Às vésperas do ano novo, um grupo de trabalhadores terceirizados, que já havia passado o Natal sem salário, decidiu fazer uma paralisação na porta do frigorífico, em Lucas do Rio Verde, para cobrar o pagamento dos atrasados. Ao fim da manifestação, um apanhador de aves se viu sem a remuneração, sem emprego e sem as verbas rescisórias. Sua empregadora, uma empresa prestadora de serviços para a BRF, o dispensou por justa causa devido à participação no ato reivindicatório.
Insatisfeito com o desfecho do caso, o ex-empregado ajuizou reclamação na Vara do Trabalho do município, pedindo a reversão da justa causa. Na ação, também requereu a condenação da empresa ao pagamento de adicional de insalubridade e apontou irregularidades nas condições de trabalho, para a qual pediu compensação pelo dano moral. Por fim, relatou que fazia horas extras diariamente, informando embarcar no ônibus da empresa por volta das 18h para o expediente noturno, só retornando para casa depois das 9h do dia seguinte.
A empregadora se defendeu, argumentando que a conduta do trabalhador na manifestação excedeu os limites constitucionais e justificou a dispensa no artigo 482 da CLT, que trata de ato de improbidade. Segundo afirmou, os participantes da paralisação interditaram a rodovia e impediram a entrada de veículos na sede da empresa para a qual prestavam serviço.
A sentença, entretanto, concluiu que o apanhador de aves agiu pacificamente, assim como os demais manifestantes, ao não impedirem a entrada das pessoas no frigorífico e se limitando a pedir que um representante fosse conversar com o grupo, sem “ameaça ou ofensa à propriedade ou pessoas, tampouco violação ou constrangimento dos direitos e garantias fundamentais previstos na CF/88.”
A empresa recorreu ao Tribunal Regional do Trabalho de Mato Grosso (TRT/MT), mas a decisão foi mantida. Acompanhando o relator do recurso, desembargador Paulo Barrionuevo, a 1ª Turma não constatou ato de improbidade que, conforme a CLT, consiste em “conduta faltosa obreira que provoque dano ao patrimônio empresarial ou de terceiros, em função de comportamento vinculado ao contrato de trabalho, com o objetivo de alcançar vantagem para si ou para outrem.”
Como destacado pelo relator, não ficou provado que o trabalhador agiu de forma desonesta ou que tenha causado prejuízo financeiro à empregadora, mas apenas que ele exerceu seu direito de reivindicação do pagamento dos salários.
Más condições
A Turma reconheceu, ainda, as más condições de trabalho, após a comprovação de que não havia local adequado para refeição e o transporte fornecido aos trabalhadores não era seguro. No processo, consta a informação de reclamações de comida estragada, falta de refeitórios e, com relação ao ônibus, falta de cintos de segurança e até de freios. Como compensação pelo dano moral, foi fixada a quantia de 3 mil reais, levando em conta casos semelhantes julgados pelo Tribunal.
Também foi mantida a condenação, determinada na sentença, de se pagar o adicional de insalubridade em grau moderado (20%). A decisão teve como base a comprovação de que o apanhador de aves trabalhou exposto ao agente insalubre biológico durante todo o contrato. Apesar de a defesa alegar que o fornecimento de equipamentos de proteção individual (EPIs) era adequado para a neutralização do agente, os documentos de controle de entrega dos EPIs revelam que a ficha referente ao trabalhador foi preenchida e assinada depois do seu desligamento do emprego.
Por fim, a Turma garantiu o direito do ex-empregado a receber horas extras, confirmando a sentença que reconheceu que a jornada média do trabalhador era de 11h e 55 minutos, com 30 minutos de intervalo, e considerando as horas in itinere, o tempo à disposição e o intervalo para repouso e alimentação.
PJe 0000475-50.2018.5.23.0101