A decisão do Superior Tribunal de Justiça de negar o pedido da OAB para que a Corte formasse a lista tríplice dos representantes da advocacia “constitui um novo marco regulatório, no qual somente os advogados que se acomodarem e se submeterem à vontade dos magistrados poderão participar do Quinto Constitucional”.
A afirmação foi feita, nesta terça-feira (1º/7), pelo presidente nacional da OAB, Cezar Britto, ao comentar o resultado da votação no STJ, que rejeitou por 11 a 6 o Mandado de Segurança ajuizado pela entidade. Britto disse esperar que o Supremo Tribunal Federal, ao qual a OAB já recorreu, modifique a decisão do STJ e obrigue o Tribunal a formar a lista tríplice para a indicação, pelo presidente da República, de representante da advocacia para a vaga de ministro.
Os presidentes de seccionais da OAB que acompanharam o julgamento disseram que o resultado causou “perplexidade e indignação”. Na avaliação dos dirigentes da OAB, o STJ rasgou a Constituição Federal. “O Tribunal prestou um desserviço à nação ao se negar a apreciar a matéria”, afirmou o presidente da seccional da OAB de Tocantins e coordenador do Colégio de presidentes de seccionais da entidade.
Para o presidente da OAB fluminense, Wadih Damous, a maioria dos ministros apresentou um entendimento confuso, com um “festival de sofismas”. “A sociedade fica sem saber qual é o exato entendimento do STJ. Isso, na verdade, configura o desapreço à advocacia e à Constituição”.
O presidente OAB de Goiás, Miguel Cançado, resumiu o resultado do julgamento pelo STJ como uma injustificada afronta à Constituição. “O STJ, na verdade, decidiu não decidir. Disse que a lista não foi rejeitada, mas não toma decisão quanto ao que fazer. O STJ deixa de ser um pouco o Tribunal da Cidadania a partir dessa decisão”.
Quem também questionou a forma com que o STJ conduziu o caso e julgamento da lista da OAB foi o presidente da OAB da Bahia, Saul Quadros. Para ele, a decisão do Tribunal, além de violar a Constituição Federal, deixa um ponto de interrogação muito grande. “Vale a Constituição ou valem os interesses pessoais daqueles que tinham o dever de escolher e não escolheram a lista tríplice com os indicados dos advogados para encaminhá-la, posteriormente, ao presidente da República?”.
Voz superior
Até o presidente do Superior Tribunal de Justiça, ministro Humberto Gomes de Barros, expressou perplexidade com a decisão da Corte. “Como vamos sair desta?”, indagou o ministro. A frase foi pronunciada no final do julgamento do Mandado de Segurança. O presidente do STJ confessou que não sabe o que ocorrerá diante da decisão do Tribunal de negar o Mandado de Segurança e, conseqüentemente, não mais votar a lista sêxtupla encaminhada pelo Conselho Federal da OAB.
“A lista afinal não foi rejeitada, não foi devolvida à OAB e deixa o Tribunal e a Ordem numa dificuldade. Como resolver esse caso?”, perguntou o ministro antes de encerrar a reunião e proclamar o resultado do julgamento do Mandado de Segurança.
Briga da lista
O embate entre a advocacia e o Tribunal começou no dia 12 de fevereiro, quando os ministros do STJ não quiseram escolher nenhum dos nomes indicados pela Ordem para integrar a corte. Fazem parte da lista os advogados Flávio Cheim Jorge, do Espírito Santo (sete votos no último escrutínio); Cezar Roberto Bitencourt, do Rio Grande do Sul (cinco votos); Marcelo Lavocat Galvão, do Distrito Federal (quatro votos); Bruno Espiñeira Lemos, da Bahia (quatro votos); Roberto Gonçalves de Freitas Filho, do Piauí (três votos); e Orlando Maluf Haddad, de São Paulo (dois votos).
Nos três turnos de votação da lista, nenhum candidato atingiu o mínimo de 17 votos. Na primeira votação, 13 ministros votaram em branco. No segundo escrutínio, foram 15 e no terceiro, 19 ministros votaram em branco. Foi a primeira vez em sua história que o STJ rejeitou uma lista apresentada pela OAB.
Dois meses depois, em segunda tentativa de aprovação da lista, o STJ decidiu manter sua posição e não escolheu nenhum dos seis nomes indicados à vaga de ministro pela Ordem.
O que disseram os presidentes das seccionais da OAB que acompanharam a sessão
OAB de Alagoas — Omar Coelho
“Vejo esse resultado com bastante tristeza ao ver a Corte Superior do País, o Tribunal da Cidadania, rasgar a Constituição e fazer a opção pela ilegalidade. É lamentável que, em pleno século XXI, vejamos um tribunal optar pelo corporativismo. Se rasgou a Constituição e se desrespeitou a advocacia”.
OAB da Bahia — Saul Quadros
“Minha avaliação sobre esse julgamento é que o STJ desrespeitou a Constituição Federal, assuntou a advocacia brasileira e deixa um ponto de interrogação muito grande: vale a Constituição ou valem os interesses pessoais daqueles que tinham o dever de escolher e não escolheram a lista tríplice com os indicados dos advogados para encaminhá-la, posteriormente, ao presidente da República?”
OAB do Distrito Federal — Estefânia Viveiros
“Recebo a decisão com bastante surpresa, pois a OAB compreende que o dispositivo da Constituição Federal determina que compete ao STJ reduzir a lista sêxtupla à metade. Da forma como decidiu o STJ, houve violação à Constituição Federal”.
OAB de Goiás — Miguel Cançado
“Vejo esse resultado do julgamento pelo STJ como uma injustificada afronta à Constituição Federal. O STJ, na verdade, decidiu não decidir. Disse que a lista não foi rejeitada, mas não toma decisão quanto ao que fazer. É uma agressão, uma verdadeira picuinha contra a advocacia. É claro que a OAB vai continuar resistindo a esse absurdo, a esse desrespeito à advocacia e à cidadania brasileiras. O STJ deixa de ser um pouco o Tribunal da Cidadania a partir dessa decisão”.
OAB do Piauí — Norberto Campelo
“O resultado desse julgamento foi uma grande decepção. O que observamos é que quem votou pela denegação do mandado de segurança da Ordem não apresentou nenhuma fundamentação para tanto. É decepcionante. Estamos aqui, em uma Corte superior considerada o Tribunal da Cidadania, e o que vimos foi prevalecer interesses pessoais de alguns ministros, que, sem qualquer fundamentação legal, simplesmente não querem cumprir com o seu dever constitucional, de reduzir a lista sêxtupla à tríplice”.
OAB do Rio de Janeiro — Wadih Damous
“A maioria dos ministros esposou entendimento confuso, com um festival de sofismas. Entendo que a maioria dos ministros do STJ rasgou a Constituição, pois, num sinal de desapreço à OAB, decidiu não apreciar a lista sêxtupla encaminhada pela entidade sem chegar a uma conclusão firme sobre a devolução ou não da referida lista. A sociedade fica sem saber qual é o exato entendimento do STJ. Isso, na verdade, configura o desapreço à advocacia e à Constituição. Agora a OAB deve ir ao STF para afastar de vez esse desrespeito, essa ilegalidade à Constituição”.
Rio Grande do Sul — Claudio Lamachia
“Estamos perplexos diante dessa decisão do STJ, que rasga a Constituição Federal ao não reduzir a lista sêxtupla à tríplice e, com isso, traz um prejuízo inegável para a cidadania brasileira. O Tribunal, que já se diz assoberbado de processos e com um número considerável de feitos a julgar, deixa o cidadão brasileiro com menos um julgador, menos um membro, menos um ministro em sua composição, por força de interesses incompreensíveis. Portanto, novamente o STJ, com essa decisão, não observa os ditames da Constituição Federal”.
OAB do Tocantins — Ercílio Bezerra
“Estou com um misto de perplexidade e indignação. O STJ prestou um desserviço à nação ao se negar a apreciar uma matéria que se espera dessa Corte, que, neste caso, é a lista sêxtupla encaminhada por meio do Quinto Constitucional. Hoje escrevemos uma página negra na história do STJ.”
Leia a declaração de Cezar Britto
“Como ratifiquei na tribuna do advogado, estava em jogo no julgamento qual o papel da participação da advocacia que queremos; qual o papel da contribuição que a advocacia dá e deu na construção da história dos tribunais. A participação da advocacia enquanto magistrada, enquanto representante de uma categoria que contribui para a administração da justiça, sai arranhada desse julgamento.
Firmou-se um novo marco regulatório; firmou-se a compreensão de que pode o Tribunal, querendo, recusar os representantes da advocacia, sem qualquer motivação, sem qualquer motivação, sem qualquer satisfação. E o que se lamenta é que, nessa compreensão, nesse pensamento se filiou um representante da advocacia. Nesse pensamento, o vice-presidente do Tribunal, provavelmente o futuro presidente do STJ, aceita o novo marco regulatório, que sustenta que a partir de agora somente os advogados que se acomodarem à vontade dos magistrados poderão ser aprovados no Quinto Constitucional. Lamenta-se que isto tenha ocorrido nesta sessão.
Tenho a certeza que Supremo Tribunal Federal modificará esse entendimento e fará valer a Constituição Federal, reconhecendo que é dever do Tribunal, qualquer que seja ele, reduzir a lista indicada pela OAB, fazendo com que a advocacia continue contribuindo com a história dos tribunais.E contribuindo em sua amplitude: contestando, trazendo novas proposituras, interagindo e, sobretudo, contribuindo em igualdade de condições.
Mas, a despeito de tudo, a Ordem saiu fortalecida no julgamento com o posicionamento de vários magistrados, que reconheceram que a lista apresentada pela OAB é uma lista que dignificaria a magistratura. Aliás, foi decisão unânime no sentido de que os nomes indicados pela Ordem preenchem os requisitos constitucionais tanto objetivos quanto subjetivos.
E não era para menos, pois na relação da OAB que indicamos há dois doutores, dois mestres, cinco especialistas, um integrante da maior Seccional da OAB do País, que é São Paulo, um presidente da Associação Nacional de Defensores Públicos. Indicamos nomes extremamente importantes que, sem dúvida, contribuíram para engrandecer a história do Tribunal. E essa história também sobressaiu na decisão do Tribunal.
Por fim, outro fato a se lamentar é a abstenção de uma representante da advocacia no Quinto, que é a ministra Maria Thereza; ela substituiu o ministro José Delgado – que tinha sido favorável à OAB quando do julgamento da liminar no mandado de segurança. Em conseqüência disso, além de não termos mais o voto do ministro Delgado favorável, tivemos uma abstenção, ou seja, não tivemos a atuação firme dos representantes da advocacia nessa sessão que era fundamental para os destinos e o futuro do Quinto da advocacia”.
Revista Consultor Jurídico