis votos a cinco, a Corte concluiu que ministros de Estado devem ser processados com base na Lei de Crimes de Responsabilidade (1.079/50).
A decisão foi tomada na análise da Reclamação contra o ex-ministro da Ciência e Tecnologia Ronaldo Sardenberg. Apesar de abrir um importante precedente, a decisão se aplicou apenas ao caso do ex-ministro.
Desde que foi criada, em 1992, a Ação de Improbidade Administrativa tem sido uma das principais brigas entre políticos e Ministério Público. A Lei 8.429/92, que trata do assunto, não trata da prerrogativa das autoridades de serem julgados apenas pelas instâncias superiores.
A Ação de Improbidade passou a ser usada frequentemente pelo Ministério Público. No final de 2006, o ministro Gilmar Mendes acusou o MP de usar a ação com fins políticos, pessoais ou corporativistas.
Revista Consultor Jurídico