Valor sentimental – Jazigo é impenhorável e não serve para pagar dívida

O valor moral, sentimental e religioso do bem deixa transparecer a sua impenhorabilidade ainda que ele não esteja expressamente no rol do artigo 649 do Código de Processo Civil, que trata dos bens impenhoráveis. O entendimento é do desembargador Leão Aparecido Alves, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (DF), que suspendeu penhora de jazigo da família de um empresário para quitar dívidas com a Fazenda Nacional.

A Fazenda ajuizou execução fiscal contra o empresário, tido como responsável tributário da empresa, para cobrar contribuição social devida pela sociedade. Para isso, pediu a penhora do jazigo onde foi enterrada a ex-mulher do empresário. De acordo com a Fazenda, o jazigo do autor era o único bem passível de penhora.

O pedido foi aceito pela primeira instância. O juízo da 26ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Belo Horizonte entendeu que o jazigo deve ser caracterizado como título com cotação em bolsa e mandou para leilão. O empresário recorreu da decisão.

A defesa, representada pela advogada Fernanda Couto, do escritório Décio Freire Associados, alegou ilegalidade e inconstitucionalidade da penhora. Ela ressaltou que o jazigo é bem de família e que tem valor sentimental, moral e religioso. “Sobretudo tendo em vista que naquele jazigo encontra-se sepultada sua mulher”, sustentou a defesa ao pedir suspensão do leilão e a desconstituição da penhora.

Os argumentos foram aceitos. O desembargador Leão Aparecido Alves acolheu o pedido de liminar e mandou suspender o leilão até decisão definitiva do recurso. Para ele, o direito ao uso de jazigo, que serve de último descanso dos restos mortais dos entes queridos, não se caracteriza como título com cotação em bolsa.

Leia íntegra da decisão

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO

AGRAVO DE INSTRUMENTO N. 2008.01.00.015660-8/MG

Processo na Origem: 199938000016871

RELATOR(A): DESEMBARGADOR FEDERAL LEOMAR BARROS AMORIM DE SOUSA

RELATOR(A): JUIZ FEDERAL LEÃO APARECIDO ALVES (CONV.)

AGRAVANTE: PAULO ROBERTO BRANDÃO DE SOUZA

ADVOGADO: DÉCIO FLÁVIO GONCALVES TORRES FREIRE E OUTROS(AS)

AGRAVADO: FAZENDA NACIONAL

PROCURADOR: JOSE LUIZ GOMES ROLO

DECISÃO

Para a concessão da antecipação da tutela da pretensão recursal ou para atribuir efeito suspensivo ao agravo de instrumento é necessária a coexistência dos requisitos da relevância da fundamentação e de que haja perigo de lesão grave e de difícil reparação (C.P.C., artigos 527, III, e 558).

No caso, em juízo de cognição sumária, vislumbro relevância nos argumentos apresentados pelo agravante de que “a correta inteligência do art. 649 do CPC, segundo a qual os bens de relevante valor moral, sentimental e religioso devem ser compreendidos dentre aqueles arrolados na lista não taxativa de bens absolutamente impenhoráveis.” (fl. 10).

Com efeito, o valor moral, sentimental e religioso que encoberta o bem em questão deixa transparecer a impenhorabilidade decorrente de sua situação, ainda que não arrolado expressamente no rol do art. 649 do CPC.

Neste sentido, veja-se os ensinamentos do ilustre Professor Humberto Theodoro Júnior (fl. 11):

“(…) Em algumas circunstâncias especiais, a lei exclui também da execução alguns bens patrimoniais, qualificando-os de impenhoráveis por motivos de ordem moralr religiosa, sentimental, pública, etc. (art, 649)”. (Curso de direito (sic) Processual Civil, 12a ed., Rio de Janeiro: Forense, 1998, vol. II. p. 105),”

Por outro lado, o direito ao uso de jazigo, para servir de último descanso dos restos mortais dos entes queridos, não se caracteriza como título com cotação em bolsa (CPC, artigo 655, IV)

Com tais considerações, defiro o pedido de antecipação da pretensão da tutela recursal para suspender a realização dos leitões marcados para os dias 10/04/2008 e 28/04/2008 até o julgamento do presente recurso.

Comunique-se, com urgência, ao juízo de origem.

Intime-se o(a) agravado(a) para resposta (CPC, art. 527, V).

Publique-se.

Brasília (DF), 3 de abril de 2008.

Juiz Federal LEÃO APARECIDO ALVES

Relator Convocado

Revista Consultor Jurídico

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