A Justiça do Trabalho de Minas Gerais isentou os Correios de responsabilidade pelo acidente sofrido por um carteiro após furar o pneu dianteiro da motocicleta em que ele trabalhava. Acompanhando voto do desembargador Rodrigo Ribeiro Bueno, os julgadores da Nona Turma do TRT de Minas deram provimento ao recurso da empresa para afastar a condenação por danos morais que havia sido imposta pelo juízo da Vara do Trabalho de Bom Despacho.
O carteiro sofreu acidente de trabalho em 14/11/17, quando se deslocava de motocicleta para a cidade de Santo Antônio do Monte, na MG-164, próximo ao km 31, para realizar distribuição externa de objetos postais. Devido a um furo no pneu dianteiro, perdeu o controle do veículo e caiu no chão, sofrendo fratura e luxação no ombro esquerdo. Perícia apontou redução da capacidade de trabalho por limitação de movimentos do ombro esquerdo.
Diante de todo o contexto apurado nos autos, o juízo de 1º grau condenou a empresa a pagar ao trabalhador indenização por danos morais no valor de R$ 20 mil. A sentença se baseou na teoria do risco, que dispensa a necessidade de demonstração da culpa. No caso, foi reconhecida a chamada “responsabilidade objetiva”, levando-se em consideração, inclusive, o fato de se tratar de carteiro motorizado, que se utilizava da motocicleta em serviço.
No entanto, ao examinar o recurso, o relator chegou a outra conclusão. Para ele, a empresa não tem responsabilidade no ocorrido, uma vez que o acidente não foi provocado por empregados ou representantes dela, mas sim pelo próprio trabalhador. O magistrado explicou que a indenização exige a presença de requisitos: dano, nexo causal e culpa, conforme artigo 186 do Código Civil de 2002. De acordo com o disposto no artigo 7º, inciso XXVIII, da Constituição, a indenização decorrente de acidente ou doença de trabalho a cargo do empregador é devida em caso de dolo ou culpa (responsabilidade civil subjetiva).
Por sua vez, no julgamento do RE 828040, com repercussão geral, o Supremo Tribunal Federal decidiu que a responsabilidade civil do empregador, em caso de acidente de trabalho, também pode ser objetiva, com base no disposto no parágrafo único do artigo 927 do Código Civil. O dispositivo prevê que haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
Segundo o julgador, portanto, para a responsabilização civil objetiva do empregador não basta que sua atividade seja considerada de risco. É necessário que a atividade desenvolvida pelo autor do dano seja considerada de risco. No caso, ficou demonstrado que o acidente foi provocado por furo no pneu dianteiro da motocicleta, o que não pode ser atribuído a outros empregados ou prepostos do réu, de modo a se falar em responsabilidade pelos atos ou omissões destas pessoas, nos termos do artigo 932, inciso III, do Código Civil. Documentos mostraram que, no dia do acidente, o autor fez a checagem dos equipamentos da moto, declarando que todos os itens estavam adequados. Além disso, ficou demonstrado que a motocicleta teve regular manutenção, inclusive com a troca do pneu dianteiro poucos meses antes do acidente.
“Não se pode considerar que a reclamada incorreu em culpa no acidente de trabalho que lesionou o reclamante, na modalidade de negligência, já que, como proprietária do veículo utilizado pelo autor, tomou todas cautelas necessárias com a regular manutenção do equipamento”, registrou o relator, ponderando que, apesar de o trabalho com motocicleta poder ser considerado de risco, porque é legalmente classificada como perigosa (artigo 193, parágrafo 4º, da CLT), a circunstância não é suficiente para caracterizar a responsabilidade objetiva da empregadora. O autor do dano foi o próprio empregado.
Ainda como destacado no voto, os artigos 27 e 28 do Código de Trânsito Brasileiro preveem a obrigação de o condutor verificar a existência e as boas condições de funcionamento dos equipamentos de uso obrigatório, bem como ter domínio de seu veículo, dirigindo-o com atenção e cuidados indispensáveis à segurança do trânsito. “Ora, era responsabilidade do reclamante, condutor da motocicleta, verificar as condições dos pneus antes de colocá-la em movimento”, pontuou, entendendo ter havido caso fortuito interno, ligado ao equipamento.
“Se o veículo estava em boas condições de uso e funcionamento (o que restou provado nos autos conforme visto acima), diante do evento imprevisto (furo do pneu), cabia ao reclamante empreender manobras defensivas para controlar o veículo naquela situação”, considerou. Por tudo isso, deu provimento ao recurso dos Correios para excluir da condenação o pagamento de indenização por danos morais.
Processo PJe: 0011006-15.2018.5.03.0050 — Acórdão em 06/11/2019