A decisão unânime é da 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) e confirma a sentença da juíza Patrícia Iannini dos Santos, da 30ª VT de Porto Alegre. A Empresa de Trens Urbanos de Porto Alegre deverá pagar R$ 600 mil, a título de danos morais. A indenização será dividida em partes iguais aos familiares que residiam com o trabalhador: viúva, mãe, filho e uma cunhada com deficiência mental. Também foram fixados R$ 150 mil por danos materiais, que deverão ser pagos à viúva. Diferenças relativas a despesas funerárias foram fixados em R$ 2,8 mil.
Técnico em estradas, o trabalhador ingressou na Trensurb em novembro de 2013. Em janeiro de 2019, sofreu um atropelamento quando fazia a manutenção da via. O empregado não percebeu a aproximação do trem e o condutor do veículo não teve tempo hábil para reduzir a velocidade, conforme depoimentos e documentos juntados ao processo. O relatório da Comissão Técnica para análise de acidentes de trabalho indicou que não foi observada norma específica para a atividade de inspeção de via e que não houve treinamento adequado.
Foi constatada falha no sistema de comunicação entre a central de operações e os condutores dos trens. Eles não foram informados quanto à presença de equipes de manutenção nas vias. Nesses casos, os operadores devem adotar o procedimento de “marcha à vista”, com redução da velocidade para 30km/h e avisos sonoros. Além disso, não foi comprovado o treinamento quanto ao controle de acesso às áreas operacionais, que determina que um empregado deve andar no sentido contrário ao fluxo de trens, para verificar e comunicar a aproximação à equipe.
A juíza Patrícia esclarece que a prestação de serviços nas vias de trens urbanos é considerada atividade de risco, devendo ser aplicada a teoria do risco, com o reconhecimento da responsabilidade objetiva do empregador. Assim, basta a constatação do dano e do nexo causal, sem necessidade de comprovação de culpa. Na tentativa de afastar a ilicitude, a empresa alegou que houve culpa concorrente da vítima. O argumento foi afastado pela magistrada. “Resta claro que o acidente ocorreu por não ter a ré adotado providências para propiciar um ambiente de trabalho seguro”, afirmou.
A empresa apresentou recurso ao TRT-4, para afastar a condenação ou reduzir os valores das indenizações, defendendo a tese de culpa concorrente. O recurso não foi provido. Os familiares da vítima, em grau recursal, obtiveram o aumento da indenização por danos morais de R$ 360 mil para R$ 600 mil e o pagamento da pensão à viúva em parcela única de R$ 150 mil.
O relator do acórdão, desembargador Marçal Henri dos Santos Figueiredo, ressaltou que não havia provas de que o reclamante tenha agido com imprudência ou imperícia. “O relatório elenca como causa contribuinte ao acidente a falta de norma específica para atividade de inspeção de via e falta de treinamento nos dispositivos normativos cabíveis à atividade de inspeção de via, o que reforça a ausência de treinamento adequado”, evidenciou o magistrado. As previsões constitucionais sobre a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança, bem como a legislação quanto à responsabilidade objetiva sob a perspectiva do grau de risco envolvido na atividade, foram enfatizadas pelo desembargador.
Também participaram do julgamento os desembargadores Alexandre Corrêa da Cruz e Tânia Regina Silva Reckziegel. A empresa apresentou recurso ao Tribunal Superior do Trabalho (TST).