Pedido de vista da ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha suspendeu, nesta quarta-feira (31), o julgamento, pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), do Recurso Extraordinário (RE) 594296, em que o governo do Estado de Minas Gerais se insurge contra decisão da 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais. O TJ-MG, confirmando sentença de primeiro grau, julgou ilegal a anulação de parcela integrante da remuneração de uma servidora, sem que lhe fosse dado o direito ao contraditório e à ampla defesa, assegurado pelo artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal (CF).
O pedido de vista foi formulado quando o relator do processo, ministro José Antonio Dias Toffoli, havia negado provimento ao recurso, sendo acompanhado, neste voto, pelo ministro Luiz Fux.
Em 14 de agosto de 2008, a Suprema Corte reconheceu a existência de repercussão geral* da questão constitucional suscitada neste processo.
Negativa
Em seu voto, o ministro Dias Toffoli afirmou que não assiste razão ao governo mineiro, que tomou sua decisão ainda com base na Súmula 473/1969 do STF, editada ainda sob a égide da Constituição Federal (CF) de 1967. Esta súmula admitia a possibilidade de a Administração “anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos, ou revogá-los por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial”.
Entretanto, segundo ele, este entendimento não foi recepcionado pela CF de 1988, cujo artigo 5º, LV, garante o direito ao contraditório e à ampla defesa, mesmo em qualquer ato administrativo que afete o os interesses da pessoa envolvida. Essa nova concepção é também confirmada pela doutrina, segundo o ministro, que citou os juristas Hely Lopes Meirelles e Celso Antônio Bandeira de Mello.
O caso
A servidora ingressou no serviço público em 1994, quando pediu e teve averbado tempo de serviço cumprido anteriormente na iniciativa privada. Na oportunidade, foram-lhe deferidos quatro quinquênios. Entretanto, cerca de três anos depois, ela recebeu comunicado dando conta de que teria percebido indevidamente valores referentes a quinquênios irregularmente concedidos e que o benefício seria retirado de seu prontuário e, o montante pago a maior, debitado de seus vencimentos mensais.
Inconformada, a servidora ingressou em juízo e obteve a reversão do ato, decisão esta confirmada pelo TJ-MG. Contra tal decisão, o governo mineiro recorreu ao STF.
Em seu voto, o ministro Dias Toffoli considerou que o artigo 5º, inciso LV da CF é claro ao garantir o direito ao contraditório e à ampla defesa e que o inciso LIV do mesmo artigo estabelece que ninguém será privado de seus bens sem o devido processo legal. Lembrou, neste contexto, que está em jogo não só o valor do salário da servidora, como também o cálculo de sua futura aposentadoria, além da devolução de valores supostamente pagos a maior, indevidamente.
Ele lembrou, nesse contexto, que não está em julgamento o mérito do desconto salarial pretendido pelo governo mineiro, mas sim o direito ao contraditório e à ampla defesa da servidora. Segundo ele, o julgamento em curso no STF não exclui a possibilidade de o governo de Minas Gerais renovar um processo de revisão dos vencimentos da servidora, porém dentro dos pressupostos legais.