Com a entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017, mais conhecida como Reforma Trabalhista, os honorários advocatícios passaram a ser devidos pela simples sucumbência, ainda que parcial, por qualquer das partes do processo trabalhista. Isso significa que o trabalhador que teve pedidos negados na ação (ainda que deferidos outros), deverá que arcar com honorários do advogado da empresa, relativamente aos pedidos improcedentes. Além disso, de acordo com a lei reformista, o fato de o trabalhador ser beneficiário da justiça gratuita não afasta a condenação em honorários de sucumbência. É que, segundo o parágrafo 4º do artigo 791-A da CLT, acrescentado pela reforma, essa condição apenas possibilita a suspensão da exigibilidade dos honorários e, mesmo assim, quando o crédito do trabalhador não for capaz de suportar a despesa.
Um caso julgado recentemente pela 10a Turma do TRT-MG refletiu bem a polêmica que ronda o assunto. Em decisão unânime e por respeito à coisa julgada, a Turma acolheu o recurso (agravo de petição) de uma empresa para afastar a suspensão de exigibilidade dos horários advocatícios de sucumbência que haviam sido impostos ao trabalhador e determinar que o valor fosse descontado do crédito trabalhista que, no caso, superava o valor líquido de 20 mil reais.
A empresa sustentou ser inviável a suspensão da exigibilidade da verba, como havia sido determinado pelo juiz da execução, afirmando que a questão já estaria suplantada pela coisa julgada. E teve seus argumentos acolhidos pela Turma. Em sua análise, a desembargadora Maria Laura Franco Lima de Faria, relatora no processo, concluiu ser evidente o descompasso entre o entendimento adotado pelo juiz da execução e a sentença de mérito transitada em julgado.
O acórdão fez referência ao artigo 791-A, § 4º, da CLT, que só autoriza a suspensão da exigibilidade dos honorários de sucumbência quando o trabalhador, beneficiário da Justiça Gratuita, não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa. “Por isso, havendo créditos a receber neste feito, deles deverá ser descontada a verba honorária”, pontuou a desembargadora.
Além disso, foi registrado que a condenação do trabalhador, beneficiário da gratuidade judiciária, ao pagamento dos honorários advocatícios de sucumbência foi determinada na sentença de mérito, confirmada pelo Tribunal e transitada em julgado, não comportando mais discussão.
Entenda o caso – A sentença de mérito (proferida antes do início do processo de execução), com fundamento no artigo 791-A, parágrafos 2º e 3º, introduzidos pela reforma trabalhista, condenou o trabalhador a pagar os honorários advocatícios à advogada da empresa, no valor correspondente a 5% dos pedidos julgados improcedentes. O juiz da Vara do Trabalho de Ituiutaba, foi, inclusive, expresso quanto ao entendimento de não haver inconstitucionalidade dessas regras que tratam da possibilidade do trabalhador, mesmo se beneficiário da justiça gratuita, arcar com os honorários advocatícios de sucumbência, ou assumir as despesas e custas processuais quando constatada a capacidade econômica superveniente do beneficiário.
O juiz decidiu ser indevida a declaração difusa de inconstitucionalidade dos artigos 790-B e 791-A/CLT pretendida pelo trabalhador. Ele ressaltou que esses dispositivos estão de acordo com os precedentes fixados nas decisões proferidas pelo STF (T. Pleno – ED RE n.º 249.277/RS, ED RE n.º 249.003/RS e AgRg RE n.º 284.729/MG – Relator Ministro Edson Fachin – DJE 10/05/2016 n.º 93, divulgado em 09/05/2016), que recepcionaram o artigo 12 da Lei n.º 1.060/50 (Lei de Justiça Gratuita), que tratava, em sua época, da possibilidade de assunção das despesas e custas processuais diante da possibilidade econômica superveniente do beneficiário. Segundo esse entendimento também está em conformidade com a previsão do art. 98, § 3º/CPC, que prevê a gratuidade da justiça, para aqueles que têm insuficiência de recursos.
Primeiro recurso negado – Pretendendo sua absolvição do pagamento da verba honorária, o trabalhador interpôs recurso ordinário, mas o Tribunal, em acórdão anterior também proferido pela 10ª Turma, manteve a condenação. Na decisão, também de relatoria da desembargadora Maria Laura Franco Lima de Faria, destacou-se que a ação foi ajuizada em 23/05/2018, quando os honorários advocatícios, na seara trabalhista, já se encontravam disciplinados pela Lei nº 13.467/2017, cuja vigência se iniciou em 11/11/17.
Conforme ressaltou a relatora, o artigo 791-A da CLT, acrescido pela nova lei, fixou expressamente, como regra geral, serem devidos honorários advocatícios de sucumbência, inclusive em relação aos empregados beneficiados pela justiça gratuita. A regra determina que: “Ao advogado, ainda que atue em causa própria, serão devidos honorários de sucumbência, fixados entre o mínimo de 5% (cinco por cento) e o máximo de 15% (quinze por cento) sobre o valor que resultar da liquidação da sentença, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa…” E, no seu parágrafo 4º, dispõe: “Vencido o beneficiário da justiça gratuita, desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário”.
No entendimento da Turma, não se cogita, ao menos por ora, da declaração de inconstitucionalidade dessa norma que, longe de obstar o acesso à Justiça (art. 5º, XXXV, da CR), apenas desestimula o exercício abusivo desse direito. “Vale lembrar que o art. 5º, LXXIV, da CR, ao tratar da assistência judiciária gratuita, não prevê sua aplicação irrestrita, para todo e qualquer fim – e nem poderia fazê-lo, já que nenhum direito é absoluto”, enfatizou a relatora.
Por essas razões, diante da sucumbência recíproca na ação (quando há pedidos procedentes e improcedentes), a Turma concluiu que ambas as partes devem pagar os honorários advocatícios, inclusive o trabalhador, negando provimento ao recurso dele, no aspecto. O percentual de 5% incidente sobre o valor líquido da condenação foi considerado razoável, sendo mantido, inclusive quanto à condenação da empresa.
Execução: desconto desautorizado – Iniciado o processo de execução (aquele que busca a satisfação do crédito reconhecido na sentença) e realizados os cálculos do valor do crédito do trabalhador, o resultado líquido foi superior a 20 mil reais. Mas, mesmo assim, o juiz da execução entendeu não ser possível descontar do crédito do trabalhador o valor dos honorários advocatícios de sucumbência. Ele defendeu a inconstitucionalidade dos artigos 790-B, 791-A, § 4º da CLT, por restringir o direito fundamental de acesso à Justiça aos jurisdicionados pobres, no sentido jurídico, entre outras normas constitucionais, sobretudo diante do caráter alimentar do crédito trabalhista. Assim, determinou que os honorários advocatícios devidos pelo trabalhador permanecessem com a exigibilidade suspensa pelo prazo de dois anos após o trânsito em julgado da decisão que os reconheceram, nos termos do artigo 791-A, § 4º, da CLT, ressaltando que eles só poderiam ser executados antes disso se a empresa demonstrasse que a situação de insuficiência de recursos do trabalhador deixou de existir.
Segundo recurso negado – Ao fundamentar o voto que autorizou o desconto dos honorários advocatícios de sucumbência do crédito trabalhista (que ultrapassava 20 mil reais), a desembargadora Maria Laura Franco Lima de Faria chamou a atenção para o fato de que, em 14/11/18, operou-se o trânsito em julgado da sentença que condenou o trabalhador a arcar com a verba honorária, embora fosse ele beneficiário da justiça gratuita.
Nesse cenário, ponderou a relatora que, nos termos dos artigos 879, § 1º, da CLT e 5º, XXXVI, da Constituição Federal, não cabia mais nenhuma discussão sobre o fato de ser o trabalhador devedor de honorários a favor da advogada da empresa executada. “Houve declaração expressa da constitucionalidade do art. 791-A da CLT, tratando-se, portanto, de questão já superada nestes autos”, pontuou.
Conforme registrou a desembargadora, também não cabia a suspensão da exigibilidade dos honorários devidos pelo trabalhador, já que o § 4º da norma reformista é explícito em definir que isso só é possível quando a parte vencida, beneficiária da Justiça Gratuita, “não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa”.
Acompanhando o voto da relatora, a Turma deu provimento ao agravo de petição da empresa, para afastar a suspensão de exigibilidade dos honorários de sucumbência impostos ao trabalhador, determinando que o valor relativo aos honorários advocatícios de sucumbência seja descontado de seu crédito trabalhista a receber.
Processo: PJe: 0010276-62.2018.5.03.0063 (AP)
Data; 07/05/2019