A 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho de Goiás (TRT-18) declarou a nulidade de uma sentença da Vara do Trabalho de Caldas Novas e determinou a reabertura da instrução processual de uma ação trabalhista para ouvir o depoimento de uma testemunha indicada e assim permitir a produção de prova testemunhal. O colegiado acompanhou, por unanimidade, o voto do relator, desembargador Welington Peixoto, que entendeu que uma única visita não pode tornar uma testemunha suspeita e reconheceu a existência de cerceamento do direito de defesa de uma trabalhadora.
Entenda o caso
A reclamante, uma promotora de marketing, pleiteava o reconhecimento de diversas verbas trabalhistas como horas extras. Na audiência de instrução, no entanto, a empresa requereu ao Juízo da Vara do Trabalho de Caldas Novas a suspeição da única testemunha levada pela trabalhadora. A juíza do trabalho acolheu o pedido e considerou a testemunha suspeita em razão dela ter ido na casa da promotora uma única vez, em uma festa de aniversário.
A defesa da promotora de marketing então recorreu ao TRT-18 para obter a nulidade da sentença e a reabertura da instrução processual, com o objetivo de ouvir o depoimento da testemunha. O advogado argumentou que a impossibilidade de colher o depoimento da testemunha por uma suposta amizade íntima ofenderia os princípios do contraditório e da ampla defesa, previstos na Constituição Federal. Para o advogado, a contradita da testemunha pelo motivo exposto torna o conceito de amizade íntima genérico.
TRT-18
O relator do recurso, ao iniciar seu voto, observou que a defesa da rede hoteleira, durante a audiência de instrução, alegou que a testemunha da trabalhadora seria suspeita em razão da existência de uma amizade íntima entre a testemunha e a promotora. Essa alegação foi acolhida pela juíza, que não ouviu o depoimento da testemunha. Na ata de audiência, prosseguiu o desembargador, constou o registro de protestos do advogado da promotora de marketing acerca do inconformismo pela contradita da testemunha. Welington Peixoto salientou que o requisito da manifestação da parte no primeiro momento teria sido atendido para configurar a nulidade da sentença.
O desembargador pontuou que na sentença consta a análise da prova oral que determinou a fixação da jornada de trabalho da autora, e, considerando a ausência da oitiva da testemunha da promotora de marketing, foi julgado totalmente improcedente o pedido de horas extras, com base no depoimento da testemunha patronal, apenas. “Isto considerado, entendo que restou comprovado o segundo requisito para a configuração da nulidade: o efetivo prejuízo pelo indeferimento da prova oral”, ponderou o relator.
Além da análise dos requisitos para a configuração da nulidade da sentença, Welington Peixoto ponderou sobre a relação de amizade íntima entre a trabalhadora e a testemunha. “Acredito que a testemunha presente poderia ter sido ouvida como informante, a fim de possibilitar a apreciação de suas declarações em grau recursal, evitando assim, a reabertura da instrução processual pela ausência do depoimento”, considerou o relator.
Welington Peixoto citou o conceito previsto no artigo 447, do CPC, de que são suspeitas as testemunhas que guardem relação de inimizade capital ou de amizade íntima com a parte. “Destaca-se da redação do artigo o cuidado do legislador ao adjetivar os substantivos inimigo e amigo com as expressões capital e íntimo, de modo a demonstrar que não basta a simples amizade ou inimizade para se configurar a suspeição da testemunha, sendo necessário que uma ou outra tenham magnitude suficiente para comprometer a isenção das declarações”, reputou.
O relator salientou que o advogado da promotora de marketing argumentou ser parte da vida o convívio com outras pessoas, e para tornar mais harmonioso o convívio, inclusive no ambiente de trabalho, o convite para uma festa de aniversário, onde mais pessoas de dentro da empresa e de outras esferas sociais foram convidadas, além de um ato de cavalheirismo e cordialidade, representa um gesto de harmonia, longe dos preceitos de amizade íntima. Por fim, o desembargador acolheu a preliminar de cerceamento de defesa e declarou nula a sentença.
Processo 0010447-62.2019.5.18.0161