De quem é a culpa quando, tanto o empregado quanto o empregador, cometem faltas graves e o contrato de trabalho é rompido? A empresa tem que pagar as verbas rescisórias ou o trabalhador perde esses direitos? Um caso analisado recentemente pela Justiça do Trabalho em Mato Grosso abordou essas questões ao reconhecer a culpa recíproca entre um soldador e uma empresa do município de Alto Araguaia.
Dispensado por justa causa sob a justificativa de ter se portado inadequadamente após sofrer um acidente de trabalho, o trabalhador ajuizou uma reclamação pedindo para que fosse revertido para dispensa sem causa motivada, com o consequente pagamento de todas as parcelas da rescisão contratual.
A controvérsia teve início quando o soldador sofreu uma queimadura no pé direito durante o trabalho de corte com grafite em esteira metálica e postou, em seguida, fotos do ferimento no grupo do whatsApp do setor, atribuindo o ocorrido à inadequação dos equipamentos de proteção individual: “avental curto e perneira vagabunda”, conforme escreveu no aplicativo.
Chamado imediatamente ao escritório, o trabalhador se desentendeu com o gerente industrial e, durante a discussão, foram proferidas palavras de baixo calão e xingamentos. O comportamento do trabalhador foi usado pela empresa como justificativa para a dispensa por justa causa.
Divisão das responsabilidades
Ao julgar o caso, o juiz Paulo Cesar da Silva, em atuação na Vara do Trabalho de Alto Araguaia, concluiu que tanto empregado quanto empregador tiveram culpa no episódio que culminou no fim do contrato. Determinou, assim, o pagamento ao trabalhador de metade dos valores a que ele teria direito em caso de dispensa sem justa causa. Ficou definido então que a empresa terá de arcar com 20% do FGTS e metade do valor do aviso prévio, do 13º salário e das férias proporcionais. Também terá de pagar 50% da indenização substitutiva do período de estabilidade, já que o soldador era membro da CIPA. Por fim, condenou o trabalhador e a empresa em honorários advocatícios de sucumbência.
Ambas as partes recorreram ao Tribunal Regional do Trabalho de Mato Grosso (TRT/MT) que, no entanto, manteve a sentença.
Da mesma forma que o magistrado que julgou a questão em Alto Araguaia, os membros do Tribunal entenderam que a discussão acalorada travada entre o supervisor e o gerente incluiu agressão verbal de ambos os lados, com insultos trocados no mesmo nível.
A conclusão da 1ª Turma do Tribunal, acompanhado o voto do relator, desembargador Tarcísio Valente, foi que as provas do caso não isentam nenhuma das partes, “vez que empregado e empregador, de forma simultânea, agiram de forma a tornar impossível a continuidade do vínculo empregatício”, em um evidente caso de culpa recíproca.
Prevista no artigo 484 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), a culpa recíproca ocorre quando empregado e empregador dão causa à rescisão do contrato de trabalho por cometerem faltas graves concomitantemente. Como consequência, deve haver a divisão da responsabilidade entre os dois lados.
A diretriz para essa divisão consta da Súmula 14 do Tribunal Superior do Trabalho (TST) que estabelece que, nesses casos, o empregado tem direito a 50% do valor do aviso prévio, do décimo terceiro salário e das férias proporcionais, como ficou definido nesse processo julgado.
PJe 0000116-10.2018.5.23.0131