por Lilian Matsuura
Quase um terço das medidas provisórias editadas pelo governo Lula tratam de liberação de crédito extraordinário. A abertura desse crédito, como prevê a Constituição Federal, só pode ser feita em situações extremas como calamidade pública, estado de guerra ou comoção interna. Mas o Executivo alargou a interpretação do termo situações extremas. O Ministério do Turismo, por exemplo, mereceu um complemento orçamentário para promover um campeonato de canoagem. E a Justiça Eleitoral também, para a compra de um novo prédio.
Esta é apenas uma faceta da complicada discussão em torno da edição exagerada de medidas provisórias no país. De 2003 para cá, exatamente 321 entraram em vigor. Durante palestra no Congresso de Atualização Profissional, promovido pela Unip em São Paulo, o ministro Gilmar Mendes disse que as medidas provisórias são instrumentos importantes para governar o país, mas defendeu mudanças para limitar o uso e evitar abusos.
O ministro sugere limitar o número de MPs que podem ser editadas por ano. Para Gilmar Mendes, 12 seriam suficientes. “Medida provisória não pode ser usada com essa largueza”, criticou.
As MPs foram previstas pela primeira vez no ordenamento brasileiro na Constituição Federal de 88. E em 2001, a Emenda Constitucional 32 alterou o modelo de edição de medidas provisórias. A partir dela, o prazo para votação pelo Congresso Nacional passou a ser de 60, prorrogáveis por uma vez. Se não houver deliberação, a norma perde a vigência. Antes, o prazo era de 30 dias.
A Emenda 32 trouxe duas inovações: proibiu a reedição de MP que tenha sido rejeitada ou tenha perdido a sua eficácia e previu que, depois do seu prazo de vigência, se não for apreciada tranca a pauta do Congresso.
Para o ministro Gilmar Mendes, presidente eleito do Supremo Tribunal Federal, a regra de trancamento da pauta não é ruim, mas combinada com o número excessivo de MPs é temeroso. A combinação, nas palavras do ministro, pode ser comparada a uma “roleta russa com todas as balas do revólver”. “O número de MPs é tão grande que quando o Congresso aprecia uma, outra tranca a pauta em seguida”, explica.
Gilmar Mendes diz que dessa forma o Legislativo perde a autonomia de sua agenda, provocando a sua inércia e paralisação. Por outro lado, lembra que está é uma forma de coerção para que o Congresso delibere a questão.
O tema tem preocupado as principais lideranças do Congresso, segundo Gilmar Mendes. Ele disse que levou a alguns parlamentares a sua idéia de limitar o uso das MPs e que a Câmara dos Deputados está analisando uma proposta de Emenda à Constituição para liminar o uso desse instrumento pelo Executivo. “Oxalá o Congresso consiga encontrar um bom caminho para equilibrar o uso de MPs”, pediu o ministro.
Revista Consultor Jurídico