A empresa também está impedida de liberar honorários ou pro labore a seus diretores ou distribuir lucros a sócios e acionistas enquanto perdurarem os atrasos.
Os atrasos reiterados no recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) levaram a Justiça do Trabalho a condenar a Usina Porto Seguro por dano moral coletivo. A condenação se deve ao entendimento de que a conduta irregular da empresa não afetou apenas seus empregados, mas atingiu toda a coletividade na medida em que o FGTS fomenta políticas públicas e ações de cunho social, em especial de financiamento habitacional e saneamento básico.
Dada pela Vara do Trabalho de Jaciara, a decisão foi mantida pela 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho de Mato Grosso (TRT/MT) ao julgar recurso interposto pela empresa.
Ao levar o caso à Justiça, por meio de uma ação civil pública, o Ministério Público do Trabalho (MPT) apresentou relatório de inspeção realizada pela Superintendência Regional do Trabalho apontando a ocorrência de reiterados atrasos no recolhimento do FGTS. Conforme consta no documento, a irregularidade se estendeu ao longo de vários períodos, acumulando uma dívida de 6 milhões de reais na época em que o processo foi ajuizado. O mais recente intervalo somava nove meses (de agosto de 2016 a abril de 2017), inadimplência que atingia todos os seus 70 empregados.
A situação levou a Justiça a deferir a antecipação de tutela pedida, determinando a obrigação de a empresa fazer o recolhimento imediato dos depósitos do FGTS de seus empregados dentro do prazo e, da mesma forma, fazer o recolhimento da indenização correspondente a 40% ou 20%, conforme a situação, quando da rescisão do contrato de trabalho. Em caso de descumprimento, fixou multa de 200,00 reais por trabalhador e mês de atraso.
Na mesma liminar, a Justiça ainda determinou que nenhum pagamento fosse feito a seus diretores, sócios, gerentes ou titulares de firma individual, a título de honorário, gratificação, pro labore ou qualquer outro tipo de retribuição ou retirada, enquanto houver atraso no recolhimento do FGTS. Da mesma forma, a empresa não deverá distribuir lucros, bonificações ou dividendos a seus sócios, titulares, acionistas ou membros de órgãos dirigentes, fiscais ou consultivos. Nesse caso, foi estabelecida multa de 50% da quantia repassada.
Ao final da fase de instrução, a sentença reconheceu o dano moral coletivo pela violação ao patrimônio moral da sociedade, resultado da postura irregular e continuamente repetida, “apesar das ações fiscalizatórias levadas a efeito pelos órgãos competentes”. A decisão fez referência ainda às dezenas de processos trabalhistas que reiteradamente tramitam na Vara do Trabalho de Jaciara, movidos por ex-empregados da usina para pedir o recolhimento do Fundo de Garantia. Esses processos contradizem a alegação da defesa de que os atrasos seriam pontuais. “Os extratos de FGTS dos empregados demonstram que a ré não efetuou o recolhimento durante anos, realizando depósitos com atraso das competências de 2014 tão somente no ano de 2017”, reforça a decisão.
Por fim, a sentença fixou em 200 mil reais o valor a ser pago como compensação pelo dano coletivo e aumentou as multas pelo descumprimento dos itens da decisão liminar de 200 para 500 reais e, de 50% para 100%, do valor de eventual repasse feito indevidamente aos sócios, antes da regularização do Fundo de Garantia.
Ao reanalisar o caso, o desembargador Nicanor Fávero, relator do recurso na 2ª Turma do Tribunal, apontou não haver dúvida quanto à dívida da empresa, inclusive porque essa informou, em sua defesa, ter feito parcelamento do débito junto à Caixa Econômica Federal, órgão gestor do FGTS. Além disso, os extratos e guias de recolhimento revelam atrasos em todos os recolhimentos registrados, a exemplo dos valores referentes aos anos de 2015, 2016 e 2017, que só foram recolhidos em 2018.
Acompanhando por unanimidade o voto do relator, a 2ª Turma avaliou acertado o entendimento da sentença, no sentido de que a conduta da empresa causou prejuízos à coletividade, mantendo, assim, a condenação por dano moral coletivo. Entretanto, reduziu o valor para 100 mil reais, levando em consideração parâmetros como o porte da usina e a gravidade do dano, além de observar a necessária atenção à manutenção do funcionamento da empresa, preservando a oferta de trabalho e de ocupação a seus prestadores de serviços, sem perder de vista os aspectos punitivo, pedagógico e inibitório de eventuais reincidências.
A Turma também manteve a obrigação, determinada inicialmente na decisão liminar e depois confirmadas em sentença, de a empresa depositar até o dia 7 de cada mês, em conta bancária vinculada, o percentual de 8% da remuneração paga a cada trabalhador. Da mesma forma, confirmou a data da publicação da sentença como o prazo para o início do cumprimento dessa obrigação.
Entretanto, atendendo parcialmente o recurso da empresa, os julgadores minoraram os valores das multas fixadas na sentença aos patamares anteriormente estabelecidos na decisão liminar. Dessa forma, o não recolhimento do FGTS resultará em multa de 200 reais por trabalhador e, qualquer pagamento a seus diretores, gerentes ou sócios, antes da regularização dos depósitos do Fundo de Garantia, acarretará multa de 50% da quantia liberada.
Conforme estabelecido na sentença, todos os valores resultantes dessas multas, bem como da compensação pelo dano coletivo, serão revertidos a projetos sociais ou entidades sem fins lucrativos da coletividade local.
Processo: (PJe) 0000489-61.2017.5.23.0071